CGJ|SP: Cartório de Notas – Sugestão de limitação à publicidade de informações relativas a inventários extrajudiciais – descabimento – Publicidade que rege toda a atividade notarial – Aplicação analógica dos itens 93 e 152 do Capítulo XIV das Normas de Serviço – Via extrajudicial que constitui mera opção dos interessados – Proposta rejeitada.

PROCESSO Nº 2015/189848 (75/2016-E)

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CARTÓRIO DE NOTAS – Sugestão de limitação à publicidade de informações relativas a inventários extrajudiciais – descabimento – Publicidade que rege toda a atividade notarial – Aplicação analógica dos itens 93 e 152 do Capítulo XIV das Normas de Serviço – Via extrajudicial que constitui mera opção dos interessados – Proposta rejeitada.

Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de sugestão formulada pelo advogado Cleiton da Silva Germano, visando à atenuação da publicidade dada as escrituras de inventário lavradas em serventias extrajudiciais. Alega o interessado que os inventários realizados na modalidade extrajudicial podem ser facilmente rastreados, o que expõe indevidamente o patrimônio dos envolvidos. Propõe que tanto o conteúdo da escritura do inventário como sua própria existência sejam divulgados apenas mediante preenchimento de formulário com todos os dados da pessoa a ser pesquisada.

Sobre a proposta, manifestaram-se o Juiz Corregedor Permanente dos Cartórios de Notas da Capital (fls. 8/9) e o Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo (fls. 13/19).

É o breve relato.

Opino.

Como ressaltado pelo Presidente do Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo, a sugestão diz respeito a dois pontos distintos:

a) possibilidade de qualquer pessoa efetuar pesquisa sobre a existência de inventários na base de dados da Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários – CESDI;

b) possibilidade de qualquer pessoa obter certidão do ato notarial na serventia extrajudicial.

O interessado sugeriu a limitação da publicidade tanto da pesquisa como da obtenção da certidão.

O Corregedor Permanente dos Serviços de Notas da Capital opinou pela manutenção da publicidade de todas as informações.

Já o Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo se manifestou no sentido de se possibilitar a pesquisa, limitando-se o acesso ao ato notarial em si.

Em relação ao item “a” – possibilidade de qualquer pessoa efetuar pesquisa sobre a existência de inventários na base de dados da Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários – CESDI – inviável a alteração pretendida pelo interessado.

O Provimento nº 18 do Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados – CENSEC, composta de vários módulos, dentre os quais a Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários – CESDI, preceitua em seu artigo 8º:

Art. 8º. Poderá qualquer interessado acessar o sítio eletrônico para obter informação sobre a eventual existência dos atos referidos no artigo anterior e o sistema indicará, em caso positivo, o tipo de escritura, a serventia que a lavrou, a data do ato, o respectivo número do livro e folhas, os nomes dos separandos, divorciandos, “de cujus”, cônjuges supérstites e herdeiros, bem como seus respectivos números de documento de identidade (RG ou equivalente) e CPF e o (s) advogado (s) assistente (s).

Pela leitura do dispositivo, resta claro que um dos principais objetivos da criação da Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados – CENSEC foi justamente possibilitar a busca unificada dos atos notariais lavrados em nosso país. E o artigo 8º do Provimento nº 18 do CNJ não restringe de nenhuma forma o acesso a esse tipo de informação, preceituando que qualquer interessado poderá obter informação sobre a eventual existência de escrituras de separação, divórcio e inventário.

Destarte, inviável a modificação pretendida.

No que tange ao item “b” – possibilidade de qualquer pessoa obter certidão do ato notarial na serventia extrajudicial – em que pese a sugestão do Colégio Notarial de modificação do regramento do tema (fls. 15/18), a publicidade deve ser mantida de modo irrestrito.

A ampla publicidade dos atos praticados nos tabelionatos de notas, sem a necessidade de se declinar o motivo pelo qual se requer a informação, é princípio que rege toda a atividade notarial. A respeito do tema, ensina Narciso Orlandi Neto:

Além de ser atribuição do Notário, a expedição de certidão é também um dever, à medida que não a pode negar a quem quer que seja. Os livros de notas são públicos, significando que qualquer pessoa tem acesso a seu conteúdo, o que, evidentemente, não se confunde com acesso físico ao próprio livro” (“Atividade Notarial – Noções”, in Introdução ao Direito Notarial e Registral, Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 2004, p. 22).

Não obstante as escrituras de inventário não sejam mencionadas especificamente, o item 93 do Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria-Geral, repetindo diretriz estabelecida na Resolução nº 35 do CNJ, assim dispõe:

93. Não há sigilo nas escrituras públicas de separação e divórcio consensuais.

No que concerne às escrituras públicas de testamento, prescreve o item 152 do Capítulo XIV das Normas de Serviço:

152. As certidões de escrituras públicas de testamento, enquanto não comprovado o falecimento do testador, serão expedidas apenas a seu pedido ou de seu representante legal, ou mediante ordem judicial.

O item 93, de modo absoluto, proíbe qualquer forma de limitação à publicidade das escrituras de separação e divórcio.

Já o item 152 admite o sigilo em apenas uma hipótese: certidão de escritura de testamento de pessoa ainda não falecida. Em sentido contrario, comprovado o falecimento do testador, qualquer um, independentemente da demonstração de interesse, pode obter certidão da escritura do testamento.

Desse modo, se a publicidade é absoluta para as escrituras de separação, divórcio e testamento – essa última com uma única e compreensível exceção – não há razão para tratamento diverso em se tratando de escrituras de inventário. Em todos esses casos, a intimidade e a vida privada dos envolvidos são, em algum grau, expostas. Nem por isso resolveu-se limitar a publicidade desses atos a aqueles que demonstrem interesse na obtenção da informação. No confronto entre publicidade e intimidade, optou-se pelo resguardo da primeira.

E assim deve ser também para as escrituras de inventário. Embora sem previsão expressa, a ampla publicidade decorre dos princípios que regem a atividade de notas e da aplicação analógica dos itens 93 e 152 do Capítulo XIV das Normas de Serviço.

Convém ressaltar, por fim, que a lavratura de escritura de inventário era (artigo 982 do antigo Código de Processo Civil) e continua sendo (artigo 610,§ 1º, do novo Código de Processo Civil) opção das partes interessadas. Assim, se os herdeiros não têm interesse na divulgação de determinada informação, que optem pelo inventário judicial e requeiram a decretação do segredo de justiça (artigo 189 do novo Código de Processo Civil).

O que não se admite é a criação de um sigilo sui generis, sem autorização legal, dentro de uma atividade que tem a publicidade como característica essencial.

Por todo o exposto, opino pela rejeição da proposta formulada, cientificando-se todos os interessados.

É este o parecer que submeto ao elevado critério de Vossa Excelência.

Sub censura.

São Paulo, 21 de março de 2016.

Carlos Henrique André Lisboa

Juiz Assessor da Corregedoria

CONCLUSÃO

Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, rejeito a proposta formulada por Cleiton da Silva Germano.

Publique-se.

Dê-se ciência do teor desta decisão ao proponente e ao Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo.

São Paulo, 23/03/2016

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça

D.J.E. de 01.04.2016