1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Certidão de Escritura de Venda e Compra lavrada em 1985 – Exigência para apresentação da guia de recolhimento – Notário certificou o recolhimento – Fé pública – Ademais, novo recolhimento caracterizaria bis in idem e enriquecimento ilícito – Dúvida improcedente.

 

Processo 1119818-56.2019.8.26.0100 

Dúvida

Registros Públicos

13º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo

M. G. L. de S.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de M. G. L. de S., tendo em vista a negativa em se proceder ao registro da escritura de venda e compra lavrada perante o 2º Tabelião de Notas da Capital, referente ao imóvel matriculado sob nº 29.195.

O óbice registrário refere-se à ausência de apresentação do comprovante de recolhimento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis – ITBI, vez que apenas há menção do pagamento no corpo da escritura, ocorrido em 1985, todavia, não há qualquer demonstrativo.

Salienta que cumpre aos registradores fazer rigorosa fiscalização do recolhimento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício, sob pena de se sujeitarem as infrações disciplinares previstas em lei. Juntou documentos às fls.10/30.

A suscitada apresentou impugnação às fls.31/32. Ressalta que incumbe ao Cartório de Registro de Imóveis verificar se houve o recolhimento do imposto e não se este foi recolhido de forma correta, competindo à administração pública o exercício de fiscalização. Por fim, assevera que a exigência de novo pagamento de tributo referente ao mesmo ato e imóvel caracteriza bis in idem e consequentemente enriquecimento sem causa.

O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls. 40/43).

É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

Em que pesem o zelo e cautela do Registrador acerca da verificação do recolhimento dos impostos, entendo que na presente hipótese o óbice registrário deverá ser superado. Ressalto primeiramente que a jurisprudência a que se refere o Oficial não se aplica à presente questão, tendo em vista que não há qualquer menção de que houve o recolhimento antecipado do ITBI por ocasião da lavratura da escritura pública.

A incidência do imposto de Transmissão dos Bens Imóveis (ITBI) se dá na transmissão do domínio, ou seja, no efetivo registro do título, pois somente ele tem o condão de transferir a propriedade, muito embora seja possível o pagamento deste tributo quando da celebração do negócio jurídico obrigacional, o que se configura a hipótese dos autos, vez que mencionado imposto foi recolhido por ocasião da lavratura da escritura de venda e compra (fls.17/20).

Neste contexto, apesar de não haver a apresentação da comprovação do imposto, consta do corpo do título apresentado a registro a certidão pelo notário, que detém fé pública, do seu efetivo recolhimento (fl.18). Daí resta claro que a exigência de novo pagamento do mesmo tributo, referente ao mesmo imóvel e mesma pessoa, caracterizaria verdadeiro bis in idem e consequente enriquecimento ilícito, o que é expressamente vedado pelo ordenamento jurídico.

Neste sentido, cito decisão proferida pelo Conselho Superior da Magistratura envolvendo questão semelhante:

“Registro de Imóveis – Dúvida – Carta de Adjudicação – Exigência de recolhimento do ITBI – Hipótese de efetiva transferência da propriedade – Não obstante, o recolhimento foi realizado antecipadamente, na ocasião do registro da carta de arrematação dos direitos sobre o imóvel – hipótese na qual o alienante permaneceu como dono – inocorrência do fato gerador do tributo – inexigível duplo reconhecimento – precedente do Conselho Superior da Magistratura, amparados em julgados do STJ e STF – Recurso Provido” (Apelação Cível nº 0009528-83.2014.8.26.0223, Rel. Des. Xavier de Aquino, j. Em 15/12/2015).

Do corpo do mencionado Acórdão extrai-se:

“…É preciso considerar que há precedentes do E. Conselho Superior da Magistratura, baseados em julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a despeito das legislações municipais que determinam o recolhimento do ITBI nos casos de compromisso de compra e venda e outros contratos de natureza pessoal, pelos quais se transmitem apenas os direitos relativos ao bem imóvel, de acordo com a Constituição Federal e o Código Civil, o ITBI tem incidência e é devido apenas quando a escritura pública de compra e venda. Apesar de incidência do ITBI na legislação municipal, a inconstitucionalidade desta norma é manifesta, e, como tal, excepcionalmente, pode ser reconhecida na esfera administrativa O Colendo Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento no sentido de que o ITBI deve incidir apenas sobre as transações registradas em cartório, que impliquem a efetiva transmissão da propriedade imobiliária (Resp 1.066, 253.364, 264.064, 57.641)”.

Por fim, tendo em vista que a determinação dada pelo artigo 289 da Lei 6.015/73 deve ser interpretada no sentido de que lhe incumbe apenas confirmar se foi recolhido o tributo, relativo à operação a ser registrada, sem ater-se à exatidão do valor ou à incidência de juros ou multa, tarefa esta de interesse das fazendas públicas, no caso em exame, da Fazenda Municipal, o recolhimento do ITBI antes da transferência do domínio deve ser considerado como recolhimento antecipado, suficiente para entender que houve a efetiva fiscalização do registrador.

Diante do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de M. G. L. de S., e consequentemente determino o registro do título.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

(DJe de 16.01.2020 – SP)