CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de venda e compra – Exigência de cadastro autônomo junto ao INCRA – Imóvel menor que a área mínima exigida para exploração rural – Matrícula já aberta em conformidade com as transcrições anteriores – Alienação de partes ideais pelos demais condôminos à adquirente, que se tornou titular de domínio da integralidade do imóvel – Escritura pública que reproduz o conteúdo da matrícula do imóvel – Ausência de óbice ao registro pretendido – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1001529-97.2019.8.26.0575, da Comarca de São José do Rio Pardo, em que é apelante APARECIDA NEIVA BREDA DORNELAS, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DE SÃO JOSÉ DO RIO PARDO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 10 de dezembro de 2020.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1001529-97.2019.8.26.0575

Apelante: Aparecida Neiva Breda Dornelas

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de São José do Rio Pardo

VOTO Nº 31.434

Registro de Imóveis – Escritura pública de venda e compra – Exigência de cadastro autônomo junto ao INCRA – Imóvel menor que a área mínima exigida para exploração rural – Matrícula já aberta em conformidade com as transcrições anteriores – Alienação de partes ideais pelos demais condôminos à adquirente, que se tornou titular de domínio da integralidade do imóvel – Escritura pública que reproduz o conteúdo da matrícula do imóvel – Ausência de óbice ao registro pretendido – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

1. Trata-se de apelação interposta por Aparecida Neiva Breda Dornelas contra a sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de São José do Rio Pardo/SP, que manteve os óbices apresentados para registro da escritura de compra e venda tendo por objeto parte ideal do imóvel rural matriculado sob nº 7.760 junto àquela serventia imobiliária (fl. 66/76).

Afirma a apelante, em síntese, que o fato de ser a área negociada inferior ao módulo rural é irrelevante, pois desnecessária a abertura de matrícula. Isso porque o imóvel objeto da escritura de compra e venda por intermédio da qual adquiriu as partes ideais cabentes aos demais condôminos do imóvel, tornando-se proprietária da integralidade da área, já está matriculado sob nº 7.760 perante o Registro de Imóveis da Comarca de São José do Rio Pardo/SP. Aduz que também não há necessidade de novo cadastro junto ao INCRA, pois o imóvel em questão está cadastrado no referido órgão conjuntamente com o imóvel objeto da matrícula nº 7.759, cujos titulares de domínio são os mesmos. Esclarece que não há que se falar em desmembramento de imóvel rural, pois referidos imóveis são separados por um córrego. Por fim, sustenta que não há óbice à alienação de partes ideais do imóvel por alguns dos condôminos a outro.

O Oficial de Registro de Imóveis manifestou-se a fl. 117/118.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 138/140).

É o relatório.

2. A apelante, por meio de escritura pública de venda e compra lavrada em 15 de janeiro 2018 (fl. 08/17), adquiriu dos demais condôminos as frações ideais correspondentes a 85,9325% do imóvel objeto da matrícula nº 7.760 do Registro de Imóveis da Comarca de São José do Rio Pardo/SP (fl. 88/98), tornando-se sua única proprietária.

A certidão imobiliária a fl. 88/98 confirma que o imóvel objeto da matrícula nº 7.760 tem área total de 1,0788 hectares (AV.19), tendo sido cadastrado perante o INCRA, em área maior, juntamente com o imóvel objeto da matrícula nº 7.759. Ainda, segundo essas inscrições, a fração mínima do parcelamento na região é de 2 hectares (AV. 11 e AV. 18).

Como é sabido, o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) é documento emitido pelo INCRA, cuja apresentação deve ser promovida nas hipóteses de desmembramento, arrendamento, hipoteca, venda ou promessa de venda de imóveis rurais. Essa exigência consta do § 1º do art. 22 da Lei nº 4.947/1966 e também do art. 1º do Decreto nº 4.449/2002, que regulamentou a Lei nº 10.267/2001, diploma legal que, entre outras, promoveu alterações no art. 176 da Lei nº 6.015/1973 para fazer constar a necessidade da identificação do imóvel rural com o código e os dados constantes do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR).

A obrigação da identificação do imóvel rural com os dados constantes no Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) foi repetida pelo inciso II do Item 59 (atual item 57) do Capítulo XX das Normas de Serviço:

” 59 – A identificação e caracterização do imóvel compreendem:

(…)

II – se rural, o código do imóvel e os dados constantes do CCIR, a localização e denominação;”

No caso concreto, a registradora exigiu o cadastro individualizado do imóvel junto ao INCRA, por entender que o registro da compra e venda de uma área individualizada da gleba rural constituirá desmembramento de imóvel rural com área inferior à fração mínima de parcelamento (fl. 01/06).

Contudo, não se trata de compra e venda de área individualizada, mas sim, de frações ideais alienadas pelos demais condôminos em favor da coproprietária.

Não se desconhece, por outro lado, a existência de precedentes deste Conselho Superior da Magistratura que confirma a necessidade, para a prática do ato de registro, do cadastro autônomo do imóvel junto ao INCRA, ainda que existente cadastro anterior em conjunto com outro imóvel. Essa exigência, no entanto, apenas se justificaria se houvesse desmembramento da área e abertura de matrícula, que por exigência legal está condicionada a certos requisitos, dentre os quais, para os imóveis rurais, a apresentação do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR).

Na hipótese em análise, diferentemente, o fato de ser o imóvel menor que a área mínima exigida pelo INCRA para exploração rural é insuficiente para impedir o registro, eis que já existe matrícula aberta desde 1982, em exata conformidade com anteriores transcrições datadas de 1965 (fl. 50/53). Destarte, a alienação de partes ideais pelos condôminos à apelante, que se tornou titular de domínio da integralidade do imóvel, nada tem de irregular, tal como dispunha o item 60.2 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça então vigentes (atual item 58.2):

” 60.2 – Não será considerada irregular a abertura de matrícula que segue os dados existentes no registro anterior (matrícula por transporte), bem como o registro do título subsequente, quando houver coincidência entre os dados.”

Nem mesmo o fato de haver alteração dos titulares de domínio poderia justificar a exigência formulada pela registradora, na medida em que nada há nos autos a indicar que a adquirente não seja mais coproprietária do outro imóvel referido no Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) já expedido.

Acrescente-se que, nos termos do art. 176, § 1º, inciso II, da Lei 6.015/73, são requisitos para a identificação do imóvel rural a existência de seu código, dos dados constantes do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR), da denominação e de suas características, confrontações, localização e área. Todos estes elementos estão presentes na escritura levada a registro, que reproduz o teor da matrícula do imóvel, aberta em consideração aos elementos das transcrições anteriores, como previsto na Lei de Registros Públicos (arts. 196 e 228) e nas Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça vigentes à época (Capítulo XX, item 56, atual item 54).

3. Diante do exposto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 16.03.2021-SP)