CSM|SP: Registro de Imóveis – Alienação fiduciária em garantia – Constituição de hipoteca – Propriedade resolúvel que nasce com o registro do contrato junto à serventia imobiliária – Devedor que não possui todos os poderes inerentes à propriedade – Necessidade de prévio cancelamento da garantia – Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1002435-39.2018.8.26.0279, da Comarca de Itararé, em que é apelante CASTROLANDA – COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL LTDA., é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ITARARÉ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 23 de agosto de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1002435-39.2018.8.26.0279

Apelante: Castrolanda – Cooperativa Agroindustrial Ltda.

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Itararé

VOTO Nº 37.868

Registro de Imóveis – Alienação fiduciária em garantia – Constituição de hipoteca – Propriedade resolúvel que nasce com o registro do contrato junto à serventia imobiliária – Devedor que não possui todos os poderes inerentes à propriedade – Necessidade de prévio cancelamento da garantia – Recurso desprovido.

Trata-se de apelação cível interposta por CASTROLANDA – COOPERATIVA AGROINDUSTRIAL LTDA. contra r. sentença de fl. 162/164, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registros de Imóveis e Anexos da Comarca de Itararé, a respeito do registro da escritura pública de confissão de dívida com garantias hipotecárias em que figura como devedor Cyro Rezende Maschietto, e, como credora, a ora apelante.

Afirma a apelante que o prazo da dívida garantida venceu em 15/08/2017, de forma que não há mais garantia vigente, estando o credor fiduciário inerte em não apresentar qualquer documento informando a prorrogação do prazo, ocorrência de novação e tampouco deu início ao procedimento administrativo de consolidação da propriedade plena.

Verbera que não seria correto beneficiar o credor inerte, prejudicando direitos de terceiros, deixando o bem bloqueado indefinidamente.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 187/192).

É o relatório.

Presentes pressupostos processuais e administrativos, no mérito, o recurso não comporta conhecimento.

A apelante prenotou escritura pública de confissão de dívida com garantias hipotecárias, na qual figura como devedor Cyro Rezende Maschietto, e como credora a apelante, constituindo ônus real sobre os imóveis rurais das matrículas n° 19.362, 19.363 e 19.364, todos daquela serventia imobiliária (fl. 16/49).

A apelante se insurge somente em relação à negativa do registro da hipoteca junto à matrícula n° 19.362 (fls. 91/101) – não havendo se falar em impugnação parcial por se tratar de três registros distintos- e, conforme R.03 (fl. 101), o imóvel foi alienado fiduciariamente em favor de FCC Madeiras Ltda., conforme instrumento particular de confissão de dívida com garantia de alienação fiduciária, firmado em 28/04/2017 e aditado em 17/05/2017, com vencimento para o dia 15/08/2017.

Diz o art. 23 da Lei n° 9.514/1997:

Art. 23 – Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título.

Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel.

Firmado o contrato principal cuja garantia tenha sido dada por alienação fiduciária (contrato acessório), cria-se a propriedade fiduciária, de natureza resolúvel, com a transferência do patrimônio do devedor ao credor, o que se dá com o registro do título (contrato principal e acessório de garantia) junto à serventia imobiliária.

Configurada essa relação jurídica com o registro, o devedor fiduciante passa a ter alguns dos poderes inerentes à propriedade, como o de usar e o de fruir do bem, mas não possui os poderes plenos (dispor e gravar com ônus reais).

E tal situação deverá perdurar, ao menos do ponto de vista registral imobiliário, até que haja a consolidação da propriedade plena, seja em favor do devedor, com a respectiva quitação e implemento da cláusula resolutiva, seja em favor do credor, uma vez configurada a mora absoluta.

Por essas razões, respeitosamente, ao contrário do que alega a apelante, não é possível presumir a quitação e consolidação da propriedade plena apenas com base no vencimento da dívida prevista em contrato.

Ainda que, do ponto de vista obrigacional, tenha ocorrido a quitação, do ponto de vista registral não há qualquer presunção que não seja aquela gerada erga omnes pelo registro da garantia.

Qualquer ato que pudesse operar o desfazimento da propriedade resolúvel registrada precisaria se enquadrar em algumas das hipóteses de cancelamento de registro, que são aquelas previstas no art. 250 da Lei 6.015/73:

Art. 250 – Far-se-á o cancelamento:

I – em cumprimento de decisão judicial transitada em julgado;

II – a requerimento unânime das partes que tenham participado do ato registrado, se capazes, com as firmas reconhecidas por tabelião;

III- a requerimento do interessado, instruído com documento hábil.

O documento hábil seria a apresentação de instrumento particular de quitação, vistado pelo credor, o que possibilitaria o cancelamento da garantia fiduciária e, consequentemente, novas inscrições constitutivas de ônus reais.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

(DJe de 19.09.2019 – SP)