CSM|SP: Registro de imóveis – Dúvida – Negativa de registro de loteamento – Artigo 18, § 2º, da lei n° 6.766/79 – Necessidade de comprovação de patrimônio suficiente para a garantia do pagamento de dívida e de sua higidez – Possibilidade de dano a futuros adquirentes – Dúvida procedente – Recurso não provido.

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0005919-13.2012.8.26.0272, da Comarca de Itapira, em que são apelantes LEILA APARECIDA NICOLAI DOS SANTOS, ANTÔNIO HÉLIO NICOLAI, MARINA CLARA GODOY NICOLAI, SILVÂNIA MARIA NICOLAI PIARDI, GILDO HENRIQUE PIARDI, VALÉRIA NICOLAI PIARDI, HUMBERTO PIARDI e LUÍS HERMINIO NICOLAI, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE ITAPIRA.
ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.
São Paulo, 3 de junho de 2014.
HAMILTON ELLIOT AKEL
CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR
VOTO N° 34.026
Registro de imóveis – Dúvida – Negativa de registro de loteamento – Artigo 18, § 2º, da lei n° 6.766/79 – Necessidade de comprovação de patrimônio suficiente para a garantia do pagamento de dívida e de sua higidez – Possibilidade de dano a futuros adquirentes – Dúvida procedente – Recurso não provido.
Trata-se de apelação interposta por Leila Aparecida Nicolai dos Santos e outros, objetivando a reforma da r. sentença de fls. 259, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Itapira, mantendo a recusa relativa ao registro de loteamento, em razão da existência de ações populares e civis públicas ajuizadas contra um dos suscitantes, Antônio Hélio Nicolai.
Aduz, em suma, que embora dois dos suscitantes respondam a procedimentos judiciais cíveis em trâmite, ambos possuem patrimônio imobiliário suficiente para garantir a consecução do empreendimento. Alega, ainda, que o suscitante Antônio Hélio Nicolai detém apenas 1/5 do empreendimento, enquanto os demais loteadores possuem considerável patrimônio imobiliário.
Contrarrazões às fls. 277 v°.
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 287/289).
É o relatório.
A preliminar levantada pela ilustrada Procuradoria Geral de Justiça que solicita a remessa dos autos à Corregedoria Geral da Justiça não procede, uma vez que o ato perseguido pelos recorrentes é passível de registro em sentido estrito.
Veja-se, a propósito, que os arts. 18 e 19, da Lei n° 6.766/79, por diversas vezes, falam de registro – e não de averbação – do loteamento. É significativo o § 5º, do art. 18, que destaca o registro do loteamento como ato final do procedimento registral:
Registrado o loteamento, o Oficial de Registro comunicará, por certidão, o seu registro à Prefeitura.
A recusa do registrador quanto ao registro do loteamento “Chácaras de Recreio Boa Vista”, localizado na Comarca de Itapira, baseia-se no fato de existirem ações populares e ações civis públicas – num total de 12 – em trâmite contra um dos loteadores, Sr. Antônio Hélio Nicolai.
É certo que a existência de diversas ações propostas contra um dos suscitantes, por si só, não obsta o registro do loteamento.
Insuperável, no entanto, a necessidade de comprovação da existência de patrimônio de Antônio Hélio Nicolai suficiente a garantir eventual condenação nas ações pessoais em curso – dentre as quais várias versam sobre improbidade administrativa -, evitando-se prejuízo aos adquirentes de lotes, conforme preconiza o artigo 18, § 2º, da Lei n° 6.766/79.
Assim, cabia aos apelantes confrontar o potencial condenatório de todas as ações em curso contra um dos loteadores com o patrimônio disponível, a fim de demonstrar, de forma cabal, que referidas ações são desprovidas de potencial lesivo aos adquirentes.
Disso decorre que a simples juntada de certidões de matrícula, sem qualquer avaliação ou demonstração de suficiência do patrimônio, não constitui a prova robusta exigida por este C. C. Conselho Superior da Magistratura:
É ônus do loteador a prova da ausência de prejuízo aos adquirentes dos lotes, pois “cabe ao interessado no registro demonstrar que as ações existentes, que pendem contra os antecessores dos titulares do domínio, não poderão trazer qualquer risco ao empreendimento, nem mesmo em potencial” (Ap. Cív. n° 43.577-0/7 – São Joaquim da Barra, Rel. Des. Nigro Conceição). Se tal prova não é apresentada de forma contundente, o registro não se pode efetivar. Na opinião de Marco Aurélio S. Viana: “As certidões poderão ser positivas, e isto não inibirá o registro, se restar provada a ausência de prejuízo para os adquirentes. Já chamamos a atenção para o problema na esfera das incorporações imobiliárias, lembrando a posição de Caio Mário da Silva Pereira no sentido de que bastará ao interessado demonstrar que efetuou o depósito da quantia ou coisa depositada, ou por meio idôneo segurado o juízo, enfim, demonstrado de forma concreta e objetiva que não há prejuízo para os adquirentes. Podemos acrescer outros meios de comprovação de inexistência de prejuízo: demonstração, pelo pretendente, de um patrimônio e de capacidade econômica capazes de cobrir, sobejamente, as obrigações” (“Comentários à Lei sobre Parcelamento do Solo Urbano”, Saraiva, 2ª ed., 1984, pág. 54/55). Não há, enfim, prova robusta de que o estado econômico da recorrente é em muito superior às dívidas objeto das certidões juntadas aos autos e que, em conseqüência, o empreendimento seguirá sem maiores riscos para os adquirentes de lotes e a comunidade em geral. Significa, pois, pelo quadro atual retratado nos autos, a inviabilidade do projeto do parcelamento urbano em tela, enquanto não solucionados em definitivo os débitos apontados. (Ap. 82.230-0/0, rel. Luís de Macedo).
REGISTRO DE IMÓVEIS Loteamento Registro negado Cognição plena devolvida ao Corregedor Permanente em revisão hierárquica Ações movidas contra a pessoa jurídica loteadora, ou contra sócio representante legal, nos termos do art. 18, § 2º, da lei n° 6.766/79 Execuções fiscais e ação civil pública Ausência de demonstração cabal, ao tempo da suscitação da dúvida, de que tais demandas não prejudicarão adquirentes de lotes Existência, ainda, de ação penal contra sócio representante legal por crime contra a administração pública, configurando impedimento ao ato registrário – Dúvida procedente Recurso não provido. (Apelação Cível n° 439-6/5, da Comarca de Itanhaém, 06/12/2005, Relator Des. José Mário Antônio Cardinale)
No caso em exame, não há prova contundente de que o patrimônio do suscitante é bem superior às dívidas que podem decorrer das ações judiciais em trâmite contra si, de forma a garantir que o empreendimento não trará riscos aos adquirentes de lotes.
A recusa, por isso, deve ser mantida.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação.
HAMILTON ELLIOT AKEL
CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR
(D.J.E. de 04.08.2014 – SP)