1ª VRP|SP: Dúvida registral – Cessão de direitos com alienação fiduciária – Exigência de reconhecimento de firma – Aplicabilidade do §5º do art. 221 da LRP – Instrumento firmado com administradora de consórcios – Inexistência de operação de crédito imobiliário – Não se trata de instituição financeira nos moldes legais – Inaplicabilidade da exceção legal quanto à dispensa de reconhecimento de firmas – Sub-rogação de bem particular – Regime da comunhão parcial – Presunção legal de comunicabilidade de bens adquiridos na constância do casamento – Saldo devedor futuro não quitado – Impossibilidade de afastamento da presunção por mera declaração do cônjuge – Necessidade de decisão judicial específica (CPC, art. 725, II) – Dúvida procedente.

Sentença

Processo nº: 1069148-04.2025.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 6º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Suscitado: Carlos Eduardo Montagnini

Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo 6º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, a requerimento de Carlos Eduardo Montagnini, diante de negativa em se proceder ao registro de instrumento particular de cessão de direitos e obrigações com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia, envolvendo o imóvel objeto da matrícula n. 220.193 daquela serventia.

O Oficial informa que, por meio do referido instrumento, datado de 02.04.2025, os cedentes Benedikt Sebastian Frank e Andrea Cristina Taborda Peixoto Frank, com a anuência da credora fiduciária Bradesco Administradora de Consórcios Ltda., cedem e transferem a Carla Carolina Montagnini Chiaramelli, casada com Pedro Chiaramelli, e Carlos Eduardo Montagnini, casado com Regina Borges Montagnini, todos os direitos e obrigações decorrentes da alienação fiduciária registrada sob o n. 11 da matrícula n. 220.193 da serventia; que a cessão foi celebrada pelo valor de R$2.000.000,00, assumindo os cessionários, ainda, a responsabilidade pelo pagamento do saldo devedor remanescente de R$350.970,78, perante a credora fiduciária; que o título foi prenotado em 14.04.2025, sob n. 875.291, e devolvido em 23.04.2025, por meio de nota devolutiva; que o título foi reapresentado com novos documentos e em 13.05.2025, e devolvido por meio de segunda nota devolutiva com a manutenção das seguintes exigências: (i) necessidade de reconhecimento de firma das partes signatárias do instrumento particular, conforme artigo 221, inciso II, da Lei n. 6.015/73 e (ii) impossibilidade de reconhecimento, pelo Oficial, da cláusula de sub-rogação de bem particular da cessionária Carla Carolina Montagnini Chiaramelli, relativamente ao saldo devedor de R$ 350.970,78, a ser pago futuramente na constância de seu casamento com Pedro Chiaramelli.

O Oficial esclarece que o contrato foi firmado com uma administradora de consórcios e, embora os contratos de compra e venda de imóvel por meio de sistema de consórcio possam ser celebrados por instrumento particular (parágrafo único do artigo 45 da Lei n. 11.795/2008), as administradoras de consórcio não se enquadram, propriamente, como instituições financeiras ainda que sejam autorizadas e fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil e, para fins específicos, possam ser equiparadas a instituições financeiras (artigo 1º, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 7.492/1986); que, ademais, o consórcio não configura, tecnicamente, operação de crédito imobiliário; que, diante desse contexto, entende não ser aplicável, ao presente caso, a exceção prevista no § 5º do artigo 221 da Lei n. 6.015/73, motivo pelo qual mantém a exigência de reconhecimento de firma; que, com relação à segunda exigência, constou do contrato cláusula prevendo que Carla Carolina Montagnini Chiaramelli estaria adquirindo 80% do imóvel com recursos provenientes de antecipação de herança, com o objetivo de atribuir à aquisição a natureza de bem particular; que, após a primeira devolução, o título foi reapresentado instruído com instrumento particular de compromisso de compra e venda, cessão de direitos e transferência de responsabilidade e outras avenças, datado de 21/11/2024, em que consta declaração de que Carla adquiriu 80% do imóvel com recursos provenientes da venda do imóvel matriculado sob n. 130.173 do 3º RI, bem adquirido por ela antes do casamento, celebrado sob o regime da comunhão parcial de bens; que foi apresentada declaração firmada por seu cônjuge, Pedro Chiaramelli, datada de 25.04.2025, na qual afirma ter ciência de que a aquisição foi realizada exclusivamente com recursos particulares de sua esposa, oriundos de bem adquirido anteriormente ao casamento, bem como que a parte financiada será quitada exclusivamente pela cessionária com recursos próprios, depositados em sua conta particular desde 2007 e provenientes de seu trabalho pessoal; que, diante da anuência do cônjuge e da documentação apresentada, entende que restou comprovada a origem particular dos recursos empregados na aquisição da fração ideal no que se refere aos valores pretéritos já pagos diretamente aos cedentes; que, todavia, em relação ao saldo devedor remanescente de R$ 350.970,78, a ser quitado futuramente, entende não ser possível reconhecer a sub-rogação quanto a essa parcela, ainda que tenha sido apresentada declaração do cônjuge; que não é possível afastar, por simples declaração, a presunção legal de comunicabilidade das parcelas que serão satisfeitas durante o casamento, nos termos do regime da comunhão parcial de bens; que, em vista disso, no caso concreto, entende que a sub-rogação para alcançar a integralidade do valor financiado somente poderá ser reconhecida mediante procedimento judicial específico, nos termos do ordenamento jurídico vigente; que, portanto, os óbices devem ser mantidos (fls. 01/06).

