CSM|SP: Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Instrução do requerimento de reconhecimento extrajudicial da usucapião – Obrigatoriedade de apresentação da prova de quitação do contrato de cessão de direitos, em que se funda a posse dos interessados – Suprimento por certidões de distribuição que indiquem a inexistência de litígio judicial (NSCGJ, II, XX, 419.3.1) – Dúvida improcedente – Apelo provido para que, reformada a sentença e afastado o óbice, se prossiga no processo extrajudicial de usucapião.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1016295-15.2021.8.26.0405, da Comarca de Osasco, em que são apelantes CELIA REGINA MARTINS PANSARINI, GEOVANA REGINA PANSARINI, FERNANDA REGINA PANSARINI LEAL e CLAYTON BORGES LEAL, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE OSASCO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, com determinação, v.u. Declarará voto o Des. Ricardo Anafe.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL) E WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO).

São Paulo, 15 de fevereiro de 2022.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1016295-15.2021.8.26.0405

APELANTES: Celia Regina Martins Pansarini, Geovana Regina Pansarini, Fernanda Regina Pansarini Leal e Clayton Borges Leal

APELADO: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Osasco

VOTO Nº 38.564

Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Instrução do requerimento de reconhecimento extrajudicial da usucapião – Obrigatoriedade de apresentação da prova de quitação do contrato de cessão de direitos, em que se funda a posse dos interessados – Suprimento por certidões de distribuição que indiquem a inexistência de litígio judicial (NSCGJ, II, XX, 419.3.1) – Dúvida improcedente – Apelo provido para que, reformada a sentença e afastado o óbice, se prossiga no processo extrajudicial de usucapião.

Trata-se de apelação interposta por Célia Regina Martins Pansarini, Fernanda Regina Pansarini Leal, Geovana Regina Pansarini e Clayton Borges Leal contra a r. sentença, proferida pela MMª. Juíza Corregedora Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco, que manteve as exigências formuladas pelo Registrador (fls. 176/177), impedindo o prosseguimento do requerimento de reconhecimento extrajudicial da usucapião do imóvel matriculado sob nº 58.082 da referida serventia extrajudicial (fls. 60/61).

Em suas razões, os recorrentes, que receberam por herança os direitos sobre o referido imóvel, alegam terem preenchido todos os requisitos necessários ao deferimento da usucapião ordinária, nos moldes do artigo 1.242, do Código Civil, haja vista que exercem a posse exclusiva sobre o bem, com animus domini, por 43 anos, destacando que o Registrador apenas fez a exigência quanto à prova da quitação após os recolhimentos, notificações, editais, consultas e certidões. Salientam que seu direito está amparado pelo artigo 216-A, § 10º, da Lei nº 6.015/1973, assim como nos artigos 1.238, 1.240 e 1.242, do Código Civil, e artigo 9º, da Lei nº 10.257/2001. Em caráter subsidiário, pedem a conversão do processo de suscitação de dúvida em processo de usucapião judicial (fls. 220/227).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 256/257).

É o relatório.

Os recorrentes pretendem o reconhecimento extrajudicial da usucapião do imóvel correspondente ao “lote de terreno constituído pela metade do lote 11 da quadra 128, da Vila Osasco, na Cidade de Osasco, medindo 5,00m de frente para a Rua Carlos Rossetti (em linha ligeiramente curva); confinando do lado direito, com o remanescente do mesmo lote 11, que fica pertencendo a Rosa Maria da Silva, onde mede 35,00m (isto de quem da rua olha para o terreno), do outro lado confina com o lote nº 12, onde mede 36,00m e nos fundos confina com os lotes nºs 27 e 28, onde mede 6,525m., compromissados a José Q. Furtuny e outro, encerrando uma área de 201,00ms.2”, objeto da matrícula nº 58.082, do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco (fls. 60/61).

