CSM|SP: Registro de imóveis – Incorporação empresarial – Transmissão imobiliária sujeita ao sistema de título e modo – Compromisso de compra e venda sem aptidão causal – Transferência da propriedade – Necessidade de prévia averbação da incorporação para o registro da escritura pública de compra e venda – ITBI – Imunidade tributária que necessita de análise prévia do titular da competência tributária – Recurso não provido.

ACÓRDÃO 

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1043342-11.2018.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante SK REALTY EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, são apelados MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO e PRIMEIRO OFICIAL DE REGISTRO DE IMOVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 28 de maio de 2019.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1043342-11.2018.8.26.0100

Apelante: Sk Realty Empreendimentos Imobiliários Ltda

Apelados: Municipalidade de São Paulo e Primeiro Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 37.736

Registro de imóveis – Incorporação empresarial – Transmissão imobiliária sujeita ao sistema de título e modo – Compromisso de compra e venda sem aptidão causal – Transferência da propriedade – Necessidade de prévia averbação da incorporação para o registro da escritura pública de compra e venda – ITBI – Imunidade tributária que necessita de análise prévia do titular da competência tributária – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por SK Realty Empreendimentos Imobiliários Ltda. contra a r. sentença de fls. 207/211, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 1º Oficial de Registros de Imóveis da Comarca de Capital, mantendo a recusa do ingresso de escritura pública de compra e venda de imóvel em razão da violação do princípio da continuidade.

Sustenta a apelante o cabimento do registro, sem a incidência de impostos de transmissão imobiliária, por ser sucessora da vendedora em razão de incorporação, quanto a negócio jurídico ocorrido em data anterior à incorporação da empresa Salto Empreendimentos Imobiliários SE Ltda. Pela recorrente (fls. 223/232).

A D. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 258/262).

É o relatório.

O título apresentado a registro encerra escritura pública de compra e venda do imóvel matriculado sob o n. 111.082, no qual a vendedora SK Realty Empreendimentos Imobiliários Ltda. menciona atuar na condição de sucessora de direitos e obrigações de Salto Empreendimentos Imobiliários SE Ltda., em razão de incorporação.

Na matrícula do imóvel consta a empresa Salto Empreendimentos Imobiliários SE Ltda. como proprietária, não havendo qualquer registro atinente ao compromisso de compra e venda celebrado e tampouco a incorporação empresarial (a fls. 161/163).

O artigo 1.116 do Código Civil estabelece:

Art. 1.116. Na incorporação, uma ou várias sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações, devendo todas aprová-la, na forma estabelecida para os respectivos tipos.

Desse modo, a empresa incorporadora sucede em todos os direitos e obrigações da empresa incorporada em decorrência de sucessão universal.

A sucessão na incorporação de sociedades empresariais decorre de ato inter vivos, portanto, é regida pelo direito das obrigações e empresarial, não se aplicando as disposições do direito das sucessões, notadamente, o disposto no artigo 1.784 que estabelece a transmissão independentemente de outra providência (droit de saisine).

Essa situação, com aplicação por analogia à sociedade limitada, é prevista no artigo 234 da Lei n. 6.404/76 que dispõe:

Art. 234. A certidão, passada pelo registro do comércio, da incorporação, fusão ou cisão, é documento hábil para a averbação, nos registros públicos competentes, da sucessão, decorrente da operação, em bens, direitos e obrigações.

Diante disso, a aquisição imobiliária em razão de atos de incorporação empresarial segue o disposto no artigo 1.245 do Código Civil, o qual encerra opção legislativa pelo sistema do título e do modo.

Conforme Mónica Jardim (Efeitos substantivos do registro predial. Almedina: Coimbra, 2013, p. 51):

No sistema de título e modo a aquisição, modificação ou extinção dos direitos reais dependem de um título – fundamento jurídico ou causa que justifica a mutação jurídicoreal – e de um modo: acto pelo qual se realiza efectivamente a aquisição, modificação ou extinção do direito real, acto através do qual se executa o prévio acordo de vontades.

Nessa linha, o parágrafo primeiro do artigo 1.245 do Código Civil refere – Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.

De outra parte, o contrato de promessa ou compromisso de compra e venda, ainda que em situação excepcional, não presente neste julgamento, possa encerrar título de transmissão da propriedade (artigo 26, p. 6º, da Lei n. 6.766/79), regra geral tem por objeto a celebração do contrato de compra e venda, inclusive, nesse caso, o direito real decorrente de seu registro envolve direito real de aquisição e não transmissão da propriedade (Código Civil, artigos 1.417 e 1.418).

Nessa perspectiva, a apelante celebrou contrato de compra e venda em cumprimento ao compromisso de compra e venda (a fls. 141/146).

Ocorre, todavia, a necessidade da transmissão da propriedade entre as empresas incorporadora e absorvida para cumprimento do contrato de compromisso de compra e venda, o qual é causa para celebração do contrato de compra e venda (já celebrado) e não título de translativo do direito de propriedade.

Portanto, a titular do direito de propriedade do imóvel registrado sob o n. 111.082 é a empresa incorporada (de Salto Empreendimentos Imobiliários SE Ltda.).

A transmissão da propriedade para a apelante dependerá da averbação no registro imobiliário do ato de incorporação, seguido do registro da transferência da propriedade em cumprimento à obrigação assumida pela empresa incorporada no contrato preliminar firmado anteriormente à incorporação.

O Princípio da Continuidade, previsto no artigo 195 da Lei de Registros Públicos, com aplicação no caso em exame por força da aquisição derivada da propriedade imobiliária, impede o ingresso do título sem o registro da aquisição da propriedade em nome da recorrente (alienante constante do título apresentado).

Não encerrando o compromisso de compra e venda título bastante (causa) para a transmissão dominial e não sendo a alienante constante do título (escritura pública de compra e venda) proprietária do imóvel, não cabe o ingresso no registro imobiliário.

Esse ponto foi tratado de forma precisa pela MM. Juíza Corregedora Permanente, como segue:

No presente caso, o imóvel encontra-se registrado em nome de Salto Empreendimentos Imobiliários SE Ltda. (fls. 161/163). Por outro lado, o título que se pretende registrar (fls. 141/146) tem como outorgante SK Realty Empreendimentos. Portanto, não há identidade entre proprietário e outorgante, o que inviabiliza o registro, nos termos do Art. 195 da Lei 6.015/73.

Assim, para possibilitar o registro do título, deve ser averbado/registrado ato em que se noticie que o bem passou a pertencer a SK Realty, ou ser apresentado título em que a proprietária Salto conste como outorgante.

Nestes termos, a primeira exigência deve ser mantida.

O artigo 156, parágrafo 2º, inciso I, da Constituição Federal, estabelece a seguinte imunidade com relação ao Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

(…)

II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

(…)

§ 2º O imposto previsto no inciso II:

I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;

Nestes termos, a imunidade tributária não ocorre, nos termos da norma constitucional, se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.

Não compete ao Oficial do Registro Imobiliário examinar a não incidência, mas sim ao titular da competência tributária.

A manifestação do Município de São Paulo confirma essa compreensão (a fls. 235/241).

Ante a necessidade da transferência da propriedade imóvel, bem como da análise da imunidade pela municipalidade, igualmente, compete manter a exigência nesse sentido.

Por todo o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 27.06.2019 – SP)