1ª VRP|SP: Dúvida – Reconhecimento extrajudicial de usucapião do imóvel – Lei que passou a vigorar durante o procedimento de dúvida – Aplicação imediata – Natureza processual da norma – Dúvida improcedente.

Processo 1042601-05.2017.8.26.0100

Dúvida

Registros Públicos

1º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

P. R. F. S.

“Dúvida – Reconhecimento extrajudicial de usucapião do imóvel – Lei que passou a vigorar durante o procedimento de dúvida – aplicação imediata – natureza processual da norma – Dúvida improcedente”.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de P. R. F. S., diante da negativa em se proceder o reconhecimento extrajudicial de usucapião do imóvel consistente no apartamento 51 e uma vaga na garagem, ambos do bloco “A”, do Edifício São João Del Rey, localizado na Rua Tutoia nº 839 – Vila Mariana.

Os óbices registrários referem-se:

a) à exigibilidade de expressa concordância do titular de domínio, sendo seu silêncio interpretado como discordância;

b) à inexistência de previsão legal para publicação de edital.

Juntou documentos às fls.03/56.

O suscitado apresentou impugnação às fls.62/63. Esclarece que se trata de prescrição aquisitiva fundamentada no art. 1242 do Código Civil, sendo que o justo título e a boa fé estão comprovados pelo instrumento particular de compromisso de venda e compra, pela ata notarial e farta documentação comprobatória da posse. Apresentou documentos às fls.64/74.

Tendo em vista a conversão da Medida Provisória nº 759/16 na Lei 13.465/17, que passou a regular a usucapião no âmbito administrativo, o Oficial apresentou nova manifestação às fls.83/85.

Aduz que, apesar da conversão mencionada, a dúvida é julgada no estado em que o título foi prenotado. Assim não há a possibilidade da aplicação ao procedimento de legislação inexistente ao tempo da prenotação, pois se fosse permitido, haveria ilegal prorrogação do prazo da prenotação, com consequências nos efeitos jurídicos destas decorrentes.

O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls.89/91).

É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

Em que pesem as argumentações do Registrador, entendo que a dúvida deva ser julgada improcedente. À época da apresentação do título para reconhecimento da usucapião extrajudicial vigorava a Lei 6015/73, a qual juntamente com as Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, dispunha que o titular do domínio deveria expressamente concordar com o procedimento, sendo que o silêncio seria interpretado como discordância.

Ocorre que durante o processamento do presente feito sobreveio a conversão da Medida Provisória 759/16 na Lei 13465/17, que passou a disciplinar o procedimento da usucapião extrajudicial, que alterou a redação do § 2º e acresceu o § 13 no artigo 216-A da Lei de Registros Públicos, para estabelecer que:

§ 2º: Se a planta não contiver a assinatura de qualquer um dos titulares de direitos registrados ou averbado na matrícula do imóvel usucapiendo ou matrícula dos imóveis confinantes, o titular será notificado pelo registrador competente, pessoalmente ou pelo correio com aviso de recebimento, para manifestar consentimento expresso em quinze dias, interpretado o silêncio como concordância.

§ 13: Para efeito do § 2º deste artigo, caso não seja encontrado o notificando ou caso ele esteja em, lugar incerto ou não sabido, tal fato será certificado pelo registrador, que deverá promover a sua notificação por edital mediante publicação, por duas vezes, em jornal local de grande circulação, pelo prazo de quinze dias cada um, interpretado o silêncio do notificar como concordância” (g.n)

Decerto que o Conselho Superior da Magistratura tem considerado que, para fins de registro, não importa o momento da celebração do contrato, em atenção ao princípio “tempus regit actum”, sujeitando-se o título à lei vigente ao tempo de sua apresentação (Apelação Cível nº, 115-6/7, rel. José Mário Antonio Cardinale, nº 777-6/7, rel. Ruy Camilo, nº 530-6/0, rel. Gilberto Passos de Freitas, e, mais recentemente, nº 0004535-52.2011.8.26.0562, relatada por V. Exa.).

Todavia, a conversão da Medida Provisória em lei tem natureza processual, e visa disciplinar os procedimentos a serem adotados nos casos concretos, sendo que a lei processual, via de regra, tem aplicação imediata aos processos em curso, não alcançando atos processuais praticados antes de sua vigência. Passa a valer, no processo pendente, atingindo todos os atos futuros, devendo ser validados todos os atos praticados na égide da lei anterior, modificada ou revogada pela nova.

Na presente hipótese nenhum ato foi praticado pelo Oficial, sendo que a prenotação do título se prorroga até a solução final da lide. A alteração da norma, permitindo a notificação por edital, bem como que o silêncio do titular de domínio ser interpretado como concordância, constituem superação dos óbices impostos pelo Registrador, devendo a lei nova ser aplicada imediatamente para todos os atos a serem praticados.

Sobre o assunto, dispõe o art. 1046 do Código de Processo Civil:

”Ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes…”

Diante do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de P. R. F. S., e determino o prosseguimento do procedimento para a usucapião extrajudicial estabelecido na Lei 13.465/17.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 11 de setembro de 2017.

Tania Mara Ahualli Juíza de Direito

(DJe de 19.09.2017 – SP)