CGJ|SP: Registro de Imóveis – Dispensa pelo tabelião de apresentação de certidões negativas de débito emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil para a lavratura de escritura de compra e venda – Admissibilidade – Inteligência do item 59.1 do Capítulo XIV das NSCGJ – Inexistência de falha do tabelião – Decretação da nulidade da escritura que não se justifica – Ausência de vício extrínseco – Parecer pelo não provimento do recurso administrativo.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Recurso Administrativo n° 1011462-85.2016.8.26.0224

C O N C L U S Ã O

Em 6 de fevereiro de 2017, conclusos ao Excelentíssimo Senhor Desembargador PEREIRA CALÇAS, DD. Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo.

(29/2017-E)

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dispensa pelo tabelião de apresentação de certidões negativas de débito emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil para a lavratura de escritura de compra e venda – Admissibilidade – Inteligência do item 59.1 do Capítulo XIV das NSCGJ – Inexistência de falha do tabelião – Decretação da nulidade da escritura que não se justifica – Ausência de vício extrínseco – Parecer pelo não provimento do recurso administrativo.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso administrativo interposto por Nurion F. S. Indústria e Comércio de Correias Ltda. contra a sentença de fls. 79/81, que, por não vislumbrar a prática de falta funcional pelo Xº Tabelião de Notas de Guarulhos, determinou o arquivamento do pedido de providências iniciado pela recorrente.

Sustenta a recorrente, em resumo, que a lavratura de escritura pública sem a exigência da apresentação de CND foi irregular; e que o artigo 47, I, “b”, da Lei n° 8.212/91 foi desrespeitado. Pede, por fim, o reconhecimento da nulidade da escritura lavrada, com efeito ex tunc, e a punição do tabelião na esfera disciplinar (fls. 85/92).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 105/112).

É o relatório.

Opino.

Alega a recorrente que era proprietária de dois imóveis (matriculas n° 23.220 e 24.062 do Registro de Imóveis de Poá) e que, “devido à necessidade de ampliar o capital de giro da empresa”’ (fls. 2), combinou de vendê-los a dois comerciantes, que passariam integrar o quadro social da empresa, injetando dinheiro no negócio.

Embora a recorrente não tivesse condições de obter certidões negativas de débitos emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, o tabelião dispensou a apresentação delas e a escritura de compra e venda foi lavrada (fls. 30/34) e registrada.

Alega a recorrente que foi vítima de um golpe, pois os aspirantes a sócios se negaram a entrar no quadro social da empresa, causando-lhe considerável prejuízo financeiro.

Sustentando que a dispensa das certidões negativas de débito foi ilegal, pede a recorrente a decretação da nulidade da escritura e a punição disciplinar do tabelião.

Como bem concluiu a MM. Juíza Corregedora Permanente, o caso é de indeferimento dos pedidos.

Inspirado em precedentes do Supremo Tribunal Federal que inadmitiram a imposição de sanções políticas pelos entes tributários para, por vias oblíquas, constranger o contribuinte a quitar débitos tributários, o Conselho Superior da Magistratura reconheceu inexistir justificativa “para condicionar o registro de títulos nas serventias prediais à prévia comprovação da quitação de créditos tributários, contribuições sociais e de outras imposições pecuniárias compulsórias”’ (Apelações Cíveis n° 0018870-06.2011.8.26.0068, 0013479-23.2011.8.26.0019 e 9000003-22.2009.8.26.0441, todas sob a relatoria do Desembargador José Renato Nalini).

O passo seguinte foi a alteração do item 59 do Capítulo XIV das NSCGJ, possibilitando aos tabeliães, no exercício da qualificação notarial, dispensar a apresentação de certidões negativas de débitos emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e da certidão conjunta negativa de débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da União emitida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.1

Seguindo a mesma linha, nova redação foi dada ao item 119.1 do Capítulo XX das NSCGJ.2

Ora, se as Normas de Serviço permitem que esse tipo de certidão seja dispensada, evidentemente não há que se falar em falha do tabelião de notas, que, seguindo essa prescrição, lavra escritura de compra e venda independentemente da apresentação de CND (fls. 30/34).

