1ª VRP|SP: Dúvida – Comunhão parcial de bens – Sucessão – Bens particulares – Interpretação do art. 1.829, I, CC – Concorrência do cônjuge com os descendentes apenas quanto aos bens particulares – Viúva não incluída na partilha do bem particular – Procedência.

1086253-43.2015

(CP – 280)

Dúvida

8º Oficial de Registro de Imóveis

S. B. dos S. R.

Sentença (fls.101/104)

Dúvida – comunhão parcial de bens – sucessão bens particulares – interpretação do art. 1.829, I, CC – concorrência do cônjuge com os descendentes apenas quanto aos bens particulares viúva não incluída na partilha do bem particular procedência.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 8º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de S. B. dos S. R., após negativa de registro de escritura pública de inventário, partilha e sobrepartilha, cujo objeto envolve o imóvel matriculado sob nº 183.374 daquela serventia.

Alega o Oficial que o título trata de três sucessões: primeiramente, por morte de E. P. dos S.. Após, da morte de M. Z. dos S., víuva de Eronides. Por fim, a sucessão de E. P. dos S., que era casado sob o regime de comunhão parcial com O. B. dos S..

As duas primeiras sucessões estão aptas a registro. Contudo, na terceira foi excluída a viúva meeira Olinda. Por força do art. 1.829, I, do Código Civil, a viúva concorre com os descendentes na sucessão, quando houver bens particulares. E esse é o caso do bem objeto da escritura, que foi herdado por Elois (1/6 do imóvel).

Assim, não tendo participado a viúva na partilha do bem, apresentou óbice ao ingresso do título. Juntou documentos às fls. 05/94. Não houve impugnação da suscitada, conforme certidão de fl. 95. Contudo, no pedido de suscitação da dúvida, alega que os bens particulares não alcançam a viúva na sucessão, com base no mesmo artigo do Código Civil.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 99/100).

É o relatório. Decido.

Com razão o Oficial e a D. Promotora. A divergência diz respeito à interpretação da parte final do art. 1.829, I, do Código Civil de 2002:

“Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;”

Do artigo, três são as interpretações possíveis quanto ao trecho destacado, ou seja, quando o falecido deixa bens particulares:

A) O cônjuge supérstite concorre com os descendentes, sobre o conjunto da herança, ou seja, os bens particulares e a meação do falecido;

B) A concorrência ocorre apenas quanto à meação, sendo os bens particulares exclusivos de sucessão apenas quanto aos descendentes;

C) A meação do falecido é partilhada apenas entre os descendentes, enquanto o cônjuge sobrevivente concorre quanto ao bem particular.

No título apresentado, resta claro que a parte ideal de 1/6 do imóvel pertencente a Elois, e que será partilhado, é bem particular, pois proveniente de herança (disposta na própria escritura), conforme dispõe o art. 1.659, I, do Código Civil.

Não há divergência quanto a isto, conforme declarou a própria apresentante à fl. 15: “(…) constituindo-se, portanto, o referido imóvel, bem particular”.

A controvérsia que deu origem a este procedimento ocorreu porque o Oficial adota a interpretação C, enquanto a suscitada entende ser aplicável a interpretação B.

Ambas as opiniões e argumentos que as embasam são pertinentes, tanto é assim que a 3ª e 4ª Turma do Supremo Tribunal de Justiça divergiam, adotando cada uma das turmas uma destas interpretações, conforme o Acórdão citado abaixo:

“A Terceira Turma, em sessão do dia 17/10/2013, vencida a E. Ministra NANCY ANDRIGHI, decidiu afetar o julgamento do recurso à Segunda Seção, tendo em vista a existência de votos divergentes acerca da matéria proveniente da 3ª e da 4ª Turma.”

Contudo, no julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 1.368.123 – SP (2012/0103103-3), Rel: Min. Sidnei Beneti, pela Segunda Seção do STJ, houve pacificação do tema, conforme a seguinte ementa:

“RECURSO ESPECIAL. CIVIL. DIREITO DAS SUCESSÕES. CÔNJUGE SOBREVIVENTE. REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. HERDEIRO NECESSÁRIO. EXISTÊNCIA DE DESCENDENTES DO CÔNJUGE FALECIDO. CONCORRÊNCIA. ACERVO HEREDITÁRIO. EXISTÊNCIA DE BENS PARTICULARES DO DE CUJUS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.829, I, DO CÓDIGO CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. (…) 3. A referida concorrência dar-se-á exclusivamente quanto aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus.”

Deste modo, a interpretação do Oficial está correta, pois a viúva O. B. dos S. deve concorrer com os descendentes de E. na partilha da parte ideal do imóvel pertencente ao falecido, por ser esta parte bem particular. Assim, fica impedida de ingresso no fólio registral da escritura, nos termos apresentados.

Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 8º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de S. B. dos S. R., mantendo o óbice registrário.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 24 de setembro de 2015.

Tania Mara Ahualli Juíza de Direito

(DJe de 07.10.2015 – SP)