Analisados o requerimento e os documentos apresentados, exigências foram feitas e remanesceu a prova da quitação (fls. 176), daí porque sobreveio a decisão do Oficial, valendo destacar o seguinte trecho:

“A ausência de comprovação da quitação total do referido justo título, desatendendo a exigência do art. 4º, inciso III e art. 13, §1º, inciso I e II e §3º e §4º do Provimento 65/2017 do Conselho Superior da Magistratura e item 416.2, inciso III e itens 419 e 419.1, indiso I, II e item 419.3 da Seção XII das Normas da Corregedoria Geral do Estado de São Paulo/SP”.

A pretensão é de usucapir imóvel objeto de herança, cuja posse, segundo os apelantes, é exercida há 43 (quarenta e três) anos, de forma exclusiva, ininterrupta e sem oposição (artigo 1.238, do Código Civil).

Exigida a prova da quitação relativa ao contrato particular de cessão de direitos relativo ao imóvel, ela não foi apresentada, nem mesmo em grau recursal.

A exigência, na verdade, decorre dos artigos 4º, III e 13, § 1º, I e II e § 3º e § 4º, do Provimento nº 65/2017, do C. Conselho Nacional de Justiça e, também, dos itens 416.2, III, 419 e 419.1, I, II e 419.3, da Seção XII do Capítulo XX do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo (NSCGJ), dispositivos que praticamente repetem os do mencionado Provimento nº 65/2017 do CNJ.

Entretanto, o regulamento estadual vai além da disciplina federal e, em boa prudência, dispõe claramente que, faltando a prova de quitação, pode ela ser suprida por prova de que, decorrido o prazo para pagamento, não houve litígio acerca desse adimplemento.

É o que dizem as NSCGJ, Tomo II, Cap. XX, subitem 419.3.1:

419.3.1. Equivale à prova de quitação, a certidão emitida após 5 (cinco) anos do vencimento da última prestação pelo Distribuidor Cível da comarca do imóvel e da comarca do domicilio do requerente, se diversa (CC, art. 206, § 5º, I), que explicite a inexistência de ação judicial que verse sobre a posse ou a propriedade do imóvel contra o adquirente ou seus cessionários.

E esse suprimento veio pelas certidões copiadas a fls. 39/40 (relativas ao vendedor e dono José Sales), 41, 78, 79, 82 e 106 (concernentes à requerente Geovana), 42 (referente ao adquirente Aparecido, já finado), 43, 75, 84 e 103 (relativas à requerente Célia, que também assina Cecília), 44, 76, 80, 83 e 104 (referentes à requerente Fernanda) e 77, 81, 85 e 105 (concernentes ao requerente Clayton), pois todos esses documentos indicam, de forma peremptória, que não há contenda judicial acerca da posse dos recorrentes.

Logo, as exigências formuladas pelo Oficial, e a extinção que lhe foi consequente (fls. 176/177), não merecem subsistir e, por tal motivo, a r. sentença tem de ser reformada para que, afastado tal óbice, retornem os autos ao ofício de registro de imóveis, na forma das NSCGJ, II, XX, 420.5, para prosseguimento nos termos e atos ulteriores do processo extrajudicial de usucapião.

Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao apelo para que, reformada a r. sentença, fique afastado o óbice registral e seja possível avançar no processo de usucapião.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Voto nº 31.704

Apelação Cível nº 1016295-15.2021.8.26.0405

Comarca: Osasco

Apelantes: Celia Regina Martins Pansarini, Geovana Regina Pansarini, Fernanda Regina Pansarini Leal e Clayton Borges Leal

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Osasco

Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Demonstração do exercício de posse por período superior ao de quinze anos previsto no art. 1.238 do Código Civil – Exigência, pelo Oficial de Registro de Imóveis, de comprovação do pagamento do preço do contrato de compromisso de compra e venda – Aquisição pela usucapião extraordinária que, porém, não depende da existência de justo título – Contrato de compromisso de compra e venda, ademais, que foi celebrado em 12 de março de 1979 e teve a última prestação vencida em 17 de março de 1982, sem que o promitente vendedor tenha movido ação judicial relativa ao imóvel – Recurso provido, com observação, para, afastada a exigência, determinar que o Oficial de Registro de Imóveis prossiga mediante notificação dos confrontantes que não apresentaram anuência com o pedido.

