CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de compra e venda – Qualificação negativa – Questionamento a respeito da base de cálculo utilizada para recolhimento do imposto sobre transmissão de bens imóveis – ITBI – Análise pelo Oficial Registrador, na matéria concernente ao imposto de transmissão, que deve se ater ao seu recolhimento, sem alcançar o valor – Não configuração de flagrante irregularidade no recolhimento – Precedentes do C. Conselho Superior da Magistratura – Dá-se provimento à apelação para julgar a dúvida improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001415-15.2021.8.26.0309, da Comarca de Jundiaí, em que é apelante THIAGO REIS AUGUSTO RIGAMONTI, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE JUNDIAÍ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 22 de novembro de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001415-15.2021.8.26.0309

Apelante: Thiago Reis Augusto Rigamonti

Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Jundiaí

VOTO Nº 31.640

Registro de Imóveis – Escritura pública de compra e venda – Qualificação negativa – Questionamento a respeito da base de cálculo utilizada para recolhimento do imposto sobre transmissão de bens imóveis – ITBI – Análise pelo Oficial Registrador, na matéria concernente ao imposto de transmissão, que deve se ater ao seu recolhimento, sem alcançar o valor – Não configuração de flagrante irregularidade no recolhimento – Precedentes do C. Conselho Superior da Magistratura – Dá-se provimento à apelação para julgar a dúvida improcedente.

1. Trata-se de recurso de apelação interposto por Thiago Reis Augusto Rigamonti contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Jundiaí/SP, que julgou procedente a dúvida registrária e manteve o óbice imposto pelo Registrador referente à exigência de recolhimento da diferença devida a título de ITBI (fl. 71/72).

Alega o apelante, em síntese, que a utilização do valor constante do instrumento de compromisso de compra e venda não pode ser usado como base de cálculo do imposto sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI), devendo prevalecer o valor constante da escritura definitiva de compra e venda levado a registro. Ressalta que o fato gerador do imposto somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, o que se dá mediante o respectivo registro. Acrescenta que o compromisso de compra e venda previamente celebrado configura-se como mera promessa e, portanto, não guarda relação com a efetiva transmissão da propriedade posteriormente realizada e o preço referido na escritura pública levada a registro (fl. 82/96).

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento da apelação (fl. 123/125)

É o relatório.

2. O dissenso versa sobre a possibilidade de registro da Escritura Pública de Compra e Venda, lavrada em 17 de janeiro de 2020, tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 147.877 junto ao 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Jundiaí/SP, pelo valor de R$ 160.715,82 (fl. 19/24).

O Oficial do Registro de Imóveis desqualificou o título e exigiu o recolhimento da diferença do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis ITBI devido à Municipalidade, referente ao negócio jurídico celebrado, em montante a ser calculado com base no valor do compromisso de compra e venda atualizado para o ano de 2019, consoante dispõem os art. 137, inciso I, e 140 da Lei Municipal Complementar nº 460/2008 (Código Tributário do Município de Jundiaí), bem como o art. 156, inciso II, da Constituição Federal, os arts. 35, inciso I, e 134 do Código Tributário Nacional, e o art. 289 da Lei nº 6.015/1973.

A exigência formulada pelo Oficial para registro do título, contudo, não se sustenta. Este C. Conselho Superior da Magistratura vem decidindo que ao Registrador compete verificar tão somente o recolhimento dos tributos relativos aos atos cuja prática lhe é atribuída, pois não lhe cabe discutir o valor recolhido, matéria de interesse exclusivo da Fazenda Municipal, a quem a lei reserva os meios próprios para haver do contribuinte diferenças de recolhimento de impostos que entenda devidas.

