CSM|SP: Registro de imóveis – Dúvida inversa – Formal de partilha – Negativa de registro – Ausência de prenotação válida no momento da suscitação – Interessado notificado para reapresentação do título e nova prenotação, sem atendimento – Descumprimento do subitem 39.1.2, Cap. XX, tomo II, NSCGJ/SP – Dúvida prejudicada – Apelação não conhecida – Exame dos óbices apenas para orientar futura prenotação – Título judicial sujeito à qualificação registral – Dever do registrador de fiscalizar recolhimento de tributos – Partilha desigual e divergência relevante entre percentuais/valores do formal e os informados na declaração de itcmd – Necessidade de aditamento do formal e comprovação do recolhimento ou isenção do itcmd (inclusive perante o fisco paulista, por se tratar de imóvel em sp) – Óbices que subsistiriam – Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001516-17.2024.8.26.0028, da Comarca de Aparecida, em que é apelante GERALDO MENDES DE CARVALHO JUNIOR, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE APARECIDA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Não conheceram da apelação, prejudicada a dúvida, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), VICO MAÑAS (DECANO), TORRES  DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 11 de dezembro de 2025.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1001516-17.2024.8.26.0028

Apelante: Geraldo Mendes de Carvalho Junior

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Aparecida

VOTO Nº 43.974

Apelação – Dúvida inversa – Negativa de registro de formal de partilha – Ausência de prenotação válida – Dúvida prejudicada – Apelante que não atendeu notificação da oficial para reapresentação do título – Descumprimento ao Subitem 39.1.2, Cap. XX, Tomo II, NSCGJ – Análise dos óbices para orientação de futura prenotação – Exigências de aditamento do formal de partilha e de comprovação de recolhimento ou isenção do ITCMD em razão de partilha desigual que prevalecem – Óbices que se manteriam, caso a dúvida não fosse prejudicada – Apelação não conhecida.

I. Caso em exame

1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que manteve os óbices registrais para registro de formal de partilha em razão de distribuição desigual de quinhões.

II. Questão em discussão

2. A questão em discussão consiste em verificar (i) a validade da prenotação para suscitação da dúvida; (ii) se os quinhões foram distribuídos de modo desigual a justificar o recolhimento do ITCMD ou a comprovação de sua isenção.

III. Razões de decidir

3. A apelação não pode ser conhecida porque ausente prenotação válida. Análise dos óbices para orientar futura qualificação.

4. A origem judicial do título não o torna imune ao juízo de qualificação registral.

5. É dever do registrador fiscalizar o recolhimento dos tributos decorrentes dos atos praticados na serventia extrajudicial.

6. Necessidade de comprovação de recolhimento do ITCMD ou de sua isenção diante de partilha desigual.

IV. Dispositivo e Tese

7. Apelação não conhecida.

Tese de julgamento:

1. A dúvida inversa (ou direta) fica prejudicada se não houver prenotação válida.

2. O título judicial também se submete à qualificação pelo Oficial de Registro de Imóveis.

3. Cabe ao Oficial fiscalizar o correto recolhimento dos tributos incidentes sobre atos levados a registro.

4. Necessidade de comprovação de recolhimento do ITCMD ou de sua isenção diante de partilha desigual.

Legislação citada:

– subitem 39.1.2 e item 117, do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ;

– art. 28 da Lei 8.935/1994;

– art. 289 da Lei nº 6.015/73;

– art. 134, VI, do CTN.

Jurisprudência citada:

Conselho Superior da Magistratura – Apelação nº. 1029036-90.2025.8.26.0100, Apelação nº 413-6/7; Apelação nº 0003968-52.2014.8.26.0453; Apelação nº 0005176-34.2019.8.26.0344, Apelação nº 1001015-36.2019.8.26.0223 e Apelação nº 464-6/9, Apelação nº 1015474-45.2020.8.26.0114, Apelação nº 0004941-15.2014.8.26.0224

Trata-se de apelação interposta por GERALDO MENDES DE CARVALHO JUNIOR contra a r. sentença de fls. 438/440, proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Aparecida/SP, que julgou procedente a dúvida suscitada, mantendo a recusa do registro do formal de partilha de fls. 22/380. Os embargos de declaração opostos contra a sentença (fls. 443/445), foram rejeitados (fls. 446/447).

Em seu recurso de apelação (fls. 450/455), o recorrente insiste na aptidão do formal de partilha ao registro, pugnando pela reforma da r. sentença e o ingresso do referido título no fólio real.

Instado a regularizar sua representação processual (fl. 480), o recorrente apresentou a procuração de fls. 484.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 490/494).

