2ª VRP|SP: Exigência de Certidão Negativa de Débitos de Tributos Estaduais para lavratura de escritura pública de inventário, lastreada, de forma genérica, em dispositivos legais e normativos. Abrandamento para, doravante, dispensar tal exigência, circunstância que já vigora na prática dos inventários judiciais. Do contrário, constitui regra ilógica, que discrepa do espírito da Lei 11.441/07.

Processo 100.09.113495-4

Pedido de Providências

Associação dos Advogados de São Paulo

VISTOS.

Trata-se de expediente instaurado a partir de representação formulada pela Associação dos Advogados de São Paulo, questionando postura adotada pelo Tabelião do Yº Tabelionato de Notas da Capital, que, erroneamente, estaria exigindo dos interessados, por ocasião da lavratura de escritura pública de inventário, a Certidão Negativa de Débitos de Tributos Estaduais.

O requerimento defende a cessação de tal prática, ante a alegada ausência de respaldo legal, solicitando, ainda, adoção de providências no sentido de normatizar a dispensa de tal exigência.

O Tabelião ofereceu manifestação (fls. 04/05), seguindo-se pronunciamento do Colégio Notarial/SP (fls. 07/10). Após informações apresentadas pela Secretaria da Fazenda (fls. 20/21), o representante do Ministério Público pugnou pelo acerto da exigência (fls. 23). É o relatório.

DECIDO.

A questão ventilada pela Associação dos Advogados de São Paulo, que pretende obter reconhecimento judicial no sentido de normatizar a dispensa de exigência de Certidão Negativa de Débitos de Tributos Estaduais por ocasião da lavratura da escritura pública de inventário, merece apreciação e comporta deferimento.

Com o advento da Lei 11.444/2007, que inovou na possibilidade de lavratura de escritura pública por notário para realizar inventário e a partilha, independentemente de homologação judicial, quando os interessados forem capazes e não houver testamento, transferiu-se ao Tabelião de Notas a responsabilidade direta da verificação pelo cumprimento das obrigações tributárias.

Evidentemente, o notário não reúne poder para aplicar sanções aos usuários inadimplentes, mas deverá condicionar a prática dos atos de seu ofício, nos casos previstos legalmente, à apresentação da prova de pagamento ou inexistência de débitos.

No que diz respeito à exigência da prévia exibição da Certidão Negativa de Débitos de Tributos Estaduais, para lavratura da escritura pública de inventário, tenho que a conduta do Tabelião do Yº Tabelionato de Notas da Capital não caracteriza ilícito funcional, porquanto lastreada, ainda que de forma genérica, em dispositivos legais e normativos.

Assim é, porque o artigo 1027, inciso IV do Código de Processo Civil exige a necessidade de prova de quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e as suas rendas. Por seu turno, o artigo 192 do Código Tributário Nacional sinaliza a necessidade “da prova da quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas”, situação reproduzida no Capítulo XIV, item 115, “g”, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, que traçou diretriz no sentido de estabelecer que “na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos … (g) certidão negativa de tributos”.

A conduta, portanto, do Tabelião, não é ilegal, inexistindo medida censório-disciplinar a ser instaurada. Não obstante a ausência de matéria de interesse disciplinar, reconheço, no caso em exame, que o tema, no aspecto notarial, reclama abrandamento para, doravante, dispensar tal exigência, circunstância que já vigora na prática dos inventários judiciais.

Manter a necessidade da exibição das certidões nos inventários extrajudiciais constitui regra ilógica, que discrepa do espírito da Lei 11.441/07. Assim é, porque, tirante o IPVA, não há outro tributo estadual de interesse arrecadatório ao Estado, no ato em questão.

O recolhimento do ITCMD constitui, à evidência, pressuposto de admissibilidade para lavrar o ato notarial, ínsito ao inventário extrajudicial. Quanto ao IPVA, o próprio Estado reúne mecanismo no reconhecido sistema para exercer o controle do seu recolhimento, de captação anual do tributo, cuja inadimplência gera consequências automáticas, vedando o licenciamento, circulação, etc.

Diante desse painel, não vislumbro conduta passível de reprimenda funcional contra o Tabelião correcionado, mas reputo razoável, a exemplo do que sucede nos feitos judiciais, em respeito ao espírito da lei, que é conferir mais agilidade e reduzir os ônus, reconhecer desnecessária a exigência de prévia exibição da Certidão Negativa de Débitos de Tributos Estaduais na escritura pública de inventário lavrada nos termos da Lei 11.441/07.

Ressalvo, todavia, que a abrangência do tema, que desperta interesse no âmbito de todo o Estado, recomenda que a questão tratada nos autos seja examinada pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, a quem compete a disciplina normativa da matéria.

Por conseguinte, submeto a controvérsia à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, para a consideração que possa merecer, determinando a remessa dos presentes autos para essa finalidade. Dê-se, desde já, ciência à Associação dos Advogados de São Paulo, oficiando-se para conhecimento.

P.R.I.C. (D.J.E. de 15.06.2011)