Sobre o tema:

“Assentou-se orientação, neste Conselho Superior, no sentido de que o elastério conferido ao artigo 289 da Lei 6.015/73, e agora ao artigo 30, XI, da Lei 8.935, é o de que ao serventuário compete verificar tão só a ocorrência do pagamento do imposto relativo aos atos cuja prática lhe é acometida. Ou seja, no caso, em que se busca a prática de ato registrário, a qualificação do Oficial, na matéria concernente ao imposto de transmissão, não vai além da aferição sobre seu recolhimento, e não sobre a integralidade de seu valor. Com efeito, qualquer diferença de imposto deve ser reclamada pela Fazenda na esfera própria”. (CSMSP – APELAÇÃO CÍVEL: 28.382-0/7. LOCALIDADE: São Paulo. DATA JULGAMENTO: 28/09/1995. DATA DJ: 07/12/1995. Relator: Antônio Carlos Alves Braga. No mesmo sentido: Apelação Cível n.º 22.679-0/9).

Na mesma linha, foi decidido no julgamento da Apelação nº 0002604-73.2011.8.26.0025, em voto da lavra do então Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini, que:

“A falha apontada pelo Oficial envolve questão de questionamento no âmbito do direito material. Não foi atacada a regularidade formal do título nem mesmo a temporalidade do recolhimento ou o ato em si. Ao contrário, a exigência envolve exame substancial do montante do pagamento do imposto devido, que é atribuição dos órgãos fazendários competentes, sendo que seu questionamento mereceria a participação da Fazenda Pública, principal Interessada. Ao Oficial cabe fiscalizar, sob pena de responsabilização pessoal, a existência da arrecadação do imposto previsto e a oportunidade em que foi efetuada. O montante, desde que não seja flagrantemente equivocado, extrapola a sua função. Neste sentido é o parecer da D. Procuradora de Justiça, citando precedente deste E. Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 996-6/6, de 09/12/2008).”

Como se vê, extrapolou o Registrador suas atribuições, pois não lhe cabe atuar como agente fiscal, exigindo a complementação do imposto pago.

Há, ainda, precedentes recentes deste C. Conselho Superior da Magistratura sobre o tema:

“Registro de Imóveis – Escritura pública de dação em pagamento – Qualificação negativa – Questionamento a respeito da base de cálculo utilizada para recolhimento do imposto sobre transmissão de bens imóveis ITBI – Análise pelo oficial registrador, na matéria concernente ao imposto de transmissão, que deve se ater ao seu recolhimento, sem alcançar o valor – Não configuração de flagrante irregularidade no recolhimento – Precedentes do C. Conselho Superior da Magistratura – Apelação provida para julgar a dúvida improcedente. (TJSP; Apelação Cível 1000459-49.2017.8.26.0176; Relator (a): Pinheiro Franco (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Embu das Artes – Vara do Juizado Especial Cível e Criminal; Data do Julgamento: 13/02/2019; Data de Registro: 19/02/2019).

REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública de inventário, adjudicação e partilha – Recusa do Oficial com fundamento na irregularidade de recolhimento de tributo – Discordância quanto à base de cálculo do ITCMD – Dever de fiscalização do Oficial de Registro que se limita à existência do recolhimento do tributo, bem como da razoabilidade da base de cálculo Impossibilidade de recusa ao registro da transmissão causa mortis – Dúvida improcedente – Recurso provido. (TJSP; Apelação Cível 0001065-55.2016.8.26.0459; Relator (a):Ricardo Anafe (Corregedor Geral); Órgão Julgador: Conselho Superior da Magistratura; Foro de Pitangueiras – 1ª Vara; Data do Julgamento: 27/05/2021; Data de Registro: 02/06/2021).”

Veja-se que, no caso concreto, o compromisso de compra e venda sequer foi registrado (fl. 20). Destarte, a qualificação registral deve ser limitada ao título objeto de ingresso no Registro de Imóveis, sendo descabido ao Oficial adentrar na verificação das transações negociais particulares pretéritas, decorrentes de compromissos particulares não publicizados pelo registro.

Por conseguinte, não estando configurado flagrante equívoco no recolhimento do ITBI, há que ser afastado o óbice ao registro.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação para julgar a dúvida improcedente.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 24.0.2021 – SP)