CSM|SP: Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Dúvida julgada procedente – Indeferimento do processamento do pedido de usucapião por se tratar de imóvel de propriedade da CDHU – Imóvel objeto de Termo de Adesão e Ocupação Voluntária com opção de Compra celebrado com os genitores do apelante, posteriormente falecidos – Encerramento precoce do procedimento, diante da ausência de notificação da CDHU para oferecimento de manifestação – Recurso provido para anular a r. sentença, declarar prejudicada a dúvida, e determinar a restituição do procedimento de usucapião extrajudicial ao Registro de Imóveis a fim de que prossiga com a notificação da titular do domínio do imóvel e a apresentação de certidões de distribuição cível em nome dos genitores do apelante, para que, posteriormente, seja promovida a nova qualificação do título pelo Oficial Registrador.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1000598-67.2018.8.26.0272, da Comarca de Itapira, em que são apelantes IRINEU MACHADO CARDOSO SOBRINHO e NAZARÉ FERNANDA RIBEIRO CARDOSO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE ITAPIRA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para anular a r. sentença apelada e julgar prejudicada a dúvida, com determinação de retorno do procedimento extrajudicial de usucapião ao Oficial de Registro de Imóveis a fim de que tenha prosseguimento mediante notificação da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU e apresentação das certidões de distribuição cível em nome dos genitores do apelante, visando posterior qualificação do requerimento pelo Oficial de Registro de Imóveis, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 14 de março de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1000598-67.2018.8.26.0272

Apelantes: Irineu Machado Cardoso Sobrinho e Nazaré Fernanda Ribeiro Cardoso

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Itapira

VOTO Nº 37.709

Registro de Imóveis – Usucapião extrajudicial – Dúvida julgada procedente – Indeferimento do processamento do pedido de usucapião por se tratar de imóvel de propriedade da CDHU – Imóvel objeto de Termo de Adesão e Ocupação Voluntária com opção de Compra celebrado com os genitores do apelante, posteriormente falecidos – Encerramento precoce do procedimento, diante da ausência de notificação da CDHU para oferecimento de manifestação – Recurso provido para anular a r. sentença, declarar prejudicada a dúvida, e determinar a restituição do procedimento de usucapião extrajudicial ao Registro de Imóveis a fim de que prossiga com a notificação da titular do domínio do imóvel e a apresentação de certidões de distribuição cível em nome dos genitores do apelante, para que, posteriormente, seja promovida a nova qualificação do título pelo Oficial Registrador.

Trata-se de apelação interposta por Irineu Machado Cardoso Sobrinho e Nazaré Fernanda Ribeiro Cardoso contra r. sentença que manteve a recusa do Sr. Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Itapira em promover o registro de aquisição da propriedade por usucapião porque o imóvel consiste em lote residencial que integra conjunto habitacional implantando e de propriedade da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU que é sociedade de economia mista, sendo bem público que não pode ser usucapido.

Os apelantes alegaram, em suma, que a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU é sociedade de economia mista e, portanto, consiste em pessoa jurídica de direito privado que não está sujeita ao regime jurídico do direito público. Asseveraram que os bens das sociedades de economia mista são particulares e, assim, passíveis de aquisição por usucapião. Ademais, ainda que a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU fosse considerada como tendo personalidade de direito público poderia o imóvel ser objeto de usucapião em razão de sua função social e porque foi desafetado com a finalidade de alienação. Requereram a reforma da r. sentença para que o procedimento de usucapião extrajudicial prossiga mediante intimação dos interessados e posterior registro se não houver impugnação ao pedido (fls. 133/140).

A douta Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 158/162).

É o relatório.

Cuida-se de procedimento de reconhecimento extrajudicial de usucapião do lote 25 da quadra H do Conjunto Habitacional Antonio Assad Alcici, de propriedade da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU, objeto da matrícula nº 30.860, processado perante o Oficial de Registro de Imóveis de Itapira, em que a recusa do prosseguimento do procedimento extrajudicial teve como fundamento a impossíbilidade de aquisição do domínio de bem público por meio da prescrição aquisitiva.

Em que pese a divergência jurisprudencial sobre a natureza dos bens propriedade da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU e a possibilidade de aquisição por usucapião daqueles situados em núcleos destinados à moradia, houve encerramento precoce do procedimento extrajudicial porque não foi promovida a notificação da titular do domínio, para se manifestar, na forma prevista no art. 216-A, § 2º, do Código de Processo Civil, no art. 10 do Provimento nº 65/2017 da Corregedoria Nacional de Justiça e no item 427 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça.

Essa omissão impede que seja verificada a atual natureza do lote objeto do pedido de reconhecimento da usucapião diante da previsão contratual de opção de compra e, mais, de contratação de seguro que, segundo a cláusula 9ª do contrato, poderia cobrir o preço da compra e venda em razão da morte dos beneficiários do termo de adesão (fls. 67).

E o pagamento do preço da compra e venda do lote pode, em tese, afastar a discussão sobre a manutenção de todos os direitos decorrentes da propriedade em favor da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU e, assim, da possibilidade de aquisição do domínio por usucapião.

Cabe observar, nesse ponto, que os v. acórdãos apontados na r. sentença recorrida ressalvam a possibilidade de aquisição por usucapião dos imóveis quando promovido o integral pagamento do preço da compra e venda por particulares, restando à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU somente a obrigação de outorgar o título de transmissão da propriedade.

Em razão disso, o procedimento extrajudicial de usucapião deve ser anulado, com restituição ao Oficial de Registro de Imóveis para que realize a notificação faltante e somente depois, se não houver impugnação, promova nova qualificação que abrangerá a análise da possibilidade, ou não, da aquisição do domínio por usucapião em consonância com a natureza jurídica do imóvel que considerar existir, ou seja, bem público ou particular.

Por outro lado, apesar da alegação da existência de posse em nome próprio foi o imóvel objeto de contrato celebrado pela mãe e pelo pai do apelante (fls. 64 e seguintes) que faleceram, respectivamente, nos anos de 1998 e de 1999 (fls. 79/80), sendo os lançamentos de IPTU ainda realizados em nome do Espólio de Dino Luiz Machado Cardoso (fls. 39/40 e 50).

Por esses motivos, no procedimento de usucapião deverão ser apresentadas as certidões de distribuição cível também em nome dos genitores do apelante, para qualificação pelo Oficial de Registro de Imóveis.

Por fim, a determinação de retorno do procedimento extrajudicial de usucapião ao Oficial de Registro de Imóveis, para prosseguimento e nova qualificação, torna prejudicada a dúvida que foi suscitada.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para anular a r. sentença apelada e julgar prejudicada a dúvida, com determinação de retorno do procedimento extrajudicial de usucapião ao Oficial de Registro de Imóveis a fim de que tenha prosseguimento mediante notificação da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo – CDHU e apresentação das certidões de distribuição cível em nome dos genitores do apelante, visando posterior qualificação do requerimento pelo Oficial de Registro de Imóveis.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 28.06.2019 – SP)