CGJ|SP: Tabelião de notas – Retificação de escritura pública de compra e venda – Impossibilidade – Inexistência de erro material evidente – Necessidade de retificação por nova escritura – Entendimento há muito sedimentado pela Corregedoria Geral da Justiça – Recusa correta – Recurso não provido.

Processo CG n° 2013/168270
(03/2014-E)
Tabelião de notas – Retificação de escritura pública de compra e venda – Impossibilidade – Inexistência de erro material evidente – Necessidade de retificação por nova escritura – Entendimento há muito sedimentado pela Corregedoria Geral da Justiça – Recusa correta – Recurso não provido.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:
S. L. M. e M. C. M. interpuseram recurso administrativo, denominado como “apelação”, contra a decisão da MMª Juíza Corregedora Permanente do 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Suzano, que indeferiu o pedido de retificação de escritura de compra e venda de imóvel lavrada pela referida unidade.
Afirmam os recorrentes que a decisão recorrida não observou as alegações e documentos instruídos com o pedido e não apresentou a motivação que ensejou o indeferimento, nem tampouco trouxe a certeza, outro requisito essencial, o que gera a nulidade do ato, e, quanto ao mérito da decisão, dizem que esta se deu com base nas informações prestadas pelo Tabelião, com as quais não concordam, porque de acordo com a nota de devolução apresentada pelo Oficial do 18° Registro de Imóveis da Comarca da Capital, a transcrição aquisitiva é de número 12.741 e não 69.073 como constou da escritura, e que os documentos pertinentes à comprovação do erro foram juntados, o que possibilita a retificação postulada.
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não conhecimento do recurso, ou, se conhecido, pelo não provimento.
É o relatório.
O recurso está em condições de ser conhecido, e, embora interposto e recebido como “apelação”, na realidade se trata de recurso administrativo, porque foi interposto contra decisão proferida em procedimento administrativo, nos termos do artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo. Não se trata de procedimento de dúvida, pelo qual é imprescindível a exibição do título original, sem o que é impossível o exame para fins de ingresso no fólio real, devido aos princípios e regras legais que norteiam o registro imobiliário, portanto, a juntada do título por cópia não obsta o julgamento.
Não se vislumbra ausência de motivação na r. decisão recorrida, a qual, embora sucinta, expressamente indicou as razões do indeferimento da pretensão, quais sejam, a incerteza do alegado erro, não dirimida pelos documentos apresentados, o que impede a retificação na via administrativa.
Além do mais, a r. decisão se reportou aos motivos apresentados pelo Tabelião, os quais, portanto, passaram a integrá-la.
Na realidade, os recorrentes demonstram inconformismo com o teor do julgado, porém, não têm razão.
É cediço que as escrituras públicas como regra não comportam retificação e devem ser corrigidas por meio de lavratura de nova escritura pública e não por determinação judicial.
Como preleciona o eminente Pontes de Miranda: “falta competência aos juízes para decretar sanções e, até para retificar erros das escrituras públicas: escritura pública somente se retifica por outra escritura pública, e não por mandamento judicial” (RT 182/754 – Tratado de Direito Privado – Tomo III, 338 – pág. 361). No mesmo sentido é a lição de Washington de Barros Monteiro, na obra “Curso de Direito Civil, vol. I, pág. 263.
Portanto, não cabe ao juiz retificar escrituras que encerram tudo que se passou e foi declarado perante o Oficial, tanto que os livros de notas sequer apresentam colunas de averbações destinadas a tal fim, justamente por inexistir previsão legal a respeito.
Não obstante, nos casos em que a retificação decorre de mero erro material, perceptível pela simples confrontação de documentos ou outras provas com o erro alegado, excepcionalmente se admite a retificação.
