2ª VRP|SP: Pedido de Providências – União Estável – Escolha do regime de bens – Comunhão Universal – Posterior alegação de que tal regime não poderia ser escolhido – Bens pendentes de partilha que não fora informado a tabeliã por ocasião da lavratura da escritura – Escritura hígida e perfeita – Eventual pedido nulidade ou retificação deve ser adotado em procedimento judicial – Pedido arquivado.

Processo 0043665-62.2020.8.26.0100

Pedido de Providências

Registros Públicos

C.G.J.

M.S.S. e outro

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Marcelo Benacchio

Vistos,

Cuida-se de representação encaminhada pela E. Corregedoria Geral da Justiça, do interesse da Senhora M. S. S., que requer a nulidade do regime de bens da comunhão total, declarado pelos conviventes quando da lavratura da Escritura Pública Constitutiva de União Estável, pela serventia afeta ao XXº Tabelionato de Notas da Capital, uma vez que, à data da confecção do instrumento notarial, o convivente varão não havia realizado a partilha do patrimônio relativo ao casamento anterior.

A Senhora Tabeliã prestou esclarecimentos às fls. 24/25.

A Senhora Representante manifestou-se, reiterando os termos de seu protesto inicial (fls. 30/32).

O Ministério Público ofertou parecer conclusivo às fls. 44/46, opinando pelo indeferimento do pedido de nulidade do regime patrimonial, ante a não verificação de falha atribuível à serventia extrajudicial.

É o breve relatório. Decido.

Trata-se de representação encaminhada pela Senhora M. S. S., insurgindo-se contra falha na lavratura de Escritura Pública Declaratória de União Estável, pela serventia afeta ao XXº Tabelionato de Notas da Capital, da qual se fez constar como regime de bens a comunhão total, não obstante o convivente varão não houvesse realizado a partilha do patrimônio relativo ao casamento anterior.

Pugna, ademais, a representante, pela nulidade do regime de bens escolhido, narrando que os prepostos responsáveis pelo ato não esclareceram devidamente os conviventes, quanto às especificidades e consequências do acordo patrimonial.

A seu turno, a Senhora Tabeliã veio aos autos para esclarecer que, quando da lavratura da Escritura Pública de Constituição de União Estável, entre P. A. e E. A., foram apresentados todos os documentos necessários a sua confecção. No mais, não fora noticiada a existência de bens relativos ao casamento anterior do convivente, sendo certo que da certidão das núpcias apresentada à unidade, não se verifica a pendência de partilha entre os ex-cônjuges. Desse modo, aponta que o ato notarial foi inscrito de boa-fé pelos prepostos, que não tinham ciência dos fatos ora informados. No mesmo propósito, noticia a ilustre Notária que desde que assumiu a unidade, em 2017, posteriormente à confecção do ato debatido, instrui seus colaboradores a esclarecerem de forma minuciosa as questões patrimoniais relativas aos regimes de bens.

Instada a se manifestar, a Senhora Representante reiterou os termos de sua insurgência inicial, afirmando que houve falha quando da lavratura da Escritura Pública, em razão da escolha do regime de bens.

Pois bem. A Escritura Pública foi lavrada mediante a apresentação da documentação pertinente para a feitura do ato notarial, atendendo-se à vontade das partes.

Assim, não haveria como o responsável pela inscrição do instrumento público ter conhecimento de fatos externos àqueles noticiados pelos signatários, de modo que a eventual falta de informação acerca da existência de bens não partilhados do relacionamento anterior do convivente, possivelmente a inviabilizar a escolha livre do acordo patrimonial, não pode ser debitada à falha da unidade.

Destaco que, na União Estável o regime patrimonial é de livre escolha pelos consortes, nos termos do artigo 1.725 do Código Civil.

Nessa ordem de ideias, respeitado o elevado entendimento da Senhora Representante, reputo satisfatórios os esclarecimentos prestados pela Senhora Titular, sendo forçoso convir que não há indícios de que a serventia correicionada tenha atuado em desacordo com as normas legais ou concorrido de forma maliciosa em prejuízo aos conviventes.

Bem por isso, não vislumbro responsabilidade funcional apta a ensejar a instauração de procedimento administrativo, no âmbito disciplinar, em face da unidade correicionada, inclusive porque a Senhora Tabeliã assumiu a serventia em momento muito posterior ao fato ora analisado.

Noutro turno, considerando-se a extensão do pedido, no que tange à eventual declaração de nulidade do regime de bens, certo é que tal requerimento reclama a observância de procedimento judicial, não podendo ser realizada nesta estreita via administrativa.

Nesses termos, vale dizer que a pretensão, seja da declaração da nulidade ou eventual retificação do acordo patrimonial, não comporta acolhimento na via processual eleita, impondo-se a adoção de procedimento judicial para a finalidade almejada, razão pela qual indefiro o requerimento.

Não obstante, faço a observação, à Senhora Titular, para que se mantenha atenta e zelosa na orientação e fiscalização dos prepostos sob sua responsabilidade pessoal, que devem ser cuidadosamente instruídos, certificando-se a Notária de que os colaboradores detêm conhecimentos jurídicos plenos relacionados aos atos que são autorizados a praticar, ressalvando-se, no mais, o dever de se consultarem com a própria Delegatária ou Substituto autorizado, em caso de dúvidas e afins.

Destarte, à míngua de outra providência administrativa a ser adotada, determino o arquivamento dos autos.

Ciência à Senhora Tabeliã e ao Ministério Público. Encaminhe-se cópia desta decisão, bem como de fls. 24/46, à E. Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente como ofício.

P.I.C.

São Paulo, 04 de dezembro de 2020.

(DJe de 11.12.2020 – SP)