1ª VRP|SP: Registro de imóveis – Escritura de doação – Usufrutuária menor impúbere – Ausência de representação da menor – Doação pura – Art. 543, CC – Desnecessidade de alvará judicial – Dúvida improcedente.

1096909-59.2015

Dúvida

1º Registro de Imóveis

A. J. e J. de F. L. J.

Sentença:

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de A. J. e J. de F. L. J., em face da negativa em se proceder ao registro de Escritura de Doação com Instituição e Reserva de Usufruto, lavrada perante o 8º Tabelião de Notas da Capital, na qual os titulares de domínio doaram imóvel gravando-o com usufruto para D. L. S. M. da S. e J. de F. L. J., sendo a nua propriedade constituída a favor de J. L. V., G. L. M. da S. e L. L. M. da S..

Os óbices registrários referem-se à ausência de representação da menor, L. L. M. da S., por seus pais para aceitação da doação em nome dela, bem como ausência de apresentação de alvará judicial, que autorize a aquisição do imóvel, gravado com usufruto, pela menor.

Juntou documentos às fls. 04/29.

Não houve apresentação de impugnação, conforme certidão de fl.40.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida, mantendo-se os óbices registrários (fls.35/36 e 44).

É o relatório.

Passo a fundamentar e a decidir.

Em que pesem os argumentos expostos pelo Registrador, e do precedente deste Juízo trazido à baila nestes autos, entendo que o caso em tela deva ter avaliação diferenciada. Na presente hipótese, ainda que o imóvel esteja gravado com usufruto, considera-se a doação como pura, ou seja, não haverá encargo para o titular da nua propriedade, que é absolutamente incapaz em razão da idade.

O artigo 543 do Código Civil dispõe que:

“Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura”.

Ao comentar este dispositivo legal, Nelson Rosenvald (Comentários ao Código Civil, Coordenação de César Peluso, pag. 423) diz que:

“Quer dizer, não se trata de aceitação presumida do incapaz. Simplesmente se aperfeiçoa a doação com a tradição do bem ao incapaz e com o registro da escritura de doação do bem imóvel, sem a participação do absolutamente incapaz e de seu representante legal. O consentimento do incapaz deixa de ser elemento integrativo do contrato.”

Desta mesma interpretação comunga Luiz Guilherme Loureiro, em sua obra Registro Públicos Teoria e Prática:

“Quando o donatário for pessoa absolutamente incapaz, não é necessário o consentimento do representante legal, quando se trata de doação pura (art. 543, CC). Há uma aparente contradição entre este dispositivo que constitui inovação em nosso ordenamento jurídico e a norma do art. 1.748 do CC, segundo a qual compete ao tutor, com autorização do juiz, aceitar em nome do menor as doações, puras ou com encargos. Este artigo não faz distinção entre menoridade absoluta e relativa. Assim, para que seja mantida a unidade do sistema jurídico, forçoso concluir que somente é dispensável a aceitação do menor absolutamente incapaz, desde que se trate de doação pura e não se encontre ele sobre regime de tutela.” (pag. 416).

Deste diapasão, acrescento que o menor deverá estar em situação regular, do ponto de vista de sua guarda e representação. Agiu com acerto o Tabelião ao consignar na escritura que:

“por tratar-se de doação pura da nua propriedade do imóvel, a outorgada Laura, por ser absolutamente incapaz, fica dispensada a aceitação da doação”.

Verifico que cada situação apresentada a desate traz uma peculiaridade que deve ser analisada isoladamente no momento da qualificação.

No presente caso, não vejo necessidade da expedição de alvará judicial. Conforme acima mencionado, cuida-se de doação pura, que virá exclusivamente em benefício da menor, não lhe acarretando qualquer ônus ou prejuízo, e os genitores participam no negócio jurídico.

Por fim, deixo de instaurar procedimento de providências para apurar a conduta do Oficial do 13º Registro de Imóveis da Capital, conforme requerimento da Douta Promotora de Justiça, uma vez que o Registrador tem liberdade e independência para qualificar os títulos a eles encaminhados e não vislumbro a existência de má-fé ou erro grosseiro.

Diante do exposto, julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de A. J. e J. de F. L. J., possibilitando o ingresso do título.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos ao arquivo, com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

(DJe de 25.11.2015 – SP)