CSM|SP: Registro de imóveis – Dúvida julgada procedente – Instrumento particular de integralização de capital social – Sócio representado por mandatária – Procuração em que outorgados poderes para assinar e outorgar contratos de compra e venda de bens móveis e imóveis – Poderes genéricos que não autorizam a transmissão da propriedade de imóvel para integralização de capital social – Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 0001301-68.2016.8.26.0083, da Comarca de Aguaí, em que é apelante PLUS EMPREENDIMENTOS AGUAÍ SPE LTDA. – REPDA. POR ROGÉRIO TEIXEIRA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE AGUAÍ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso para manter a recusa do registro do título, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 4 de outubro de 2018.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 0001301-68.2016.8.26.0083

Apelante: Plus Empreendimentos Aguaí Spe Ltda. – Repda. Por Rogério Teixeira

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Aguaí

VOTO N.º 37.568

Registro de imóveis – Dúvida julgada procedente – Instrumento particular de integralização de capital social – Sócio representado por mandatária – Procuração em que outorgados poderes para assinar e outorgar contratos de compra e venda de bens móveis e imóveis – Poderes genéricos que não autorizam a transmissão da propriedade de imóvel para integralização de capital social – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por PLUS EMPREENDIMENTOS AGUAÍ SPE LTDA. contra r. sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Aguaí e manteve a recusa do registro do contrato de transmissão do imóvel objeto da matrícula n.º 3.931 que foi destinado para a integralização de seu capital social.

A apelante alegou, em suma, que o sócio Arnaldo Legaspe Barbosa promoveu a transmissão do imóvel, no instrumento de constituição da sociedade, visando à integralização de sua participação no capital social. Disse que o alienante foi representado por mandatária constituída por meio de escritura pública em que previsto poderes específicos para “…assinar e outorgar contratos de quaisquer natureza, como contratos de locação ou fiança, compra e venda de bens móveis e imóveis…”. Asseverou que o contrato social foi registrado na Junta Comercial, constituindo título hábil para o registro da transmissão do imóvel destinado à integralização de seu capital social. Aduziu que a transmissão de imóvel para integralização do capital social de empresa não é causa de dilapidação do patrimônio e não constitui ato que exorbite os poderes de administração ordinária. Esclareceu que os sócios mantêm relacionamento comercial desde 28 de agosto de 2014 quando celebraram contrato de parceria para a execução do loteamento DIVA ASSAD, para o que constituíram a empresa ER EMPREENDIMENTOS AGUAÍ SPE LTDA., e que a manifestação do interveniente Augusto Henrique Simon Barbosa não é suficiente para afastar a validade do negócio jurídico que foi celebrado.

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Observo, inicialmente, que apesar da referência realizada na suscitação da dúvida (fls. 02) não foi juntada aos autos a certidão da matrícula n.º 3.931 do Registro de Imóveis da Comarca de Aguaí, o que seria necessário para a completa qualificação do título caso afastado o óbice oposto ao registro, consistente em ausência de poderes especiais e expressos para a mandatária representar o mandante na transmissão do imóvel.

Contudo, o resultado da dúvida dispensa a conversão do julgamento em diligência para a juntada da referida certidão.

O imóvel objeto da matrícula nº 3.931 foi transmitido pelo sócio Arnaldo Legaspe Barbosa, no “Instrumento Particular de Contrato Social de Constituição da Sociedade PLUS EMPREENDIMENTOS AGUAÍ SPE LTDA”, para a integralização de sua participação no capital social (fls. 03/14).

No contrato social foi esse sócio representado por procuradora constituída pela escritura pública de fls. 18/19.

A representação do mandante na alienação de imóvel para a integralização de capital social constitui ato que exorbita os poderes de mera administração, pois importa em retirar o bem do patrimônio do sócio e transmiti-lo ao patrimônio da sociedade que tem personalidade jurídica própria.

Em razão disso, para representar o sócio na transmissão de imóvel para a integralização de capital social deve a mandatária ter poderes especiais e expressos, na forma do parágrafo primeiro do art. 661 do Código Civil:

Art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de administração.

§ 1º Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos”.

No presente caso, no instrumento público de procuração outorgado pelo sócio em favor de sua procuradora (fls. 18/19) constam, entre outros, os seguintes poderes:

f.) Assinar e outorgar contratos de quaisquer natureza, como contratos de locação ou fiança, compra e venda de bens móveis e imóveis, assinar na qualidade de fiador, locador, e/ou locatário, outorgar Instrumentos Públicos ou Particulares em geral e Retificá-los ou Ratificá-los , se necessário, estipulando cláusulas e condições, aceitando fiadores; rescindir, alterar e prorrogar contratos; promover despejos, executar inquilinos, ou seus fiadores, receber aluguéis, taxas e indenizações; dar e receber quitação, firmar recibos das quantias recebidas;…”; (fls. 18/19).

Os poderes para “…outorgar contratos de quaisquer natureza, como contratos de locação ou fiança, compra e venda de bens móveis e imóveis…”, entretanto, são por demais genéricos e não equivalem a poderes expressos para vender imóvel determinado, ou a determinar, com fixação do preço da venda, no que, em tese, poderia ser compreendido o poder para alienar imóvel mediante negócio jurídico distinto consistente em integralização de capital social.

Portanto, embora ambos os contratos, de compra e venda e de integralização de capital social, sejam bilaterais, onerosos e comutativos, neste caso concreto os poderes genéricos para outorgar contratos de quaisquer naturezas, como os de compra e venda, não podem ser interpretados como poderes para alienar imóvel determinado ou a determinar, por valor diretamente ajustado pela mandatária.

E o valor da alienação, ainda neste caso concreto, corresponde ao das cotas sociais integralizadas em nome do alienante, o que também afasta a alegação de que na integralização de capital social haveria mero ato de administração ordinária.

Por seu lado, os contratos de execução de loteamento de imóvel com parceria, reproduzidos às fls. 52/62 e 78/87, não compõem o título apresentado para registro e, mais, disseram respeito a negócios jurídicos distintos, razão pela qual não alteram o resultado da dúvida.

Por fim, diante do que foi alegado pelo interveniente Augusto Henrique Simon Barbosa (fls. 94/95), anoto que eventual litígio relativo à validade da procuração e de negócio jurídico em que o sócio foi representado pela mandatária deverá ser solucionado em ação própria, pois o procedimento de dúvida é inadequado para essa finalidade.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso para manter a recusa do registro do título.

GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 21.11.2018 – SP)