2ª VRP|SP: Notas – Pedido de Providências – Negativa de lavratura de escritura pública de divórcio unilateral – Ausência de concordância da outra parte – Manutenção do óbice registrário – Impossibilidade de suprimento de vontade por via administrativa – Necessidade de consenso entre os cônjuges para divórcio extrajudicial – Interpretação das normas da Corregedoria Nacional de Justiça e da CGJ/SP – Distinção entre jurisdição administrativa e judicial – Decisão judicial que admite divórcio liminar unilateral (REsp 2189143/STJ) não se aplica à via extrajudicial – Competência administrativa do juízo corregedor permanente não abrange substituição de manifestação de vontade – Pedido indeferido e arquivamento determinado.
Processo nº 1046958-47.2025.8.26.0100
Juízo da 2ª Vara de Registros Públicos da Capital
Juíza Fernanda Perez Jacomini
Trata-se de pedido de providências formulado pelo Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelionato de Notas do 22º Subdistrito da Capital, diante da impugnação apresentada por usuário contra a negativa de lavratura de Escritura Pública de Divórcio Unilateral.
A parte representante habilitou-se nos autos, reiterando sua insurgência (fls. 46/49). O Ministério Público, por sua vez, manifestou-se pela manutenção do óbice registrário, com fundamento nas normas legais aplicáveis (fls. 55/56).
O usuário, por meio de advogado, requereu a lavratura de escritura pública de divórcio, na qual apenas o cônjuge varão compareceria. O cartório negou o pedido, sob o argumento de que não há previsão legal para a realização do divórcio extrajudicial sem consenso entre as partes.
Apesar das justificativas prestadas pela serventia, o interessado insiste na lavratura, com base no argumento de que o divórcio é um direito potestativo e, por isso, não requer anuência da parte contrária.
Este Juízo reconhece o entendimento jurisprudencial segundo o qual o direito ao divórcio é potestativo, inclusive de forma unilateral e sem necessidade de contraditório, no âmbito judicial.
Contudo, na via administrativa, essa possibilidade não encontra respaldo normativo. A Constituição Federal (art. 226, § 6º), ao tratar do divórcio, não aborda a forma extrajudicial nem dispensa o consenso.
As Normas da Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ, art. 441 e seguintes) e da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo (Subseção III, item 76 e seguintes), bem como a legislação infraconstitucional, são expressas ao exigir o consenso entre as partes para a realização do divórcio pela via notarial.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça no REsp 2189143, que admite o divórcio liminar unilateral no processo judicial, não se aplica ao âmbito extrajudicial. Isso porque a jurisdição judicial dispõe de mecanismos próprios de citação, contraditório, produção de provas e eventual declaração de nulidade do matrimônio, os quais não estão disponíveis à atividade notarial.
Assim, não há que se falar em divórcio unilateral perante a serventia extrajudicial. Tampouco possui este Juízo Corregedor Permanente competência para autorizar a lavratura do ato sem a presença da outra parte, ou suprir sua manifestação de vontade.
A atuação da Corregedoria Permanente é limitada à fiscalização dos serviços notariais e registrais, nos termos do Decreto-Lei Complementar nº 3/1969 (arts. 34, 37 e 38), não lhe sendo atribuída atividade jurisdicional substitutiva de vontade.
Questões envolvendo direitos personalíssimos, como o divórcio, devem ser submetidas à jurisdição contenciosa, onde se assegura o contraditório e a ampla defesa.
Dessa forma, mantém-se o óbice registrário, por ausência de amparo legal para a lavratura do ato extrajudicial pretendido sem a anuência da outra cônjuge.
Por consequência, determino o arquivamento dos autos.
Ciência à Senhora Interina da serventia extrajudicial;
Ciência ao Ministério Público;
I.C.
(DJEN de 30.05.2025 – SP)