CGJ|SP: Disciplinar – Pedido de Providências – Decisão de arquivamento – Recurso Administrativo – Ata Notarial lavrada por escrevente da Tabeliã que se apresenta regular sob o aspecto formal – Inexistência de conduta infracional passível de providência correcional – Recurso não provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 2015/18383

(100/2015-E)

Disciplinar – Pedido de Providências – Decisão de arquivamento – Recurso Administrativo – Ata Notarial lavrada por escrevente da Tabeliã que se apresenta regular sob o aspecto formal – Inexistência de conduta infracional passível de providência correcional – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto pelo SINDICATO DOS TRABALHADORES AGREGADOS NAS EMPRESAS DE TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE CARGAS SECAS E MOLHADAS E OPERAÇÕES LOGÍSTICAS NO ESTADO DE SÃO PAULO contra a decisão do MM. Juiz Corregedor Permanente da Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabeliã de Notas do 22° Subdistrito – Tucuruvi – da Comarca da Capital, que determinou o arquivamento do “Pedido de Providências” instaurado por provocação do recorrente, sob o fundamento de que a ata notarial lavrada pelo escrevente e subscrita pelo substituto da Tabeliã, não apresenta nenhuma irregularidade, e determinou o arquivamento dos autos.

O recorrente alega nulidade da decisão por cerceamento de defesa, porque as testemunhas que arrolou não foram ouvidas. Diz que mesmo que o escrevente tivesse comparecido na Assembleia, este não se identificou, além de não ter pedido licença para adentrar em imóvel particular, conduta que afronta os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, previstos no artigo 37 da Constituição Federal. Afirma que não pode ser aceita a assertiva que constou da decisão recorrida, de que “o ato simplesmente reproduziu constatações, cuja valoração probatória merecerá a devida aquilatação jurídica no respectivo palco, sem margem para identificar incúria, nesse particular”, pois, embora confeccionada a ata notarial de modo irregular, esta produz os efeitos previstos no artigo 364 do Código de Processo Civil. Acrescenta que não existe a pessoa jurídica denominada pelo escrevente na ata, pois o correto é Sindicato dos Transportadores e não Trabalhadores, e que o conteúdo da ata não tem narrativa precisa e detalhada, porque foi transcrita ao gosto de quem a solicitou.

A decisão recorrida foi mantida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

Opino.

O recorrente insurge-se contra a conduta do escrevente da Tabeliã, sob a alegação em sede de recurso de que a ata notarial lavrada está eivada de irregularidades, pois não ficou comprovado que o escrevente compareceu ao local onde foi realizada a assembléia, e, se acaso compareceu, não se identificou, que inexiste a pessoa jurídica denominada na ata notarial, e a narrativa da ata não é clara e precisa, razão pela qual pede que seja declarada nula e que seja instaurado processo administrativo disciplinar. Diz que houve cerceamento de defesa, porque as testemunhas que arrolou não foram ouvidas, e que, ao contrário do que constou na decisão recorrida, a ata faz prova não só de sua formação, como também dos fatos que o agente declara ter ocorrido em sua presença, nos termos do artigo 364 do Código de Processo Civil.

As Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça tratam da ata notarial no Capítulo XIV, nos seguintes termos:

“137. Ata notarial é a narração objetiva, fiel e detalhada de fatos jurídicos presenciados ou verificados pessoalmente pelo Tabelião de Notas.

137.1 A ata notarial é documento dotado de fé pública.

137.2 A ata notarial será lavrada no livro de notas.

A ata notarial conterá:

a) local, data, hora de sua lavratura e, se diversa, a hora em que os fatos foram presenciados ou verificados pelo Tabelião de Notas;

b) nome e qualificação do solicitante;

c) narração circunstanciada dos fatos;

d) declaração de haver sido lida ao solicitante e, sendo o caso, às testemunhas;

e) assinatura e sinal público do Tabelião de Notas.

A ata notarial poderá:

a) conter a assinatura do solicitante e de eventuais testemunhas;

b) ser redigida em locais, datas e horas diferentes, na medida em que os fatos se sucedam, com descrição fiel do presenciado e verificado, e respeito à ordem cronológica dos acontecimentos e à circunscrição territorial do Tabelião de Notas;

c) conter relatórios ou laudos técnicos de profissionais ou peritos, que serão qualificados e, quando presentes, assinarão o ato;

d) conter imagens e documentos em cores, podendo ser impressos ou arquivados em classificador próprio.

O Tabelião de Notas deve recusar a prática do ato, se o solicitante atuar ou pedir-lhe que aja contra a moral, a ética, os costumes e a lei.

140.1 É possível lavrar ata notarial quando o objeto narrado constituir fato ilícito.

