2ª VRP|SP: Tabelionato de Notas – Escritura de Inventário e Partilha – Incapaz como único herdeiro – Autorização à Vara de Registros Públicos ou à Vara de Família e Sucessões – Participação obrigatória do Ministério Público – Recusa formal efetuada pelo Senhor Tabelião fundamentada na Lei e nas Normativas que regem a matéria – Óbice mantido.

Processo 1094372-80.2021.8.26.0100

Pedido de Providências

Tabelionato de Notas

T.N.

H.C.B.N. e outro

Vistos,

Trata-se de pedido de providências formulado pelo Senhor Xº Tabelião de Notas da Capital, em razão de impugnação apresentada em face de sua recusa de lavratura de Escritura Pública de Inventário. A impugnação apresentada pela parte interessada encontra-se acostada às fls. 07/10.

O Ministério Público apresentou parecer pugnando pela manutenção do óbice imposto pelo Senhor Notário (fls. 13/18).

É o breve relatório. Decido.

Cuidam os autos de expediente formulado pelo Senhor Xº Tabelião de Notas da Capital, em razão de impugnação apresentada pela Senhora V. V. M. L. Em face de sua recusa de lavratura de Escritura Pública de Inventário.

Narra a Senhora Representante, nos motivos de sua insurgência, que entende possível a realização de Inventário Extrajudicial, mesmo na existência de herdeiro incapaz, com o fim de otimizar a prestação jurisdicional, deduzindo que não haverá prejuízo ao curatelado, por ser este o único herdeiro.

Diante do óbice aventado pelo Senhor Titular, requer a parte interessada que esta Corregedoria Permanente autorize o ato ou, alternativamente, remeta o casa a uma das Varas de Família competentes.

A seu turno, o Senhor Tabelião esclareceu pela impossibilidade do procedimento extrajudicial, no presente caso, por expressa vedação legal e normativa, não possuindo o Delegatário atribuição para ir contra o ordenamento vigente.

Não obstante, apresentou compreensão pessoal favorável à alteração, mencionando a situação do inventario extrajudicial com testamento e possibilidade da atuação do Ministério Público com atribuições nesta Vara de Registros Públicos.

De sua parte, o Ministério Público opinou pela manutenção da negativa, ante a expressa impossibilidade legal de realização do instrumento público tal qual pretendido.

Pois bem. De início, faço destacar que a normativa que atinge a matéria é clara na vedação à realização do Inventário Extrajudicial na existência de herdeiros incapazes, em conformidade ao artigo 610, caput, do Código de Processo Civil, ao dispor:

“Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial”.

Na mesma esteira, as Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça, em seu Capítulo XVI e em conformidade à Resolução CNJ nº 35, fazem várias referências à capacidade das partes como requisito necessário à lavratura de Inventário Extrajudicial.

Nesse sentido, leia-se:

107. Admitem-se inventário e partilha extrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capazes, inclusive por emancipação, representado(s) por procuração formalizada por instrumento público com poderes especiais.

124. Havendo um só herdeiro, maior e capaz, com direito à totalidade da herança, não haverá partilha, lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens.

130. Diante da expressa autorização do juízo sucessório competente, nos autos do procedimento de abertura e cumprimento de testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes, poderão ser feitos o inventário e a partilha por escritura pública, que constituirá título hábil para o registro imobiliário.

Igualmente, há que se destacar o parecer do i. Promotor de Justiça, que aponta que, em situação envolvendo incapaz, a participação do Ministério Público é obrigatória. Contudo, o d. Representante da Promotoria de Registros Públicos afirma que não detém atribuição para atuar em questões de Família e Sucessões.

Por fim, sublinha que não há previsão da intervenção do Parquet na lavratura de Inventário Extrajudicial.

Com efeito, é certo que todas as considerações apostas pela parte interessada, quanto à inexistência de prejuízo ao incapaz, requerem efetivo acompanhamento pela Promotoria de Justiça com atribuições bastantes e devem ser analisadas, na seara judicial, se o caso, com a devida instrução probatória.

Observo que a situação do testamento com inventario extrajudicial é pouco diversa em razão da ausência de incapazes na situação; além disso, a imparcialidade do Tabelião exigiria a atuação de outro órgão, o Ministério Público, para exame do interesse do incapaz.

Apesar dos aspectos positivos da desjudiciliazação há dificuldade na transposição do expresso óbice legal acerca da proteção dos incapazes por meio da interpretação da legislação incidente, sobretudo no âmbito administrativo.

Nessa ordem de ideias, a recusa formal efetuada pelo Senhor Tabelião não merece reparo, posto que devidamente fundamentada na Lei e nas Normativas que regem a matéria.

Assim, respeitada compreensão do Culto Dr Advogado e as considerações do Douto Sr. Tabelião, a impugnação ofertada pela parte interessada não merece acolhida, razão pela qual mantenho o óbice imposto pelo Senhor Notário.

Outrossim, não é o caso de redistribuição do presente expediente, de caráter estritamente administrativo e cujo requerente é o próprio Tabelião, à Vara de Família, certo que tal providência compete à parte interessada.

Nessas condições, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, determino o arquivamento dos autos.

Ciência ao Senhor Tabelião e ao Ministério Público, intimando-se a interessa pela impressa por meio de seu advogado.

Encaminhe-se cópia das principais peças dos autos, conforme relatório, à E. Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente como ofício, para conhecimento da questão posta.

P.I.C.

(DJe de 01.10.2021 – SP)