CSM|SP: Registro de imóveis – Usucapião extrajudicial – Rejeição do pedido – Dúvida procedente – Controvérsia sobre o preenchimento dos requisitos legais para a aquisição da propriedade por usucapião, na modalidade eleita – Impossibilidade de prosseguimento da usucapião, na via extrajudicial – Interessada que, assim querendo, poderá buscar solução jurisdicional como disposto no art. 216-A, § 9º, da Lei nº 6.015/1973 e no item 421.5, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – Apelação não provida.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1030352-38.2021.8.26.0405, da Comarca de Osasco, em que são apelantes SILVANA GRINBERG DE ROUSSET VALENTE, OVIDIO MIGUEL VALENTE e CELLY DE ROUSSET MEDICI, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE OSASCO.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 7 de novembro de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1030352-38.2021.8.26.0405

APELANTES: Silvana Grinberg de Rousset Valente, Ovidio Miguel Valente e Celly de Rousset Medici

APELADO: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Osasco

VOTO Nº 39.087

Registro de imóveis – Usucapião extrajudicial – Rejeição do pedido – Dúvida procedente – Controvérsia sobre o preenchimento dos requisitos legais para a aquisição da propriedade por usucapião, na modalidade eleita – Impossibilidade de prosseguimento da usucapião, na via extrajudicial – Interessada que, assim querendo, poderá buscar solução jurisdicional como disposto no art. 216-A, § 9º, da Lei nº 6.015/1973 e no item 421.5, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça – Apelação não provida.

Trata-se de apelação (fls. 379/403) interposta por Silvana Grinberg de Rousset Valente, Ovídio Miguel Valente e Celly de Rousset Medici em face da r. sentença (fls. 377/378) proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco, que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa de registro da aquisição da propriedade por usucapião do imóvel da transcrição nº 22.575 pela divergência de área entre o constante no pedido e nos demais documentos apresentados, nos termos do artigo 17 do Provimento nº 65 do CNJ.

Afirmam os apelantes, em síntese, ser desimportante a divergência entre a área descrita no formal de partilha do imóvel da transcrição nº 22.575 e a área de fato existente porque se trata de usucapião extraordinária, sendo inexigível justo título; inexistir invasão ou sobreposição de área porque os confrontantes são os mesmos; integrar a área remanescente o imóvel objeto da transcrição nº 22.575, apesar da área descrita ser menor do que a área que efetivamente existe no local.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 433/435).

É o relatório.

Cuida-se de processo extrajudicial de usucapião de imóvel urbano, que correu perante o 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco, e no qual a MM.ª Juíza Corregedora Permanente julgou procedente a dúvida suscitada e confirmou a rejeição do pedido, mantendo a negativa de registro.

Houve, de fato, menção equivocada ao imóvel da transcrição nº 22.626, provavelmente decorrente do erro contido no formal de partilha que igualmente fez referência ao aludido assento.

No entanto, o imóvel que se pretende usucapir é o remanescente da transcrição nº 22.575, o qual será levado em conta para o julgamento do presente recurso.

Desde logo, importa consignar tratar-se de processo de dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, em virtude de impugnação da parte requerente da usucapião à rejeição do pedido e consequente negativa de inscrição, nos termos do art. 17, § 5º, do Provimento CNJ nº 65/2017 e do item 421.5, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

O Oficial de Registro indeferiu o pedido de usucapião nos seguintes termos (fls. 308/309):

“A área inicial da referida transcrição é 680,00m², objeto de dois destaques que originaram as matrículas 80.281 e 25.316 com as áreas de 314,00m² e 242,00m², respectivamente. Restou área de 124,00m².

Conforme Formal de Partilha e demais documentos autuados (fls. 2 a 9, 17 a 20 e 80 a 179) verifica-se divergência de área entre o remanescente da transcrição e a área pretendida no pedido, 340,85m², maior do que a área remanescente da transcrição.

Os requerentes alegam que sempre pagaram os impostos sobre a área de 340,85m² conforme demonstrado nos Impostos Prediais autuados sob as (fls. 56 a 75).

Decido.

Não promovida a comprovação documental sobre a totalidade da área pretendida de 340,85m². Esta se restringe a 124,00m² do negócio objeto de regularização pela usucapião extrajudicial.

Título apresentado em atendimento ao art. 13, §4º e art. 17, §2º do Provimento 65/2017 do Conselho Superior da Magistratura e itens 419.4 e 421.2 da Seção XII das Normas da Corregedoria Geral do Estado de São Paulo/SP é insuficiente à totalidade pretendida.

Com base no art. 17, §2º do Provimento 65/2017 do Conselho Superior da Magistratura extingo o procedimento sem deferimento da pretensão.

Fica ao critério das partes requerentes o eventual uso da via judicial para usucapião”.

Depreende-se da certidão de transcrição nº 22.575 (fls. 22/24) que o imóvel perfazia área de 680,00 m², mas sofreu dois destaques, de 314,00m² e de 242,00m², como se vê das certidões de matrículas nºs 80.281 (fls. 27/31) e 25.316 (fls. 32/33), respectivamente.

Então, o total remanescente do imóvel da transcrição nº 22.575 é de 124,00m².

No entanto, a ata notarial descreve a superfície de 340,85m² como a área a ser usucapida (fls. 14/21).

Vê-se, portanto, que a área a ser usucapida (340,85m²) é maior do que a remanescente do imóvel da transcrição nº 22.575 (124,00m²) após sofrer os dois destaques de área por força da abertura das matrículas nºs 80.281 e 25.316.

De outra parte, o formal de partilha extraído dos autos de inventário de Josef Grinberg, pai das apelantes Silvana e Celly, identifica o imóvel da transcrição nº 22.575 de modo absolutamente divergente do registro imobiliário, e nem mesmo indica sua área (item “d”, fls. 112).

As demais provas documentais acostadas não são suficientes ao deferimento da usucapião pela via extrajudicial: o memorial descritivo é elaborado mediante providência da própria parte; a anuência dos confrontantes não tem o condão de, por si só, demonstrar a superfície em questão; e, por fim, ainda que os comprovantes de pagamento de IPTU eventualmente abrangessem o prazo de usucapião extraordinário e descrevessem a área usucapienda, seriam insuficientes para o deferimento do pedido ante as divergências antes apontadas.

A propósito, o §8º do art. 216-A da Lei nº 6.015/1973, prevê a rejeição do pedido pelo Oficial do Registro de Imóveis se a documentação exigida não estiver em ordem para a concessão da usucapião extrajudicial.

Destarte, havendo controvérsia, no caso concreto, sobre o preenchimento dos requisitos legais para a aquisição da propriedade por usucapião, na modalidade eleita, caberá aos requerentes, assim querendo, buscarem na via jurisdicional o reconhecimento de seu alegado direito, de acordo com a possibilidade instituída pelo art. 216-A, § 9º, da Lei nº 6.015/1973 e pelo item 421.5, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

Em suma, não há como prosseguir na via extrajudicial, devendo a apelante se valer de ação contenciosa para a pretendida aquisição de domínio por usucapião.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 02.02.2024 – SP)