1. Ex antecumpre destacar a adoção do relatório elaborado, bem como a excelência do voto do eminente Relator Desembargador Fernando Antonio Torres Garcia.

Celia Regina Martins Pansarini, Geovana Regina Pansarini e Fernanda Regina Pansarini pretendem o reconhecimento extrajudicial da aquisição, pela usucapião, do imóvel consistente em metade lote 11 da quadra 128 da Vila Osasco, situado na rua Carlos Rossetti, objeto da matrícula nº 58.082 do 1º Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco, alegando o exercício de posse com animus domini, de forma mansa e pacífica, pelo prazo de quarenta e um anos e seis meses.

Afirmaram que Aparecido Donizetti Pansarini adquiriu a posse do imóvel em 12 de março de 1979, por contrato particular celebrado com José Sales, e que na referida data o compromissário comprador iniciou a construção de uma casa, cerca e muros, nele passando a residir (fl. 51).

Esclareceram que são viúva, filhos e genro de Aparecido Donizetti Pansarini, a quem sucederam na posse do imóvel de que, por seu turno, adquiriram o domínio pelo decurso do prazo previsto no art. 1.238 do Código Civil (fl. 51, item 2).

Por sua vez, o reconhecimento da usucapião foi recusado porque o procedimento extrajudicial não foi instruído com prova do pagamento do preço do compromisso de compra e venda celebrado entre Aparecido Donizetti Pansarini e José Sales, o que, segundo o Oficial de Registro, seria indispensável em razão do disposto nos arts. 4º, inciso III, e 13, § 1º, do Provimento 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça e nos itens 416.2, inciso III, 419, 419.1, incisos I e II, e 419.3 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (fl. 176).

2. Respeitado o entendimento em sentido contrário, in casu não se pode exigir a prova da existência de justo título para a aquisição do domínio do imóvel porque as apelantes, no requerimento inicialmente formulado ao Oficial de Registro de Imóveis (fl. 51, item 2, e 94, item 2) e no pedido de suscitação de dúvida (fl. 183, item 2), requereram, de forma expressa, o reconhecimento da aquisição do domínio com fundamento no art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil.

Consta do requerimento formulado ao Oficial de Registro de Imóveis:

A modalidade pretendida de reconhecimento de usucapião é a de 2 a 15 anos. Assim, no tocante a contagem do lapso temporal do exercício da posse, aplicasse o prazo previsto no art. 1238 do Código Civil, parág. único, totalizando, portanto, 41 anos de posse contínua, ininterrupta, mansa e pacífica, com animus domini, exercida a justo título e boa-fé desde o seu início dada em 12/03/1979” (fl. 51).

E o reconhecimento extrajudicial da aquisição do domínio pela usucapião extraordinária prevista no art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil independe da comprovação da existência de justo título:

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzirse- á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo” (grifei).

Desse modo, na usucapião extraordinária tanto a comprovação do título como a da boa-fé são dispensadas, ou seja, não demandam a realização da prova exigida pelo Oficial de Registro.

Benedito Silverio Ribeiro, nesse sentido, esclarece que:

O justo título, diga-se desde logo, constitui requisito legal à caracterização da usucapião ordinária, uma vez que à extraordinária se presume.

O art. 550 do Código Civil, na verdade, traz uma linguagem imprecisa, dado que, da mesma forma que a boa-fé, não induz presunção, mas sim dispensa. A Lei n. 2.437/55, diminuente dos prazos, cometeu enganos: além da redação dizer justo título de boa-fé, ainda pôs o verbo presumir no singular. Mas o espírito do legislador do Código de 1916 sempre foi o da dispensa, e no lugar do ‘de’ o exato seria a aditiva ‘e’.

