1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Carta de arrematação – Ausência de trânsito em julgado – Exigência – Irreversibilidade da transmissão – Dúvida improcedente. 

Processo 0026225-05.2010.8.26.0100 (100.10.026225-1)

Dúvida

Registro de Imóveis

15º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

A. dos S. L..

VISTOS.

O 15º Oficial de Registro de imóveis, a requerimento do interessado A. dos S. L., suscitou dúvida em razão da recusa em registrar a carta de arrematação sob condição resolutiva oriunda da reclamação trabalhista no imóvel objeto da matrícula nº 88.529, daquela Serventia.

Aduz que a carta de arrematação foi concedida sob condição resolutiva não em razão do pagamento da arrematação, mas por depender do trânsito em julgado, o que viola o princípio da legalidade registrária.

O interessado impugnou a dúvida, alegando que o pagamento foi feito em parcela única de sorte que a recusa do Oficial, baseada na aplicação da sistemática do Gedeg e Arisp, deve ser afastada (fls. 07/09).

O Ministério Público, após considerar pertinente o óbice do registrador, opinou pela improcedência da dúvida apenas em razão do que ficou decidido nos autos do conflito de competência nº 106446-SP, do STJ (fls. 26/29).

É O RELATÓRIO.

FUNDAMENTO E DECIDO.

Observe-se, de início, que os títulos judiciais não estão imunes à qualificação da Serventia para ingresso no fólio real. Nos autos da apelação cível nº 464-6/9, de São José do Rio Preto, decidiu o E. Conselho Superior da Magistratura que:

“Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal, O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.

O Egrégio Conselho Superior da Magistratura tem decidido, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação cível n.413-6/7).

Fica claro, destarte, que não basta a existência de título proveniente de órgão judicial para autorizar o ingresso no registro tabular.

O caso ora em exame, a despeito do r entendimento do Ministério Público, não se amolda aos termos do conflito de competência nº 106446-SP, do STJ, haja vista que não há manifestação do MM. Juízo do Trabalho determinando o registro do título. Há apenas expedição de título oriundo de execução trabalhista, o qual foi apresentado diretamente pelo interessado e qualificado negativamente pelo Oficial.

Sabe-se que a segurança jurídica é o escopo maior dos registros públicos, motivo por que exige-se o trânsito em julgado para o registro dos títulos.

Contudo, o caso em exame encerra uma peculiaridade que o difere dos demais.

A Lei nº 11.382/06 alterou o art. 694 do Código de Processo Civil, agora redigido nos seguintes termos:

“Assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo serventuário da justiça ou leiloeiro, a arrematação considerar-se-á perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 1º A arrematação poderá, no entanto, ser tornada sem efeito: (Renumerado com alteração do parágrafo único, pela Lei nº 11.382, de 2006).

I – por vício de nulidade; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

II – se não for pago o preço ou se não for prestada a caução; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

III – quando o arrematante provar, nos 5 (cinco) dias seguintes, a existência de ônus real ou de gravame (art. 686, inciso V) não mencionado no edital; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

IV – a requerimento do arrematante, na hipótese de embargos à arrematação (art. 746, §§ 1º e 2º); (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

V – quando realizada por preço vil (art. 692); (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).

VI – nos casos previstos neste Código (art. 698). (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).

§ 2º No caso de procedência dos embargos, o executado terá direito a haver do exequente o valor por este recebido como produto da arrematação; caso inferior ao valor do bem, haverá do exequente também a diferença.”

Como se vê, mesmo no caso de procedência dos embargos, o executado terá direito de receber do exequente apenas o valor por este auferido como produto da arrematação, e não de reaver o imóvel.

Daí decorre a possibilidade do registro da carta de arrematação no Registro de Imóveis a despeito do ausência do trânsito em julgado dos recursos.

Entendimento contrário implicaria esvaziar o teor da inovação legal, uma vez que, como a propriedade dos bens imóveis só se transfere, exceto no caso da saisine, por meio do registro do título aquisitivo no Registro de Imóveis, seria de pouca ou nenhuma utilidade a alguém possuir uma carta de arrematação que não pode ser registrada.

À vista dessa peculiaridade da carta de arrematação, que decorre de texto expresso de Lei, fica superada a questão referente à condição resolutiva.

Posto isso, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo 15º Oficial de Registro de Imóveis para determinar o registro da carta de arrematação.

Para os fins do art. 203, II, da Lei nº 6.015/73, servirá esta de mandado, nos termos da Portaria Conjunta nº 01/08, da 1ª e 2ª Varas de Registros Públicos da Capital.

Nada sendo requerido no prazo legal, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 29 de setembro de 2010.

Gustavo Henrique Bretas Marzagão

Juiz de Direito

(DJe 25/10/2010)