CGJ|SP: Procedimento disciplinar – Ata notarial – Afirmação de que o conteúdo da ata não reflete os fatos presenciados pelo preposto do tabelião – Necessidade de dilação probatória – Anulação da sentença, com retorno dos autos para colheita da prova.

CGJSP – PROCESSO: 118580/ CGJSP – PROCESSOLOCALIDADE: São Paulo
DATA JULGAMENTO: 28/08/2014 DATA DJ: 09/09/2014
Relator: Elliot Akel
íntegra:

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo nº 2014/118580
PROCESSO Nº 2014/118580SÃO PAULO4º TNA. H.- Advogados: P. D. e S., OAB/SP 242.660, D. A. G. R., OAB/SP 249.600 e C. R. B. S., OAB/SP 319.213. (262/2014-E) – Dje 9.9.2014, p. 6
Procedimento disciplinar – ata notarial – afirmação de que o conteúdo da ata não reflete os fatos presenciados pelo preposto do tabelião – necessidade de dilação probatória – anulação da sentença, com retorno dos autos para colheita da prova.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,
Cuida-se de recurso administrativo tirado em face de sentença que determinou o arquivamento dos autos em que se examinou eventual falta disciplinar do 4º TN.
O pedido de providências, que deu início ao procedimento, deu conta de que o preposto do tabelião lavrou ata notarial cujo conteúdo é dissociado da realidade dos fatos.
O tabelião manifestou-se pela lisura do procedimento de seu preposto. Esse, por sua vez, foi ouvido e, conquanto inicialmente, não se recordasse de detalhes dos fatos, acabou por confirmar o conteúdo da ata. O interessado, autorizado pelo juízo de primeiro grau, juntou aos autos declarações de testemunhas, que vão de encontro ao que foi aposto na ata notarial.
O juízo de primeiro grau, porém, arquivou o procedimento, baseado no argumento de que, formalmente, a ata está perfeita e, quanto aos fatos nela narrados, caberá à instância própria valorar a prova que se queira fazer por meio do documento público.
O Ministério Público, ouvido na fase de conhecimento e após a sentença, opinou pela necessidade da produção de provas.
Passo a opinar.
Guardado o devido respeito ao juízo de primeiro grau, entendo que a sentença deva ser anulada, tornando os autos à origem, para dilação probatória.
A reclamação do interessado é clara. Ele diz que os fatos descritos na ata notarial não se coadunam com a realidade efetivamente presenciada pelo preposto do tabelião. Em termos claros: o preposto viu uma coisa, mas consignou outra na ata.
A mídia juntada pelo interessado e as declarações de fls. 144/151 vão no mesmo sentido. O preposto do tabelião teria distorcido os fatos presenciados.
Ora, diante desse quadro, caberia ao juízo de primeiro grau alargar a dilação probatória. A sentença pautou-se, tão somente, no testemunho do próprio preposto que lavrou a ata e no argumento de que ela foi lavrada conforme sua percepção, cabendo à instância própria a valoração da prova que vier a ser feita por intermédio desse documento público.
Contudo, o problema, aqui, não é discutir o valor probatório da ata notarial. O que o interessado discute é a dissonância entre o conteúdo da ata e o que realmente aconteceu.
Assim, cabe a dilação para que se amealhe o máximo de elementos probatórios, a fim de que o juízo de primeiro grau decida se há base para se afirmar que o documento foi mal lavrado, do que, em tese, poderia advir sanção disciplinar.
O conteúdo da ata notarial está longe de ser irrelevante. Ao contrário. Ela visa, como apontado na própria sentença, à captação, pelo notário, de uma determinada situação, de um determinado fato. O notário capta esse fato e transmite sua percepção ao documento. Cuidando-se de ata de presença, é patente o conteúdo probatório que se busca com a lavratura.
Ora, se as coisas se passam dessa maneira, é evidente a necessidade de que a ata seja lavrada de acordo com a correta e honesta descrição dos fatos. E é exatamente isso que o interessado afirma que o preposto não fez.
Segundo Paulo Roberto Gaiger Ferreira e Felipe Leonardo Rodrigues, “o tabelião deve narrar os fatos constatados com clareza e objetividade, com acuidade e precisão fática, linguística e gramatical. A ata deve distinguir com clareza o que é atestado pela fé do notário do que é percebido e declarado pelas partes ou por terceiros intervenientes” (Ata Notarial, Quartier Latin, 2010, p. 139).
Logo, cabe ao juízo de primeiro grau esgotar, ao menos, a prova oral, para perquirir se, de fato, a ata notarial foi precisa, se refletiu exatamente o que ocorreu na presença do preposto.
Para tanto, conforme já se vislumbrara no termo de fl. 137, devem ser ouvidos aqueles que prestaram declarações escritas, a interessada na lavratura da ata notarial e, até mesmo, a critério do juízo de primeiro grau, os advogados mencionados na ata.
Tudo isso com o objetivo de se perquirir se o conteúdo da ata notarial refletiu, exatamente, aquilo que foi presenciado pelo preposto.
Evidentemente – porque se trata de matéria de direito – o juízo de primeiro grau, depois de produzida a prova, terá ampla liberdade para decidir se o tabelião pode ser responsabilizado, disciplinarmente, por ato de seu preposto.
Diante do exposto, o parecer que, respeitosamente, submeto a Vossa Excelência, é no sentido de anular a sentença, retornando os autos à origem para dilação probatória.
Sub censura.
São Paulo, 26 de agosto de 2014.
Swarai Cervone de Oliveira
Juiz Assessor da Corregedoria
CONCLUSÃO
Em ______ de 2014, faço estes autos conclusos ao Desembargador HAMILTON ELLIOT AKEL, DD. Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo.
Eu, _____________ (________________), Escrevente Técnico Judiciário do GATJ 3, subscrevi.
Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, anulo a sentença, determinando o retorno dos autos à origem, para a colheita da prova, nos termos expostos no parecer.
Publique-se.
São Paulo, 28/08/2014
HAMILTON ELLIOT AKEL
Corregedor Geral da Justiça