É o relatório.

O apelante apresentou ao Oficial de Registro de Imóveis de Aparecida/SP o formal de partilha dos bens deixados por Geraldo Mendes de Carvalho, extraído dos autos de nº 0456.17.003371-0 da 1ª Vara Judicial da Comarca de Oliveira/MG, (fls. 11/13 e 22/380), relativamente ao imóvel objeto da matrícula 10.373 daquela Serventia.

O título foi prenotado sob nº 58.008 em 01/12/2023 (fls. 11/13) e devolvido em 06/12/2023, com exigência de aditamento do formal de partilha para a comprovação do recolhimento do imposto cabível em razão da desigualdade na atribuição dos quinhões à meeira e herdeiros.

Todavia, a dúvida está prejudicada pela ausência de prenotação válida, o que impõe o não conhecimento da apelação.

Como informado pela Oficial às fls. 424/425, ao tempo da suscitação da dúvida inversa não havia prenotação vigente, eis que a qualificação do título havia sido feita há quase seis meses da emissão da nota devolutiva (fls. 06 e 11).

Em razão disso, a Oficial, em cumprimento ao disposto no subitem 39.1 do Capítulo XX do Tomo II das NSCGJ, notificou o interessado para a apresentação do título original para nova prenotação (fls. 426/429), que, todavia, não atendeu à notificação.

A ausência de prenotação válida impede o conhecimento da dúvida e acarreta o não conhecimento da apelação, mas não afasta o exame das exigências formuladas pela Registradora tão somente para orientar futura prenotação.

A r. sentença atacada manteve os óbices registrais, sob entendimento de que, havendo distribuição desigual dos quinhões, deveria ter sido comprovado o recolhimento integral do Imposto de Transmissão Causa-Mortis e de Doação ou sua homologação pela Fazenda Estadual, certo que a própria sentença homologatória dispõe sobre o parcial pagamento do ITCD. Além disso, destacou que não se comprovou a satisfação dos tributos relativos a todos os bens constantes da partilha e que se encontram no Estado de São Paulo.

O recorrente insiste no ingresso do título judicial no fólio real, porque (i) o formal de partilha é título judicial e não cabe ao Registro de Imóveis da Comarca de Aparecida/SP revê-lo; (ii) o título judicial foi homologado pelas autoridades do Estado de Minas Gerais, as únicas que seriam competentes para sua eventual revisão; (iii) houve o devido recolhimento do ITCMD perante a autoridade fiscal do Estado; (iv) a Procuradoria do Estado de Minas Gerais, único órgão competente para fiscalizar o tal recolhimento, concordou com a homologação da partilha; (v) a Oficial confundiu a aplicação da Portaria-CAT 89 de 26/10/2020, a qual preconiza situação diversa do caso, haja vista que o recolhimento se deu em âmbito judicial e não por ato próprio.

No que diz respeito às alegações de itens (i) e (ii) supra, tem-se que a origem judicial do título não o torna imune à qualificação registral (Apelação nº 413-6/7; Apelação Cível nº 0003968-52.2014.8.26.0453; Apelação nº 0005176-34.2019.8.26.0344 e Apelação nº 1001015-36.2019.8.26.0223).

Nesse sentido, também a Ap. nº 464-6/9, de São José do Rio Preto:

“Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal. O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.

Vale ressaltar, outrossim, que o Oficial, titular ou interino, dispõe de autonomia no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

Esta conclusão se reforça pelo disposto no item 117 do Cap. XX do Tomo II das Normas de Serviço: “Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais”.

Portanto, nem sempre a origem judicial basta para garantir ingresso automático dos títulos no fólio real, cabendo ao Oficial qualificá-los conforme os princípios e regras que regem a atividade registral.

No que toca ao recolhimento do tributo e, portanto, quanto às alegações recursais de itens (iii) a (v), é preciso constar que o Oficial de Registro de Imóveis deve aferir se houve o recolhimento dos tributos referentes aos atos cujos registros são postulados.

São sucessivos os precedentes deste Conselho, dando concretude ao art. 289 da Lei nº 6.015/73 e ao art. 134, VI, do CTN, no sentido de que cabe ao Registrador fiscalizar o recolhimento dos tributos relativos aos atos que lhe são apresentados.

Especificamente em relação ao imposto de transmissão causa mortis, destacam-se os seguintes julgados:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Formal de partilha – Arrolamento – Suposta ofensa ao princípio da especialidade subjetiva não configurada – Exigência de documentação pessoal atualizada afastada – ITCMD – Necessidade de comprovação de recolhimento do imposto, ou de demonstração de sua isenção – Óbice mantido – Apelação não provida” (CSM/SP- apelação nº 1015474-45.2020.8.26.0114, Rel. Des. Torres Garcia, j. em 31/5/2022).