Portanto, como na boa-fé, dispensa-se na prescrição extraordinária o justo título, não constituindo, destarte, requisito legal nessa modalidade prescricional da aquisição” (Tratado de Usucapião, Vol. 2, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, p. 729).

3. Não se ignora que no requerimento formulado ao Oficial de Registro de Imóveis as apelantes fizeram referência à existência de justo título e boa-fé (fl. 51, item 2), mas assim ocorreu para esclarecer a origem da posse que foi adquirida por contrato particular de compromisso de compra e venda celebrado entre Aparecido Donizetti Pansarini e José Sales e, dessa forma, fundamentar o seu exercício com animus domini (fl. 53).

Assim, a referência ao contrato de compromisso de compra e venda como justificativa para a origem da posse visou atender o requisito previsto no inciso III do art. 4º do Provimento CNJ nº 65/2017 que dispõe:

Art. 4º O requerimento será assinado por advogado ou por defensor público constituído pelo requerente e instruído com os seguintes documentos:

(…)

III – justo título ou quaisquer outros documentos que demonstrem a origem, a continuidade, a cadeia possessória e o tempo de posse;” (grifei).

E ainda que o pedido consistisse no reconhecimento da aquisição do domínio pela usucapição ordinária, o que, reitero, não ocorre neste caso concreto, a prova do pagamento do preço do contrato de compromisso de compra e venda não poderia ser exigida como requisito incontornável para a demonstração da existência de justo título.

Isso porque o inciso III do art. 4º, inciso III, e o § 1º, inciso I e II, e os §§ 3º e 4º, do art. 13 do Provimento CNJ nº 65/2017, referidos na devolução do título (fl. 176), não preveem a prova da quitação do preço do compromisso de compra e venda como requisito essencial para a caracterização do justo título, nos casos em que for necessária a comprovação da sua existência.

Ao contrário, o art. 13, caput, do Provimento CNJ nº 65/2017 faz presumir a anuência do titular do domínio do imóvel e, portanto, dispensa a sua notificação quando o requerimento for instruído com justo título ou instrumento que demonstre a existência de negócio jurídico destinado à transmissão do imóvel, acompanhado da prova da quitação do preço:

Art. 13. Considera-se outorgado o consentimento mencionado no caput do art. 10 deste provimento, dispensada a notificação, quando for apresentado pelo requerente justo título ou instrumento que demonstre a existência de relação jurídica com o titular registral, acompanhado de prova da quitação das obrigações e de certidão do distribuidor cível expedida até trinta dias antes do requerimento que demonstre a inexistência de ação judicial contra o requerente ou contra seus cessionários envolvendo o imóvel usucapiendo” (grifei).

Para a finalidade de dispensa da notificação do transmitente titular do domínio, a comprovação do pagamento do preço do contrato de compra e venda é prevista no § 1º, inciso I, do art. 13 do Provimento CNJ nº 65/2017 como exemplo de título ou instrumento a que se refere o caput do daquele artigo:

“§ 1º São exemplos de títulos ou instrumentos a que se refere o caput:

I – compromisso ou recibo de compra e venda;”.

Em igual sentido são os itens 419 e 419.1 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça que, por sua vez, no item 419.3.1 dispensam a prova da quitação, nos negócios jurídicos onerosos, quando a certidão do distribuidor cível da comarca da situação do imóvel e da comarca do domicílio do requerente comprovar a inexistência de ação sobre a posse ou propriedade do imóvel ajuizada contra o adquirente ou seus cessionários:

419.3.1. Equivale à prova de quitação, a certidão emitida após 5 (cinco) anos do vencimento da última prestação pelo Distribuidor Cível da comarca do imóvel e da comarca do domicilio do requerente, se diversa (CC, art. 206, § 5º, I), que explicite a inexistência de ação judicial que verse sobre a posse ou a propriedade do imóvel contra o adquirente ou seus cessionários”.

