CSM|SP: Registro de imóveis – Dúvida – Pretensão de registro de escritura pública de venda e compra de imóvel – Exigência do registrador pela apresentação da guia ITBI – Existência de menção expressa e pormenorizada na própria escritura a respeito da liquidação do tributo e do documento que a comprovou – Suficiência assentada – Exigência afastada – Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001306-66.2023.8.26.0103, da Comarca de Caconde, em que é apelante LÚCIA MARIA NIGRO DE SOUZA ABRAHÃO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE CACONDE.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento e julgaram a dúvida improcedente, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 1º de março de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1001306-66.2023.8.26.0103

APELANTE: Lúcia Maria Nigro de Souza Abrahão

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Caconde

VOTO Nº 43.146

Registro de imóveis – Dúvida – Pretensão de registro de escritura pública de venda e compra de imóvel – Exigência do registrador pela apresentação da guia ITBI – Existência de menção expressa e pormenorizada na própria escritura a respeito da liquidação do tributo e do documento que a comprovou – Suficiência assentada – Exigência afastada – Recurso provido.

Cuida-se de apelação interposta por LÚCIA MARIA NIGRO DE SOUZA ABRAHÃO (fls. 51/54) contra a r. sentença (fls. 43/46), proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente da Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Caconde, que manteve a negativa de registro da escritura pública de compra e venda do imóvel de matrícula nº 6.500 daquela serventia (fls. 10/11), pois não veio acompanhada da guia de ITBI quitada, em ofensa ao disposto no art. 289 da Lei n.º 6.015/1973 e ao art. 30, inciso XI, da Lei n.º 8.935/1994.

Em suas razões de recurso, a apelante alega, em síntese, que, na certidão apresentada a fls. 06/09, consta expressamente o recolhimento do tributo e a completa descrição da guia de recolhimento (autenticidade do banco, valor, livro de arquivamento, etc.), conforme fl. 08.

Além disso, a escritura pública foi lavrada pelo Tabelião, que possui fé pública, razão pela qual, no seu entender, descabida é a exigência de apresentação da guia de recolhimento do referido imposto.

Por fim, esclarece que houve a perda do documento original e, embora respeite a conduta do registrador e compreenda o dever de fiscalização que se lhe impõe, considera que a menção referida é suficiente a comprovar o recolhimento do tributo devido.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso (fls. 73/75).

É o relatório.

A recorrente apresentou, à Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Caconde, a escritura pública de venda e compra de 1/3 do imóvel objeto da matricula de nº 6.500 (descrito na C.R.I. de fls. 13/16), lavrada em 28/09/2018 perante o Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da mesma comarca.

O pedido foi protocolado sob nº 81.164, em 17/05/2023, e ensejou a seguinte nota de devolução (fl. 17):

“1) Apresentação da guia de ITBI relativa à alienação, instruída com o respectivo comprovante de pagamento, em sua via original ou em cópia autenticada, nos termos do art. 289 da Lei Federal nº 6.015/73 c/c art. 58, I do Código Tributário Municipal.

Informo que poderá ser solicitada uma certidão da guia de ITBI quitada no Tabelião de Notas de Caconde, que lavrou a Escritura de Venda e Compra.”

A requerente realizou o reingresso do título em 30 de maio de 2023, acompanhado apenas do requerimento de fl. 18, no qual afirmou que não iria cumprir a nota de exigência por entender que a fé pública do Tabelião de Notas, que no título declarou ter arquivado a guia de ITBI e seu comprovante, era suficiente para que o registrador o considerasse quitado e comprovado.

Foi, então, inaugurado o procedimento de dúvida, solicitado pela requerente (fls. 01/05).

Após parecer do Ministério Público pela improcedência da dúvida (fls. 33/37) e manifestação da interessada (fl. 38), sobreveio a prolação da sentença (fls. 43/46), que manteve a exigência da Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Caconde, contra a qual há insurgência via recurso de apelação.

Pois bem.

Pelo relato feito, constata-se que a interessada postulou o registro da escritura pública de compra e venda de 1/3 do referido bem, conforme se vê da certidão a fls. 06/09.

Na ocasião, foi levantado óbice atinente ao título, relativo à apresentação da guia de ITBI, em atenção ao disposto no artigo 289 da Lei 6.015/73.

Todavia, razão não assiste à zelosa Registradora.

Isto porque a lei 6.015/73 dispõe apenas que o Registrador deve fiscalizar a ocorrência de pagamento dos impostos.

De fato, dispõe o artigo 289:

“No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

E, no caso em apreço, há menção de que houve recolhimento do ITBI na certidão da escritura pública, com descrição detalhada dos dados da guia, conforme se observa a fl. 08, o que é suficiente para o atendimento do disposto no artigo supra transcrito.

Além disso, o artigo 58, I, do Código Tributário do Município de Caconde apenas estabelece que a compra e venda de imóvel é fato gerador de imposto sobre transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, mas nada dispõe sobre a exigência de apresentação da guia correspondente por ocasião do registro do título no fólio real.

Além disso, na espécie, houve apresentação da certidão da escritura pública de compra e venda ao Registrador, a qual, nos termos do item 152 das NSCGJ é título hábil para o ingresso no Registro de Imóveis.

De se notar que o item 152.1 das mesmas normas, ao dispor que o traslado das escrituras relativas a imóveis sejam instruídos com a guia de ITBI ou sua cópia autenticada, destina-se ao Tabelião que lavrou a escritura, a fim de que o interessado receba a comprovação do pagamento do tributo, não implicando a exigência pela apresentação da guia por parte do Registrador de Imóveis se, na espécie, a própria escritura faz referência detalhada ao pagamento do tributo em pauta.

Não subsiste, pois, razão para a procedência da dúvida, pelas razões acima explicitadas, devendo o título ter acesso ao fólio real.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao apelo e julgo a dúvida improcedente.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator.

(DJe de 07.03.2024 – SP)