E se não há falha do tabelião, por consequência, não há que se falar em decretação de nulidade da escritura. Principalmente nesta via administrativa, em que somente vícios extrínsecos ao título – raríssimos, aliás poderiam ser reconhecidos. Nesse sentido:

“É entendimento assente na Corregedoria Geral que a ela falece competência para “a análise e decisão acerca da eficácia ou validade das relações jurídicas contidas em ato notarial, porquanto a matéria se situa em campo de atuação reservada exclusivamente à atividade jurisdicional.” (in Decisões Administrativas da CGJ, RT, 1991, n. 94, p. 255).

Mesmo se o caso é de falta de manifestação de vontade, pela extinção da representação contida em mandato, para muitos hipóteses de inexistência, nem mesmo de nulidade, seu reconhecimento não se pode consumar na seara administrativa, como já se decidiu em hipótese, igualmente de ausência de declaração de vontade, porque falseada (v. Processo CG n. 1.812/96, Comarca da Capital, que versa também sobre a irregularidade de representação de empresa outorgante).

Todavia, se não se quer a analogia, já decidiu esta Corregedoria Geral que mesmo a regularidade da procuração com base na qual se lavrou a escritura não enseja a anulação ou cancelamento administrativo desta e, menos ainda, do registro que lhe sucedeu, a não ser que por decisão proferida em processo contraditório (Processo CG 204/83, in Decisões Administrativas da CGJ, RT, 1.983/1.984, p. 46).

Tudo isto porque, neste campo correcional, a atuação da Corregedoria, Geral e Permanente, se desenvolve longe do contraditório, do processo jurisdicional. Trata-se de mister administrativo, atipicamente cometido a um juiz, mas que, enquanto corregedor, atua como administrador. Nem mesmo de jurisdição graciosa se pode considerar seja sua atividade, malgrado não se desconheça posição em contrário. Insta ter em conta que o chamado procedimento jurisintegrativo, que se diz de administração pública de interesses privados, para o CPC de jurisdição voluntária, a despeito de que não substitutivo, característica básica da jurisdição, é judicial, ou seja, exercido pelo juiz na sua condição de juiz, e não de administrador.

Se é assim, só lhe é lícito, na esfera correcional, conhecer e julgar vícios que sejam extrínsecos, formais, atinentes às regras procedimentais de lavratura do título notarial ou ao mecanismo de seu registro (art. 214 daLRP)”. (Processo n° 1.134/03, parecer do Juiz Assessor da Corregedoria Geral da Justiça, Dr. Cláudio Luiz Bueno de Godoy).

Desse modo, a manutenção da decisão prolatada se impõe.

Nesses termos, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso administrativo.

Sub censura.

São Paulo, 15 de fevereiro de 2017.

Carlos Henrique André Lisboa

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO

Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso administrativo.

Publique-se.

São Paulo, 16 de fevereiro de 2017.

PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça

Assinatura Eletrônica

_________

1 59.2. Nada obstante o previsto nos artigos 47, I, b, da Lei n.s 8.212, de 24 de julho de 1991, e no artigo 257,1, b, do Decreto n.s 3.048, de 6 de maio de 1999, e no artigo 1º do Decreto n.s 6.106, de 30 de abril de 2007, faculta-se aos Tabeliães de Notas, por ocasião da qualificação notarial, dispensar, nas situações tratadas nos dispositivos legais aludidos, a exibição das certidões negativas de débitos emitidas pelo INSS e pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e da certidão conjunta negativa de débitos relativos aos tributos federais e à dívida ativa da União emitida pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, tendo em vista os precedentes do Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo no sentido de inexistir justificativa razoável para condicionar o registro de títulos à prévia comprovação da quitação de créditos tributários, contribuições sociais e outras imposições pecuniárias compulsórias.

2 119.1. Com exceção do recolhimento do imposto de transmissão e prova de recolhimento do laudêmio, quando devidos, nenhuma exigência relativa à quitação de débitos para com a Fazenda Pública, inclusive quitação de débitos previdenciários, fará o oficial, para o registro de títulos a particulares, notariais ou judiciais.

(DJe de 20.03.2017 – SP)