CSM|SP: Dúvida – Registro de Imóveis – Doação – Recurso interposto contra sentença que, mantendo a recusa do Oficial, indeferiu o registro stricto sensu de doação de imóvel que, adquirido na constância de sociedade conjugal em regime de comunhão parcial, foi, entretanto, doado apenas por um dos cônjuges, figurando o outro com o status de mero anuente – Dúvida quanto à necessidade de comparecer esse outro cônjuge na condição de outorgante doador, diante da comunicação de aquestos operada ex vi do verbete n. 377 da Súmula do Supremo Tribunal Federal – A anuência do cônjuge sugere, na espécie, que marido e mulher nunca tiveram o versado bem imóvel como integrante da comunhão – Circunstância que afasta a presunção sumular – Anuência que, ademais, torna inequívoca a intenção de doar (art. 112 do Código Civil) – Óbice afastado – Apelação a que se dá provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1009372-46.2016.8.26.0114, da Comarca de Campinas, em que é apelante HELIO ROSOLEN, é apelado 3º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAMPINAS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, nos termos do voto do Desembargador Ricardo Dip, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), vencedor, PEREIRA CALÇAS, vencido, PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY E SALLES ABREU.

São Paulo, 19 de setembro de 2017

RICARDO DIP

RELATOR DESIGNADO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

Conselho Superior da Magistratura

Apelação Cível 1009372-46.2016.8.26.0114

Procedência: Campinas

Apelante: Helio Rosolen

Apelado: 3º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca

Dúvida – Registro de Imóveis – Doação – Recurso interposto contra sentença que, mantendo a recusa do Oficial, indeferiu o registro stricto sensu de doação de imóvel que, adquirido na constância de sociedade conjugal em regime de comunhão parcial, foi, entretanto, doado apenas por um dos cônjuges, figurando o outro com o status de mero anuente – Dúvida quanto à necessidade de comparecer esse outro cônjuge na condição de outorgante doador, diante da comunicação de aquestos operada ex vi do verbete n. 377 da Súmula do Supremo Tribunal Federal – A anuência do cônjuge sugere, na espécie, que marido e mulher nunca tiveram o versado bem imóvel como integrante da comunhão – Circunstância que afasta a presunção sumular – Anuência que, ademais, torna inequívoca a intenção de doar (art. 112 do Código Civil) – Óbice afastado – Apelação a que se dá provimento.

VOTO (n. 50.266):

RELATÓRIO:

1. Indeferido o registro stricto sensu de doação, celebrada por escritura pública, e mantida, em processo de dúvida, a negativa originária, por sentença do MM. Juiz Corregedor Permanente, do decidido apela o interessado, entendendo que era caso de inscrever-se o título.

Aduz, a tanto, que se casou na vigência do atual Código civil, de modo que não incide, na espécie, o verbete n. 377 da Súmula do colendo Supremo Tribunal Federal. Logo, tendo sido o ora apelante o único adquirente do imóvel, e não havendo comunicação deste bem, só ao exclusivo proprietário competiria comparecer, na condição de causante, ao versado negócio jurídico de doação, ao qual, de toda maneira, anuiu também sua mulher, o que mais razão seria para que se lhe concedesse a inscrição, tal como rogada.

2. À digna Procuradoria Geral de Justiça parece que se haja de negar provimento ao recurso (fls. 67-9).

É o relatório.

VOTO:

3. Datum neque concessum que o verbete n. 377 da referida Súmula persuasória emitida pela egrégia Suprema Corte federal tenha aplicação aos casamentos celebrados na vigência do Código civil de 2002 – e a jurisprudência deste Conselho realmente vai neste sentido –, não era caso de negar-se o registro solicitado, porque a anuência dada pela mulher, no ato mesmo da doação, sugeria (ainda que aposteriori) que não houve a comunicação do bem: esse anuir, com efeito, é bastante indiciário de que os cônjuges nunca tiveram esse bem imóvel por integrante da comunhão, e isto é suficiente para arredar a presunção, que é iuris tantum, anunciada pela previsão sumular.

4. Se o que basta não bastasse, a intervenção da mulher no negócio jurídico deixa claro que era inequívoco o propósito dos cônjuges em transferir o imóvel ao donatário, o que é suficiente para entender-se como corretamente exercido o poder de dispor, certo que “nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem” (art. 112 do Código civil). Com efeito, falsa demonstratio non nocet, a “falsa exposição ou explicação do objeto dos contratos” não lhes tira a eficácia (cf. PONTES DE MIRANDA, Tratado deDireito Privado III, 2. ed., Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, p. 164-165, § 282) – que, in casu, é a eficácia translativa do domínio em favor do beneficiário.

TERMOS EM QUE, dou provimento à apelação, para, reformada a r. sentença de primeiro grau, proceder-se ao registro stricto sensu rogado por Helio Rosolen.

É como voto.

Des. RICARDO DIP

Presidente da Seção de Direito Público

Relator designado 

(DJe de 19.04.2018 – SP)