“Registro de Imóveis – Formal de partilha – ITCMD – Recolhimento do tributo não comprovado – Dever do Oficial de fiscalizar o pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício – Via administrativa incompetente para dispensar a apresentação de comprovantes de pagamento – Dúvida procedente – Recurso não provido” (CSM/SP – Apelação nº 0004941-15.2014.8.26.0224, Rel. Des. Elliot Akel, j. Em 11/5/2015).

Na espécie, como o imóvel objeto da partilha está situado no Estado de São Paulo, deve ser comprovado o recolhimento do ITCMD perante o fisco paulista.

Todavia, os valores declarados em relação ao imóvel (matrícula nº 10.373) na declaração de recolhimento do ITCMD junto ao fisco estadual divergem, e muito, dos valores apresentados na partilha.

De fato, observa-se do documento de fl. 359 que ao recorrente coube 100% do imóvel em apreço, cuja avaliação foi de R$ 877.400,00.

Na declaração relativa ao recolhimento do ITCMD, contudo, consta que o imóvel foi partilhado em percentuais de 8,333 e de 8,334 aos herdeiros filhos (8,333 para quatro dos herdeiros e 8.334 para os dois herdeiros restantes) e de 50 à viúva meeira, tendo sido avaliado em R$ 9.396,55 (fl. 89).

Deste modo, como bem observou a r. sentença, há divergência entre os percentuais e valores apresentados na partilha (e homologados pela sentença de fl. 368/369) e os que serviram de base de cálculo para o recolhimento do tributo.

De outra parte, a partilha decorrente de inventário, de fato, revelou-se desigual, conforme se verifica do Plano de Partilha de fl. 355, em que o valor do Monte-Mor, excetuadas as aplicações em dinheiro, era de R$ 9.764.900,00.

Considerando o referido valor, a viúva meeira do de cujus deveria receber R$ 4.882.450,00 e cada um dos herdeiros filhos o montante de R$ 813.741,67.

Contudo, a viúva meeira recebeu R$ 4.034.557,60 e o herdeiro filho, ora apelante, Geraldo Mendes de Carvalho Junior, recebeu um bem imóvel avaliado em R$ 877.400,00 (fl. 359 – cujo registro de domínio ora pleiteia).

Cada um dos demais herdeiros filhos recebeu a parte ideal de 20% de 81.112%, de bem imóvel avaliado em R$ 6.020.000,00, num total de R$ 976.588,48 para cada um.

Apesar do plano de partilha a fls. 355 dispor que a meação seria de R$ 4.882.450,00 e que o valor da legítima de cada um dos herdeiros seria de R$ 813.741,66, não foi isso que, na divisão do patrimônio, ocorreu.

Caracterizada, portanto, a partilha desigual, e o descompasso entre o plano de partilha e a distribuição dos quinhões, correta a exigência do Oficial de Registro de Imóveis para o aditamento do formal de partilha e a comprovação do recolhimento ou isenção do ITCMD sobre o valor que excede o quinhão, devendo ser calculado tendo como base os valores declarados na partilha.

Oportuno apontar entendimento esposado em recente julgado do C. CSM (Apel. 1029036-90.2025.8.26.0100) acerca da abrangência da fiscalização cabível aos Notários e Registradores com relação à aferição de existência e recolhimento do tributo e a correção do valor recolhido.

De fato, a conclusão a que se chegou é a de que aos Notários e Registradores cabe a fiscalização tão somente da existência e recolhimento do tributo, sem verificação da exatidão, “salvo se houver equívoco manifesto, aferível prima facie, sem a necessidade de ingresso acerca de tese controvertida sobre a base de incidência ou alíquota aplicável.”

E é justamente o que ocorre nesses autos: embora o recorrente tenha trazido a declaração de recolhimento do ITCMD, não o fez quanto a todos os imóveis existentes no Estado (matrículas 10.373 e 12.328 – fl. 349) e há flagrante divergência, não só entre os valores de avaliação apontados na partilha e os utilizados para apuração do tributo incidente, como também entre os percentuais incidentes (fls. 89 e 359).

De todo modo, é preciso ressalvar que o quanto observado tem apenas o condão de orientar a Oficial em caso de futura prenotação, haja vista que, na espécie, o recurso está prejudicado.

Ante o exposto, NÃO CONHEÇO da apelação, prejudicada a dúvida.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJEN de 17.12.2025 – SP)