CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública – Alienação da nua propriedade e constituição onerosa de usufruto pelo mesmo instrumento – Admissibilidade – Negócios jurídicos distintos – Artigo 1.393 do CC – Inaplicável na hipótese vertente – Exibição de simples cópia do título – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N° 9000001-68.2012.8.26.0434, da Comarca de PEDREGULHO, em que são apelantes MARIA ILZA PALMA DE BARROS PRADO E OUTROS e apelado o OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em dar por prejudicada a dúvida e não conhecer da apelação, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Participaram do julgamento os Desembargadores IVAN RICARDO GARISIO SARTORI, Presidente do Tribunal de Justiça, JOSÉ GASPAR GONZAGA FRANCESCHINI, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, CARLOS AUGUSTO DE SANTI RIBEIRO, Decano em exercício, SAMUEL ALVES DE MELO JUNIOR, ANTONIO JOSÉ SILVEIRA PAULILO e ANTONIO CARLOS TRISTÃO RIBEIRO, respectivamente, Presidentes das Seções de Direito Público, Privado e Criminal do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 13 de dezembro de 2012.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça

VOTO

REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura pública – Alienação da nua propriedade e constituição onerosa de usufruto pelo mesmo instrumento – Admissibilidade – Negócios jurídicos distintos – Artigo 1.393 do CC – Inaplicável na hipótese vertente – Exibição de simples cópia do título – Dúvida prejudicada – Recurso não conhecido.

Os interessados – uma vez inconformados com a desqualificação registral da escritura pública de venda e compra, que prevê a alienação da nua-propriedade de imóvel e a instituição de usufruto, lastreada, pelo Oficial de Registro, na regra do artigo 1.393 do Código Civil (fls. 02/03) -, requereram suscitação da dúvida, oportunidade na qual sublinharam a inexistência de alienação de usufruto (fls. 08/16 e 21/29).

Exibida certidão da matrícula do bem imóvel (fls. 42/44), o Ministério Público opinou pelo registro do título, mas o i. magistrado sentenciante julgou a dúvida procedente (fls. 49/51), motivo pelo qual os interessados interpuseram apelação (fls. 56/69).

Recebido o recurso (fls. 70), e depois de nova manifestação do Ministério Público (fls. 72), os autos foram encaminhados ao Colendo Conselho Superior da Magistratura (fls. 76/77), abrindo-se vista, em seguida, à Douta Procuradoria Geral da Justiça, que, primeiro, propôs o não conhecimento da apelação e, subsidiariamente, o seu provimento (fls. 80/81).

É o relatório.

Com o registro da escritura pública, objetiva-se tanto a transferência da nua propriedade do bem imóvel a Gaspar de Sousa Prado Neto, a Ricardo de Sousa Prado e a Fernando de Sousa Prado, como a constituição onerosa de usufruto em favor de Maria Ilza Palma de Barros Prado.

Embora o suporte documental (escritura pública) seja único, dois foram os negócios jurídicos aperfeiçoados, com fisionomias próprias:

o primeiro, expresso nas manifestações de vontade dirigidas à transmissão, mediante compra e venda, da nua propriedade do bem imóvel, e o segundo, revelado pelas declarações de vontade destinadas à constituição do usufruto.

As circunstâncias negociais, nota distintiva e, por conseguinte, o verdadeiro elemento definidor da declaração de vontade – aqui compreendida tecnicamente, como expressão sinônima de negócio jurídico -, demonstram, in concreto, que dois foram os negócios jurídicos: socialmente enfocadas, as manifestações de vontade, contemplando, então, duas operações econômicas – veiculadas, no entanto, pelo mesmo meio (forma) -, dirigidas à produção de efeitos jurídicos distintos, forjaram relações jurídicas diversas.

No caso discutido, sob outro prisma, a vedação à transferência do usufruto por alienação – positivada, por força da natureza personalíssima deste direito real, na primeira parte do artigo 1.393 do Código Civil de 2002 -, é irrelevante, pois aquela, a alienação, inexistiu.

Ora, na realidade, os contratantes – fica evidente -, visaram à constituição de usufruto por negócio jurídico oneroso inter vivos, admitido pelo ordenamento jurídico pátrio.

De acordo com Miguel Maria de Serpa Lopes, o usufruto, constituído entre vivos, “pode instituir conjuntamente dois titulares, deferindo a um a propriedade e a outro o uso e gôzo”, inclusive porque o que se proíbe é a alienação do usufruto já constituído, e não a alienação, por quem detém a propriedade plena, da nua propriedade a uma pessoa e a constituição do usufruto em favor de outra.

Compartilhando idêntico entendimento, Ademar Fioranelli pondera o cuidado exigido para exame da proibição legal, porquanto prevalece somente a partir da constituição do usufruto, tanto que “nada impede que, na constituição, o titular de domínio aliene a nua-propriedade para A e o usufruto para B, por exemplo.”

Trata-se de entendimento, ademais, que se alinha com julgamento recente deste Colendo Conselho Superior da Magistratura, ocorrido no dia 12 de abril de 2012, expresso no acórdão proferido nos autos da Apelação n.º 0007745-81.2010.8.26.0066, da qual fui relator.

Agora, embora afastada a pertinência da exigência, a dúvida não admite conhecimento, pois acompanhada de simples cópia do título (fls. 04/07).

Com efeito, sem a apresentação da via original da escritura pública, o reexame da desqualificação é vedado: ora, é inadmissível o acesso de mera cópia ao álbum imobiliário, conforme pacífico neste Conselho Superior da Magistratura.

Enfim, o conhecimento da dúvida, comprometendo o exame da apelação, resta prejudicado.

Pelo todo exposto, dou por prejudicada a dúvida e não conheço da apelação.

(a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça (D.J.E. de 27.02.2013 – SP)