Neste sentido são os precedentes desta E. Corregedoria Geral da Justiça, a exemplo do Processo CG n° 2011/95458 no qual o parecer da lavra do MMº Juiz Auxiliar da Corregedoria Jomar Juarez Amorim foi aprovado pelo Corregedor Geral da Justiça Maurício Vidigal, e dispõe que “…a retificação de escritura pública pelo próprio notário é cabível em situações excepcionais, de erro material evidente” e, em seguida, faz menção ao parecer no mesmo sentido da lavra do MM° Juiz Auxiliar da Corregedoria Walter Rocha Barone, no Processo CG n° 26.445/2010, o qual cita como precedentes os Processos CG n°s 129/87, 114/89, 178/96, 398/00.
No caso vertente, bem se vê que o erro alegado não é meramente material. A escritura foi lavrada há muitos anos, em 1973, época em que o registro imobiliário adotava o sistema de transcrições, as quais descreviam o imóvel em área maior e com indesejável frequência de maneira precária, mediante indicação de medidas inexatas, portanto, nem sempre traziam a devida identificação, delimitação e individualização da área maior e das demais áreas dela decorrentes.
A certidão da escritura pública objeto da retificação assim descreve o imóvel: UM TERRENO designado como lote “G” da Quadra 5 (cinco) do Parque Tropical, situado no subdistrito do Butantã, do distrito, município e comarca de São Paulo, capital, medindo referido terreno, 7,00 metros de frente para a Praça três (3) (passagem particular 2); 19,25 metros da frente aos fundos do lado direito, confrontando com o lote de terreno “H” pertencente aos mesmos proprietários; 19,25 metros da frente aos fundos, do lado esquerdo confrontando com o lote “F”, pertencentes aos mesmos proprietários; 7,00 metros nos fundos, encerrando a área total de 134,75 metros quadrados. Dito imóvel é parte do havido pelos vendedores, por força da transcrição n° 69.073 averbado no livro auxiliar n° 8-A sob n° 551 pág. 106, à margem da inscrição n° 21 do Registro de Imóveis da 10ª Circunscrição Imobiliária de São Paulo, capital;” (fls. 9/10).
O Oficial do 18° Registro Imobiliário da Comarca da Capital, ao receber a referida escritura para registro, negou o ingresso do título sob a alegação de que a transcrição aquisitiva do imóvel é a de número 12.741 e não a 69.073.
As certidões desta transcrição indicada pelo oficial do registro como correta, foram juntadas a fls.11/13 e 14/15, além da planta do loteamento (fls. 22) e, do confronto da descrição da escritura com as descrições das referidas certidões referentes à transcrição n° 12.741, não é possível concluir que esta é a transcrição aquisitiva do imóvel, ao contrário, há dúvidas a respeito, devido às divergências existentes e descritas pelo Tabelião em sua manifestação de fls.28, quais sejam, a inexistência da quadra 5, divergência de metragem, e da confrontação do lote “G” em relação à uma viela, as quais persistiram, mesmo após a juntada da certidão de fls.35, referente à transcrição número 69.073.
À vista do exposto, não é possível a retificação ora pretendida, portanto, ao recurso deve ser negado provimento, com a observação de que, devido à indagação dos recorrentes de como proceder para regularizar o registro do imóvel, estes deverão, caso haja impossibilidade de ser lavrada nova escritura com o fim de rerratificar a primeira, ajuizar ação de usucapião, por se tratar de modo originário de aquisição da propriedade, cuja sentença de procedência possibilitará a obtenção da titularidade do domínio pelos recorrentes.
É o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência.
Sub Censura.
São Paulo, 13 de janeiro de 2014.
ANA LUIZA VILLA NOVA
Juíza Assessora da Corregedoria Geral da Justiça
DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso, com a observação de que, devido à indagação dos recorrentes de como proceder para regularizar o registro do imóvel, estes deverão, caso haja impossibilidade de ser lavrada nova escritura com o fim de rerratificar a primeira, ajuizar ação de usucapião, por se tratar de modo originário de aquisição da propriedade, cuja sentença de procedência possibilitará a obtenção da titularidade do domínio pelos recorrentes. Publique-se. São Paulo, 14.01.2014. – (a) – HAMILTON ELLIOT AKEL – Corregedor Geral da Justiça.
DJe de 24.01.2014