CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Escritura pública de compra e venda outorgada em 28 de abril de 1969 – Falta da assinatura de uma das testemunhas instrumentais – Omissão que, neste caso concreto, não se mostra suficiente para retirar a validade e a eficácia do ato notarial em razão do conteúdo das vontades manifestadas pelas partes do negócio jurídico – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1114495-41.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante VERA MARIA BARBOSA GALLANE, é apelado 15º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), DAMIÃO COGAN (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 31 de agosto de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1114495-41.2017.8.26.0100

Apelante: Vera Maria Barbosa Gallane

Apelado: 15º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo

VOTO Nº 37.542

Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – Escritura pública de compra e venda outorgada em 28 de abril de 1969 – Falta da assinatura de uma das testemunhas instrumentais – Omissão que, neste caso concreto, não se mostra suficiente para retirar a validade e a eficácia do ato notarial em razão do conteúdo das vontades manifestadas pelas partes do negócio jurídico – Recurso provido para julgar a dúvida improcedente.

Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Sr. 15º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo e manteve a negativa do registro de escritura pública de compra e venda do apartamento nº 3 do 2º pavimento, ou 1º andar, do Edifício situado na rua Vinte e Oito (28) – B, nº 95, quadra 42, do Núcleo Residencial Dr. Francisco Morato de Oliveira, 22º Subdistrito-Tucuruvi, São Paulo, com origem na transcrição nº 9.539.

A apelante alegou, em suma, que o registro foi negado em razão da omissão da assinatura de uma das testemunhas instrumentais indicadas na escritura pública de compra e venda. Esclareceu que requereu a declaração da convalidação da escritura ao MM. Juiz de Direito da 2ª Vara de Registros Públicos e que em razão do indeferimento desse pedido a presente dúvida foi julgada procedente. Asseverou que a legislação vigente prevê a possibilidade de dispensa da intervenção de testemunha instrumental em escritura pública, sendo também nesse sentido o item 30 do Capítulo XV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça. Afirmou que na vigência do Código Civil de 1916 as testemunhas instrumentárias somente eram necessárias quando as partes não eram conhecidas do Tabelião de Notas e não podiam ser identificadas por documentos, para efeito de confirmação de suas identidades, o que não ocorreu neste caso concreto. Disse que a falta da assinatura de uma das testemunhas decorreu de erro do tabelião de notas. Requereu o provimento do recurso para que a dúvida seja julgada improcedente.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 91/93).

É o relatório.

A compra e venda do imóvel foi celebrada mediante escritura pública, lavrada às fls. 56/58 do livro nº 38 do 27º Tabelião de Notas da Comarca da Capital, em que figuraram como vendedor o IPESP, representado pela Dra. Lúcia Theresa Patti Giorgio Marrano, e como compradores o Sr. Péricles Barbosa Lima e sua esposa, D. Maura Borba Barbosa.

Além disso, figuraram na escritura pública como testemunhas instrumentais os Srs. Wilson José Flausino Alves e Antonio Flausino Alves, ambos qualificados como “…funcionários dêste cartório, aqui domiciliados e residentes, meus conhecidos…”, dos quais somente o segundo a assinou.

Verifica-se na escritura de compra e venda que a participação das testemunhas instrumentárias teve como única finalidade comprovar a identidade das partes e confirmar o conteúdo das vontades que essas manifestaram ao escrevente para a celebração do negócio jurídico (fls. 16).

Essa era, ademais, a finalidade da intervenção das testemunhas instrumentárias nas escrituras de compra e venda, prevista em norma anterior ao Código Civil de 1916.

Contudo, diante da fé pública atribuída ao tabelião de notas, a Lei nº 6.952/81 alterou o art. 134 do Código Civil de 1916 para possibilitar a dispensa dessas testemunhas, exceto se uma das partes não pudesse ser identificada por documentos e não fosse conhecida do tabelião:

Art. 134. É, outro sim, da substância do ato o instrumento público.

(…)

§ 5º – Se algum dos comparecentes não for conhecido do tabelião, nem puder identificar-se por documento, deverão participar do ato pelo menos 2 (duas) testemunhas que o conheçam e atestem sua identidade“.

Essa norma foi repetida no art. 215, § 5º, do Código Civil vigente e, mais, a dispensa de testemunhas instrumentárias nas escrituras públicas de compra e venda é a praxe hoje adotada, pois assim possibilitado pela redação do item 44 do Capítulo XIV do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, ressalvando-se as hipóteses previstas em lei para sua intervenção.

Neste caso concreto o negócio jurídico foi celebrado por escritura pública em que o vendedor declarou a vontade de transmitir a propriedade do imóvel cujo preço recebeu integralmente (item “c” de fls. 15) e em que os compradores declararam que “…aceitavam a presente escritura em todos os seus termos…” (item “a” de fls. 16).

Diante disso, também in casu é possível reconhecer que a escritura pública representa negócio jurídico formalmente válido, sendo a ausência da assinatura de somente uma das testemunhas instrumentárias insuficiente para a declaração da invalidade do ato notarial nesta via administrativa.

Deve-se considerar, ademais, que a escritura pública foi assinada pelo escrevente que a lavrou e pelo Oficial Maior que a encerrou, contém em seu final a cotação dos emolumentos e selo (fls. 16), e que na certidão expedida na forma de traslado não consta que foi cancelada, pelo Tabelião de Notas, por estar incompleta (fls. 15/16).

No mais, quanto ao indeferimento do pedido administrativo de validação da escritura pública, prevalecem as razões expostas pelos ilustres membros do Ministério Público em seus doutos pareceres (fls. 53/56 e 91/93), ambos no sentido de que a r. decisão prolatada no procedimento que teve curso perante a Corregedoria Permanente se limitou a reconhecer que na via administrativa não era possível alterar o conteúdo do ato notarial, isso sem implicar em declaração de validade ou nulidade da escritura pública.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para julgar a dúvida improcedente.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 07.02.2019 – SP)