CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Escritura de compra e venda outorgada pela nu-proprietária e pelos usufrutuários do imóvel – Usufrutuários que tiveram seus bens declarados indisponíveis – Pretensão de registro somente da compra da nua-propriedade, mediante cisão do título que se mostra possível neste caso concreto – Recurso provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1031560-50.2018.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante EDMUNDO OCTÁVIO RASPANTI, é apelada 2º OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS DA COMARCA DE RIBEIRÃO PRETO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 10 de dezembro de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1031560-50.2018.8.26.0506

Apelante: Edmundo Octávio Raspanti

Apelado: 2º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto

VOTO Nº 37.977

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Escritura de compra e venda outorgada pela nu-proprietária e pelos usufrutuários do imóvel – Usufrutuários que tiveram seus bens declarados indisponíveis – Pretensão de registro somente da compra da nua-propriedade, mediante cisão do título que se mostra possível neste caso concreto – Recurso provido.

Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que julgou procedente a dúvida inversa e manteve a recusa do registro de escritura pública de compra e venda do imóvel objeto da matrícula nº 119.106 do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Ribeirão Preto, a ser feita somente em relação aos direitos transmitidos pela nua-propriedade, em razão das ordens de indisponibilidade que recaem sobre os bens dos usufrutuários e da impossibilidade de cisão do negócio jurídico que envolveu a propriedade plena do bem.

O apelante alegou, em suma, que adquiriu o imóvel de Cibele Alves Siqueira por escritura pública lavrada em 31 de julho de 2017. Afirmou que Cibele era titular da nua-propriedade do imóvel que tem como usufrutuários José Lourenço de Oliveira e Angélica Guimarães de Oliveira cujos bens foram tornados indisponíveis. Contudo, na data em que a escritura pública de compra foi outorgada a ordem de indisponibilidade oriunda da Ação Cautelar Fiscal nº 0010988-39.2010.403.6102, da 9ª Vara Federal de Ribeirão Preto, não constava na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens, o que permitiu a celebração do negócio jurídico. Asseverou que o cadastro de indisponibilidade teve início em 1º de junho de 2012 e que foram adotadas todas as providências cabíveis para a compra do imóvel. Aduziu que a omissão relativa à ordem de indisponibilidade na Central Nacional violou o princípio da publicidade e que agiu de boa-fé ao adquirir o imóvel. Ademais, apresentou a escritura de compra e venda para o registro da compra da nua-propriedade que não foi atingida pela indisponibilidade incidente sobre os bens dos usufrutuários. Disse que a nua-propriedade é desvinculada do usufruto e não há vedação para que seja alienada. Requereu a reforma da r. sentença para que seja promovido o registro da aquisição da nua-propriedade (fls. 100/105).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 125/127).

É o relatório.

Por escritura pública lavrada em 31 de julho de 2017, às fls. 336/338 do Livro nº 954 do 2º Tabelião de Notas da Comarca de Ribeirão Preto, o apelante comprou o imóvel consistente no apartamento 24 do Residencial Verona, que tem como nu-proprietária Cibele Alves Siqueira e como usufrutuários Francisco Alves Siqueira e Maria Darcy Teixeira Alves Siqueira (fls. 06).

O registro da compra e venda foi recusado em razão de quatro ordens de indisponibilidade que recaem sobre os bens dos promitentes vendedores.

A certidão de fls. 16/20 demonstra que as averbações das ordens de indisponibilidade contidas na matrícula nº 119.106 foram promovidas em 07 de dezembro de 2017 (Av. 9 e Av. 10), 13 de abril de 2018 (Av.11) e 03 de maio de 2018 (Av. 12), datas que são anteriores ao protocolo da escritura de compra e venda promovido em 13 de dezembro de 2017 (fls. 15).

Contudo, neste caso concreto o apelante pretende a cisão do título para que seja registrada a aquisição da nua-propriedade do imóvel, o que afasta a análise das questões relativas ao funcionamento da Central Nacional de Indisponibilidade de Bens e aos efeitos disso decorrentes.

Por sua vez, embora a escritura pública de compra e venda diga respeito à propriedade plena do imóvel, não havia vedação para a aquisição somente da nua-propriedade, pois assim não decorre da restrição prevista no art. 1.393 do Código Civil:

Art. 1.393. Não se pode transferir o usufruto por alienação; mas o seu exercício pode ceder-se por título gratuito ou oneroso“.

Desse modo, a escritura pública de compra e venda abrangeu dois negócios jurídicos realizados com pessoas distintas, um consistente na aquisição da nua-propriedade feita de Cibele Alves Siqueira, e outro relativo ao usufruto de que, ainda in casu, não se pretende a averbação da extinção.

Por essa razão afigura-se possível o registro da compra e venda da nua-propriedade, em conformidade com a solicitação formulada pelo adquirente.

Solução diversa, por fim, implicaria em descabida expansão dos efeitos das indisponibilidades que somente recaem sobre os direitos dos usufrutuários que, por seu lado, continuarão preservados.

Ante o exposto, pelo meu voto dou provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator.

(DJe de 31.03.2020-SP)