Da análise da ata ora impugnada, verifica-se que há identificação completa do escrevente que a lavrou, Michel Regis dos Reis, menção de que está autorizado e é competente para tanto, que o faz em atendimento à solicitação do Sr. Ailton Gonçalves, assessor jurídico do Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo, SINDICAM-SP, com os dados de qualificação do advogado e do sindicato. Em seguida, consta da ata que o escrevente, em atendimento à solicitação, compareceu no local indicado (e descreve o endereço do imóvel) com a finalidade de constatar atos, propostas, debates e decisões a serem tomadas em reunião de Assembleia Geral para a criação do Sindicato ora recorrente, e, na sequência, menciona a hora que chegou ao local e das pessoas que o acompanharam, prossegue descrevendo o horário em que teve início a reunião pela pessoa identificada como Sr. José Grimaldo Santiago, indica o RG e CPF deste, a existência de uma lista de presença e que constatou haver aproximadamente 40 pessoas, e, no mais, relata os atos que presenciou no decorrer da assembleia até o encerramento desta, mediante menção ao horário do seu término e ao horário em que deixou o local e retornou à serventia. O encerramento do ato se deu com a assinatura do escrevente, mediante menção de que lavrou a ata e que esta foi lida em alta e clara voz ao solicitante e que foi conferida, seguida da subscrição do substituto da Tabeliã, e do solicitante.

Verifica-se, pois, que os requisitos necessários foram observados, e que a simples afirmação do recorrente de que o escrevente não esteve no local, não tem o condão de afastar a fé pública da qual o ato notarial está revestido e da presunção de veracidade que lhe é inerente. Nota-se que o único fato mencionado pelo recorrente com o fim de justificar a afirmação de que o escrevente não esteve no local, foi o de não ter se identificado, o que está corroborado pelas declarações juntadas a fls. 58/60, uma delas do senhor Reginaldo Lopes da Silva, que foi o secretário geral da Assembléia, com o fim de comprovar tal fato.

Ocorre que, além de não ser requisito das normas de serviço acima transcritas a identificação do escrevente reclamada pelo recorrente, este não agiu na clandestinidade, nem tampouco procurou passar despercebido, ao contrário, além de ter identificado as pessoas que se manifestaram e participaram da direção dos trabalhos, o escrevente fez constar da ata que acompanhou o solicitante quando este tentou entregar a Reginaldo Lopes da Silva, o mencionado secretário geral da Assembléia, uma notificação, porém, foi impedido pelo senhor José Grimaldo Santiago, pessoa inicialmente qualificada na ata.

Não há de se falar, também, em “invasão de propriedade particular”, pois, a realização da assembléia de um sindicato é um ato público, precedida de edital publicado na imprensa, na qual foram convocados todos os trabalhadores do setor (fls. 92) de modo que foi regular a presença no local do escrevente, a pedido do advogado de um sindicato do mesmo setor, pois, não se tratou de atividade fechada, reservada e privada, nem tampouco houve controle da entrada das pessoas que se interessaram em dela participar, o que, aliás, é fato que corrobora a presunção de veracidade da presença do escrevente no local, a fim de executar o serviço para o qual foi contratado.

Quanto à alegação de que a ata não é clara e precisa, verifica-se que a impugnação do recorrente é subjetiva, pautada em considerações estritamente pessoais acerca dos requisitos da ata que deveriam dela constar e que não constaram, ao afirmar na inicial que “…a ata deveria descrever o tamanho do imóvel no qual a assembléia se realizou, qual seja, o seu tamanho, suas dependências e qual o número de pessoas que poderia abrigar para o normal desenvolvimento da assembléia”, que “Certificou, ainda, que pode constatar ‘haver aproximadamente 40 (quarenta) pessoas, entre as quais membros da comissão e pessoas com uniforme de televisão NGT’. Não explica como soube tratarem algumas pessoas de membros da comissão, e as pessoas com uniforme de televisão NGT estavam a filmar ou não o evento que iria ocorrer”, e que “Quando do início da assembléia não informou o número de pessoas presentes”.

Conclui-se, pois, que na realidade o recorrente sequer afirma que a ata notarial não corresponde à realidade, apenas a considera omissa, porém, o escrevente fez dela constar aquilo que presenciou, considerando a finalidade do ato, o que fez de forma clara e precisa, modo a atender os requisitos legais e normativos sobre o tema.

No mais, se outros atos ou circunstâncias relacionados à assembléia o recorrente considera pertinentes para responder à impugnação do ato, seja perante o Ministério do Trabalho, seja no âmbito jurisdicional, ou mesmo se considera nula a ata em razão das omissões alegadas, deve expô-los e demonstrá-los nestas outras vias, pois, mesmo que, apenas a título de argumentação, a ata fosse considerada nula, esta via administrativa não teria atribuição para reconhecimento e decretação de nulidade, como pretendido.

Por fim, observa-se que o escrevente fez constar da ata, ao invés de “Sindicato dos Transportadores”, “Sindicato dos Trabalhadores”, o que configurou mero erro material, perceptível por meio de simples confrontação da qualificação deste na ata, com seu estatuto social que foi devidamente arquivado no Tabelionato (fls. 38 e 203) o que, evidentemente, não tem o condão de torná-lo inexistente.

Nestas condições, não há de se falar em cerceamento de defesa, a ata notarial está formalmente em ordem, razão pela qual não se vislumbra a configuração de falta funcional passível de providência censório disciplinar.

À vista do exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado exame de Vossa Excelência, é pelo não provimento do recurso.

Sub Censura.

São Paulo, 6 de abril de 2015.

ANA LUIZA VILLA NOVA

Juíza Assessora da Corregedoria Geral da Justiça

DECISÃO: Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria, e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso.

Publique-se.

São Paulo, 08.04.2015.

(a) HAMILTON ELLIOT AKEL

Corregedor Geral da Justiça.

DJe de 24/04/2015

Fonte: INR