CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de compra e venda – Procuração outorgada por instrumento particular – Impossibilidade – Mandato que deve ser outorgado pela forma exigida em lei para a prática do ato – Hipótese de exceção não configurada – Recurso não provido.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1011119-24.2017.8.26.0590, da Comarca de São Vicente, em que é apelante SERGIO BRAGA, é apelado OFICIAL DO REGISTRO DE IMOVEIS E ANEXOS DA COMARRCA DE SÃO VICENTE.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 13 de junho de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n. 1011119-24.2017.8.26.0590

Apelante: Sergio Braga

Apelado: Oficial do Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de São Vicente

VOTO N. 37.778

Registro de Imóveis – Escritura pública de compra e venda – Procuração outorgada por instrumento particular – Impossibilidade – Mandato que deve ser outorgado pela forma exigida em lei para a prática do ato – Hipótese de exceção não configurada – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Sérgio Braga contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Vicente/SP, que julgou procedente a dúvida inversa suscitada e manteve um dos óbices impostos pelo registrador [1].

Alega o apelante, em síntese, que a lei autoriza expressamente o mandato por instrumento particular para a celebração de negócios jurídicos, inclusive para fins de transferência de propriedade, no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação. Assim, sustenta ser cabível a procuração particular para lavratura da escritura levada a registro, na forma prevista no art. 22, § 2º, inciso II, da Lei 10.150/00 [2].

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento da apelação [3].

É o relatório.

O dissenso versa sobre a possibilidade de registro da Escritura Pública de Compra e Venda, lavrada em 3 de junho de 2015, tendo por objeto o imóvel objeto da transcrição n. 45.724 do Registro de Imóveis da Comarca de São Vicente/SP.

O Oficial do Registro de Imóveis da Comarca de São Vicente desqualificou o título e formulou exigências, entendendo o MM. Juiz Corregedor Permanente pela regularidade da recusa eis que a procuração outorgada pelos vendedores não foi formalizada por meio de instrumento público, mas particular, o que é defeso para a prática de atos relativos a imóveis.

É certo que o art. 657 do Código Civil prevê que o mandato seja outorgado pela forma exigida em lei para a prática do ato [4]. Nesse sentido, o item 130 do Capítulo XIV do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, estabelece que “A procuração outorgada para a prática de atos em que exigível o instrumento público também deve revestir a forma pública”.

Referidas regras legal e administrativa tem por finalidade impedir que a manifestação de vontade seja formalizada por um instrumento menos solene que o exigido para a transferência dominial do imóvel, conforme disposto no art. 108 do Código Civil [5].

Nesse cenário, a representação dos vendedores, advinda da cláusula mandato constante do instrumento particular de compromisso de compra e venda, é mesmo inadequada para fins de lavratura de escritura pública visando a transferência de domínio de imóvel.

Não se ignora que, em certos casos, é possível prescindir da escritura pública para a validade do negócio jurídico, como ocorre, por exemplo, no compromisso de compra e venda de imóveis loteados; na venda e compra de imóvel de qualquer valor com financiamento mediante a contratação da alienação fiduciária em garantia; no mútuo com alienação fiduciária em garantia imobiliária, nos termos do SFI (Lei n. 9.514/1997, arts. 38 e parágrafo único do art. 22, com redação dada pela Lei n. 11.076/2004); na compra e venda de imóvel de qualquer valor com financiamento do SFH (art. 1º da Lei n. 5.049/1966, que alterou o art. 61 da Lei n. 4.380/1964) e, ainda, em qualquer negócio jurídico envolvendo imóvel de valor igual ou inferior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Contudo, no caso concreto, nenhuma dessas exceções se faz presente, eis que a escritura de compra e venda qualificada negativamente diz respeito a contrato de compra e venda de imóvel celebrado entre particulares, sendo o valor do bem superior a trinta vezes o maior salário mínimo do país [6], à época da lavratura do ato.

Por conseguinte, há que ser mantido o óbice ao registro.

Nesses termos, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Notas:

[1] Fls. 74/76.

[2] Fls. 101/107.

[3] Fls. 124/128.

[4] Art. 657. A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se admite mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito.

[5] Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

[6] Fls. 16.

(DJe de 07.08.2019 – SP)