Destarte, a prova do pagamento do preço do contrato de compromisso de compra e venda, embora também possa caracterizar justo titulo, é prevista no Provimento CNJ nº 65/2017 e nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça como um dos modos de comprovação da origem e da forma do exercício da posse que, porém, podem ser demonstradas por outros meios.

4. Por seu turno, o documento de fl. 08/11 comprova que Aparecido Donizette Pansarini compromissou comprar o imóvel de José Sales que, por sua vez, dele figura na matrícula nº 58.082 como proprietário (fl. 60/61), por contrato particular celebrado em 12 de março de 1979, pelo preço de Cr$ 350.000,00 a ser pago mediante sinal de Cr$ 150.000,00, e o restante em trinta e quatro parcelas, a última com vencimento em 17 de março de 1982 (fl. 09).

Entre o vencimento da última parcela do preço do compromisso de compra e venda e a formulação do pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião, em outubro de 2020 (fl. 06), decorreu prazo superior a 38 anos.

Ademais, José Sales, que figura como titular do domínio do imóvel objeto da matrícula nº 58.082 (fl. 60/61), foi notificado por edital publicado em 12 de abril de 2021 (fl. 170) e não apresentou impugnação (fl. 174), sendo a notificação por edital promovida porque não foi localizado no endereço que consta na matrícula (fl. 139 e 16/162).

A notificação assim realizada faz presumir a anuência do titular do domínio com o pedido de reconhecimento extrajudicial da usucapião, como previsto no art. 216-A, § 13, da Lei nº 6.015/73.

Ainda, a certidão de fl. 38/39 comprova a inexistência de ação judicial movida por José Sales tendo por objeto a posse ou domínio de imóvel.

Esses fatos fazem presumir que a posse exercida nesse período, pelas apelantes e por seu antecessor, não teve oposição do promitente vendedor que é o titular do domínio do imóvel.

5. A escritura pública de inventário e partilha de fl. 12/16 demonstra que em razão do falecimento de Aparecido Donizetti Pansarini, ocorrido em 19 de novembro de 2010, tanto os direitos de compromissário comprador como a posse do imóvel foram transmitidos para a viúva Celia Regina Martins Pansarini e para as filhas que são as apelantes Fernanda Pansarini e Geovana Regina Pansarini, ambas solteiras na data da abertura da sucessão.

Portanto, a não comprovação do pagamento do preço do contrato de compromisso de compra e venda não impede o reconhecimento da aquisição do domínio do imóvel pelas apelantes Celia Regina Martins Pansarini, Fernanda Pansarini e Geovana Regina Pansarini, na proporção prevista na partilha decorrente do falecimento de Aparecido Donizetti Pansarini e no requerimento de fl. 93/99 que foi dirigido ao Oficial de Registro de Imóveis.

6. Porém, o procedimento extrajudicial de reconhecimento de usucapião não foi concluído porque, apesar da notificação do Estado de São Paulo (fl. 135/139) e da publicação de edital para notificação do proprietário do imóvel e dos terceiros interessados (fl. 170), não foram notificados os confrontantes que não apresentaram anuência com o pedido.

Em razão disso, o procedimento deve retornar ao Registro de Imóveis para que tenha prosseguimento, com a observação de que na eventual necessidade de publicação de novo edital os custos deverão ser suportados pelo Oficial de Registro que se antecipou ao publicar o edital de fl. 170 sem antes completar as notificações.

7. Ante o exposto, pelo meu voto dou provimento ao recurso para afastar a exigência e determinar que o procedimento de reconhecimento extrajudicial de usucapião prossiga mediante notificação dos confrontantes, com observação.

RICARDO ANAFE

Presidente do Tribunal de Justiça 

(DJe de 19.04.2022 – SP)