1ª VRP|SP: Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Negócio jurídico de Alienação Fiduciária pactuado quando uma das partes era solteiro – Exigência de carta de sentença oriunda do divórcio – Alegação de comunicação do bem em razão do pagamento das parcelas durante o matrimônio – Obrigação contraída quando solteiro não se comunica – Ausência de elementos que demostrem o esforço comum – Pedido de Providências procedente.

Processo 1079435-36.2019.8.26.0100

Pedido de Providências

Registro de Imóveis

R. S. L.

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado por R. S. L. em face do Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, pleiteando a averbação de seu casamento e posterior divórcio junto à matrícula nº 184.696, bem como cancelamento da alienação fiduciária registrada.

O ato registrário foi negado sob o fundamento de que houve a comunicabilidade do imóvel em razão do casamento do requerente com F. F. L., razão pela qual haveria a necessidade da apresentação da carta de sentença devidamente formalizada ou escritura de partilha dos bens do casal.

Insurge-se o requerente do óbice imposto, sob o argumento de que referido imóvel foi adquirido no estado civil de solteiro, aos 18.03.2010 (fls. 12/13).

Pelo mesmo instrumento público, o bem foi dado em alienação fiduciária ao Banco Bradesco S/A para garantia do financiamento no valor de R$ 345.000,00, pagável em 360 prestações mensais e sucessivas no importe de R$ 3.698,52 (fl. 13).

Informa que, após a aquisição do imóvel, em 04.05.2013, contraiu matrimônio com Fabiana, sob o regime da comunhão parcial de bens, e em 13.12.2018 separou-se extrajudicialmente e deixaram de partilhar o referido bem.

Afirma que tendo a alienação fiduciária sido constituída antes do matrimônio, não houve comunicabilidade. Juntou documentos às fls.10/32.

O Oficial manifestou-se às fls.36/38, corroborando os argumentos da exigência acima mencionados, aduzindo ainda que o pagamento de parcelas do financiamento durante a relação conjugal levariam à comunicabilidade dos direitos sobre o bem.

O Ministério Público opinou pela procedência do pedido (fls.41/44).

É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

Em que pese a cautela do Registrador, o presente pedido de providências deve ser julgado procedente.

A alienação fiduciária de bem imóvel em garantia, nos termos do art. 22 da Lei nº 9.514/97, é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Ao devedor é conferida a posse direta sobre a coisa. Daí que uma vez extinta a condição resolutiva, há o retorno dos envolvidos ao “status quo ante”, de maneira retroativa.

Na presente hipótese, não há como afirmar que o fato de terem sido pagas parcelas do financiamento na constância do casamento resulte na comunicação do imóvel ao cônjuge, uma vez que a escritura de compra e venda, bem como a constituição do gravame, deu-se em nome de Rodrigo na qualidade de solteiro.

Ademais, não há qualquer prova de ter havido esforço comum para a quitação do imóvel, sendo certo que tal comprovação somente é cabível nas vias ordinárias com a presença do contraditório e ampla defesa.

Ressalto ainda que a obrigação em relação ao pagamento deu-se exclusivamente em nome do cônjuge varão, consequentemente não há a possibilidade da comunicação das obrigações adquiridas antes do casamento, nos termos do artigo 1659, I e II do CC.

Por tais razões, para fins de manter a continuidade do registro, deve o Oficial averbar o casamento e divórcio do requerente, sem necessidade de partilha do bem, visto que não houve comunicação, bem como averbar o cancelamento da alienação fiduciária nos termos do título apresentado que noticia a quitação.

Apenas pontuo, por fim, não haver qualquer ilícito cometido pelo Oficial, visto que não infringiu qualquer norma, tendo a nota devolutiva apresentada fundamentação legal pertinente, ainda que ora afastada, e estando a exigência dentro dos poderes de qualificação atribuídos ao delegatário.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências formulado por R. S. L., em face do Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, e consequentemente determino a averbação do casamento e do divórcio do interessado, assim como o cancelamento da alienação fiduciária na matrícula nº 184.696.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

(DJe de 02.10.2019 – SP)