CSM|SP: Registro de imóveis – Falência da vendedora em data posterior ao contrato de compra e venda – Prenotação do título em data posterior à quebra – Necessidade de autorização do juízo da falência – Impossibilidade do reconhecimento de decadência ou aquisição por usucapião neste processo administrativo sob pena de violação do direito fundamental ao devido processo legal em razão do direito de terceiros – recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1002238-39.2018.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ROBERTO MELLO DE CARVALHO ROCHA, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 26 de fevereiro de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1002238-39.2018.8.26.0100

Apelante: Roberto Mello de Carvalho Rocha

Apelado: 2º Oficial de Registro de imóveis da Comarca de São Paulo

VOTO Nº 37.675

Registro de imóveis – Falência da vendedora em data posterior ao contrato de compra e venda – Prenotação do título em data posterior à quebra – Necessidade de autorização do juízo da falência – Impossibilidade do reconhecimento de decadência ou aquisição por usucapião neste processo administrativo sob pena de violação do direito fundamental ao devido processo legal em razão do direito de terceiros – recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Roberto Mello de Carvalho Rocha contra a r. sentença de fls. 58/61, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. 2º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de São Paulo mantendo a recusa do ingresso de escritura pública de compra e venda em razão da ausência de autorização do Juízo Falimentar para a transmissão imobiliária e ser descabido o reconhecimento de decadência ou usucapião no presente processo administrativo.

Sustenta o apelante a desnecessidade da autorização judicial pelo fato da escritura pública de compra e venda ter sido lavrada em data anterior à decretação da falência, a ocorrência da decadência de direitos sobre o imóvel e ainda a configuração da usucapião (fls. 68/81).

A D. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 98/100).

É o relatório.

A aquisição da propriedade imóvel por meio registro do título no ordenamento jurídico pátrio, ante a opção legislativa pelo sistema do título e do modo, ocorre com o registro do título translativo no registro de imóveis nos termos do artigo 1.245 do Código Civil.

Os efeitos do contrato são pessoais, assim, atualmente, a propriedade do imóvel objeto deste procedimento de dúvida é da vendedora a empresa falida.

Houve a decretação da falência da vendedora em 07.05.1997, portanto, em data posterior à celebração do contrato de compra e venda (23.8.1995).

Em virtude da quebra ter ocorrido em momento anterior à vigência da Lei 11.101/05, deve ser aplicado o regime jurídico do Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945.

E a disciplina legal em questão, semelhante a atual, determina a arrecadação de todos os bens da falida e a ineficácia do registro de direitos reais, exceto se a prenotação ocorreu antes da quebra.

Nessa linha, os artigos 39, caput, e 52, inciso VII, do Decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945, estabelecem:

Art. 39. A falência compreende todos os bens do devedor inclusive direitos e ações, tanto os existentes na época de sua declaração como os que forem adquiridos no curso do processo.

Art. 52. Não produzem efeitos relativamente à massa, tenha ou não o contratante conhecimento do estado econômico do devedor, seja ou não intenção dêste fraudar credores:

(…)

VII – as inscrições de direitos reais, as transcrições de transferência de propriedade entre vivos, por título oneroso ou gratuito, ou a averbação relativa a imóveis, realizadas após a decretação do sequestro ou a declaração da falência, a menos que tenha havido prenotação anterior; a falta de inscrição do ônus real dá ao credor o direito de concorrer à massa como quirografário, e a falta da transcrição dá ao adquirente ação para haver o preço até onde bastar o que se apurar na venda do imóvel;

Ante a especificidade do regime legal incidente no sentido de permitir o exame pelo Juízo da Falência das transmissões patrimoniais imobiliárias ainda que os contratos (título) tenham sido celebrados no período anterior à quebra, compete, como mencionado pela MM Juíza Corregedora Permanente, autorização judicial para o registro.

Nessa linha, sendo a prenotação efetuada após a quebra, não é possível a realização do registro sem a anuência do Juízo da Falência ante a restrição legal à transmissão de bens.

Há precedente deste Conselho Superior da Magistratura nesse sentido:

Registro de Imóveis – Escritura de venda e compra – Alienante falida – Exigência de alvará do juízo da falência – Certidão Negativa de Débitos (CND) e Certidão de Quitação de Tributos e Contribuições Federais (CQDTCF) – Ordem de Serviço número 207/99 do INSS – Atividade concorrente e não exclusiva – Impossibilidade da dispensa – Dúvida procedente – Recurso não provido. (apelação cível n. 096028-0/5, j. 27.11.2002, Rel. Des. Luiz Tâmbara).

Na via administrativa do registro imobiliário não é possível o reconhecimento de decadência ou aquisição do imóvel por usucapião na hipótese em julgamento, por implicar em modificações em direitos de terceiros que não são partes deste processo administrativo.

Qualquer interpretação e aplicação do direito não pode violar o direito fundamental do devido processo legal.

Por todo o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 28.06.2019 – SP)