CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida julgada procedente – carta de adjudicação –apresentação de CND do INSS e da Receita Federal – exigência de absoluta impossibilidade de cumprimento pelo recorrente – excepcionalidade demonstrada – Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 0003611-12.2012.8.26.0625, da Comarca de TAUBATÉ, em que é apelante JOÃO JOSÉ DONOFRE e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.
Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, CARLOS AUGUSTO DE SANTI RIBEIRO, Decano em exercício, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.
São Paulo, 13 de dezembro de 2012.
(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça
VOTO
REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – carta de adjudicação –apresentação de CND do INSS e da Receita Federal – exigência de absoluta impossibilidade de cumprimento pelo recorrente – excepcionalidade demonstrada – Recurso provido.
Trata-se de apelação interposta por João José Donofre contra a r. sentença de fls. 153/154, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil da Pessoa Jurídica da Comarca de Taubaté, mantendo a exigência de apresentação das Certidões Negativas de Débito do INSS e da Receita Federal para o registro da carta de adjudicação expedida nos autos do processo nº 625.01.2006.023561-3, que tramitou perante a E. 3ª Vara Cível de Taubaté.
O apelante alegou que apesar de regular confecção e pagamento do compromisso de compra e venda a empresa vendedora não foi localizada para transmissão da propriedade, fato suficiente a exigir a propositura de ação de adjudicação compulsória.
Sustenta o interessado que se mostra impossível cumprir as exigências do Oficial – apresentação das certidões negativas da vendedora – em razão da impossibilidade de localização da empresa, mesmo após inúmeras diligências na ação de adjudicação compulsória, o que acarretou a própria citação por edital da parte demandada.
A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
O Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil da Pessoa Jurídica de Taubaté negou o registro da carta de adjudicação expedida nos autos do processo nº processo nº 625.01.2006.023561-3, que tramitou perante a E. 3ª Vara Cível de Taubaté, no imóvel objeto da matrícula nº 25.964, daquela Serventia de Imóveis, porque não apresentadas as Certidões Negativas de Débito (CND) do INSS e da Receita Federal.
De início, observe-se que os títulos judiciais não são imunes à qualificação do registrador de imóveis, conforme tranquila jurisprudência deste C. Conselho. Por todas, cite-se a apelação cível nº 464-6/9, de São José do Rio Preto:
“Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal, O exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”.
Fica claro, destarte, que o fato de se tratar de título judicial não implica automático ingresso no registro tabular.
Na questão de fundo, o recurso comporta provimento, em virtude da excepcionalidade do caso.
A sentença proferida na ação de adjudicação compulsória supre apenas a recusa do promitente vendedor em outorgar o título hábil para a transmissão da propriedade imóvel, sem atingir as obrigações laterais como apresentação de CNDs ou da guia de recolhimento de ITBI.
E a obrigação de apresentação das certidões negativas de débito do INSS e da Receita Federal decorre do art. 47, da Lei nº 8212/91:
“É exigida Certidão Negativa de Débito-CND, fornecida pelo órgão competente, nos seguintes casos:
I – da empresa:
…
b) na alienação ou oneração, a qualquer título, de bem imóvel ou direito a ele relativo”
O quadro acima demonstra que a recusa do Oficial deveria ser mantida, não fosse à peculiaridade que se passa a demonstrar.
O recorrente celebrou, em 09.11.1973, contrato de compromisso de compra e venda com a empresa Companhia de Obras e Administração S.A (fls. 40/41). Depois de cumprir com sua obrigação de pagar integralmente o preço ajustado, teve frustrado pela vendedora seu legítimo direito à lavratura da escritura pública de compra e venda, título necessário para adquirir o domínio do imóvel na forma do art. 1.245, do Código Civil, em razão do desaparecimento da parte. Ajuizou, por isso, ação de adjudicação compulsória, que após citação por edital da empresa e nomeação de curador para defesa, foi julgada procedente, culminando com a expedição da carta de adjudicação, cujo registro foi recusado pelo Oficial de Registro de Imóveis porque não apresentadas as certidões negativas de débito CNDs da empresa vendedora.
A exigência, conquanto legal, é de impossível cumprimento pelo recorrente, porque fora de seu alcance, haja vista que sequer conseguiu localizar a empresa vendedora na ação de adjudicação – apesar da expedição de inúmeros ofícios para tanto, inclusive à Receita Federal.
Assim, mantida a recusa do Oficial, outra saída não restará ao recorrente a não ser ajuizar ação de usucapião, que fatalmente será julgada procedente, uma vez que a posse do imóvel é exercida a mais de 20 anos.
Ocorre que a ação de usucapião, além de movimentar desnecessariamente a máquina do Judiciário – pois serviria apenas reafirmar, ainda que por outro título, o que já foi reconhecido pela r. sentença da ação de adjudicação compulsória – traria ainda mais prejuízos ao recorrente, notadamente em virtude do tempo, uma vez que, como se sabe, apenas seu ciclo citatório não raro leva anos para ser concluído.
É importante frisar, também, que a usucapião constitui modo originário de aquisição da propriedade, o que dispensaria a apresentação das certidões ora exigidas para o registro da sentença. Assim, a manutenção da recusa serviria apenas para postergar, com elevados custos ao interessado, o registro ora perseguido, que será alcançado da mesma forma ora pleiteada, isto é, sem a apresentação das certidões negativas de débito.
Diante desse quadro excepcional, mostra-se possível a aplicação da ressalva contida no art. 198, da Lei nº 6.015/73, que autoriza o juiz a afastar exigência de impossível cumprimento pelo interessado.
Portanto, embora com respaldo legal, a recusa do Oficial deve ser afastada, permitindo-se o registro do título, porque de absoluta impossibilidade o cumprimento.
Trata-se de solução legítima em evidente prestígio ao direito constitucional à propriedade.
Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso.
(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça (D.J.E. de 01.03.2013 – SP)