Documentos vieram às fls. 07/87.

Em manifestação dirigida ao Oficial, a parte suscitada impugnou as exigências formuladas, aduzindo que, com o advento da Lei n. 14.620/23, qualquer contrato assinado com instituição financeira relacionado com crédito imobiliário não precisa contar com assinatura de duas testemunhas e nem reconhecimento de firmas, de modo que a exigência deve ser afastada; que tanto no título como no Instrumento Particular de Compromisso de Compra e Venda e Cessão de Direitos e Transferência de Responsabilidades de Obrigações e Outras Avenças de Imóvel ficou expressamente estipulado que 80% do imóvel seria adquirido por meio de recursos próprios da cessionária Carla Carolina Montagnini Chiaramelli, oriundos de uma antecipação de herança de seu genitor, e que, assim, não se comunica com o patrimônio de seu cônjuge; que mesmo em relação ao quinhão objeto de financiamento, a obrigação foi assumida pela cessionária Carla e que será quitada exclusivamente com recursos próprios, oriundos da venda de outro imóvel que adquiriu enquanto solteira, e, pois, não se comunica com seu cônjuge, conforme dispõe o artigo 1.659 do Código Civil: os bens adquiridos por sub-rogação aos bens já possuídos pelos cônjuges antes do casamento são tidos por bens particulares e, portanto, não se comunicam; que, nestes termos, as exigências devem ser afastadas, permitindo-se o registro do título (fls. 68/72). Juntou documentos (fls. 73/83).

O Ministério Público opinou pela manutenção dos óbices (fls. 92/93).

É o relatório.

Fundamento e Decido.

De proêmio, cumpre ressaltar que o Registrador dispõe de autonomia e independência no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (artigo 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

No mérito, a dúvida é procedente.

O dissenso envolve a registrabilidade do instrumento particular de cessão de direitos e obrigações com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia, datado de 02.04.2025, pelo qual os cedentes Benedikt Sebastian Frank e Andrea Cristina Taborda Peixoto Frank, tendo como outorgada credora fiduciária e anuente Bradesco Administradora de Consórcios Ltda., cedem e transferem a Carla Carolina Montagnini Chiaramelli, casada com Pedro Chiaramelli, e Carlos Eduardo Montagnini, casado com Regina Borges Montagnini, todos os direitos e obrigações decorrentes da alienação fiduciária em garantia registrada sob o n. 11 da matrícula n. 220.193 do 6º RI, sendo pactuada a cessão pelo valor de R$2.000.000,00, o saldo devedor remanescente de R$350.970,78, assumindo os cessionários a responsabilidade pelo seu pagamento.

No Direito Registral, vigem princípios e regras próprios, os quais orientam a prática dos atos de registro.

Dentre eles, está o princípio da legalidade estrita, segundo o qual somente se pode admitir o ingresso de título, seja para registro, seja para averbação, que atenda os ditames legais.

Assim, o primeiro requisito para a aceitação do acesso do título ao registro é a autorização legal. O artigo 221, da Lei n. 6.015/1973, preceitua que, para ingressar no registro imobiliário, o título deve assumir uma das seguintes formas:

“Art. 221 – Somente são admitidos registro:

I – escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

II – escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e pelas testemunhas, com as firmas reconhecidas; (Redação dada pela Lei nº 14.620, de 2023)

(…)

§ 5º. Os escritos particulares a que se refere o inciso II do caput deste artigo, quando relativos a atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública, dispensam as testemunhas e o reconhecimento de firma.” (Incluído pela Lei nº 14.620, de 2023)

A respeito, o item 108, Cap XX, das NSCGJ:

“108. Somente serão admitidos a registro:

a) escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros;

b) escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento de firma quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH); (…)”

Deste modo, a regra geral é que somente pode ser admitido o ingresso de escritos particulares autorizados em lei, que estejam assinados pelas partes e por testemunhas, com as assinaturas devidamente reconhecidas por um tabelião de notas, como claramente dispõe o artigo 221, inciso II, da Lei n. 6.015/1973.

No entanto, o §5º do referido artigo, incluído pela Lei nº 14.620/23, estabelece exceção: a dispensa do reconhecimento de firmas, antes restrita aos contratos celebrados no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), agora alargada para os escritos particulares, quando relativos a atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública.

A justificativa da exceção incluída pela Lei nº 14.620/23 seria o fato de as assinaturas apostas na presença de representante da instituição financeira, competindo à própria instituição as medidas necessárias para identificação das partes no contrato.

Cabe observar, quanto à dispensa do reconhecimento de firma, nos moldes do §5º do artigo 221, da LRP, que, embora a lei utilize a expressão “atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário (…)”, não basta que uma das partes seja uma entidade dessa natureza. É indispensável que a operação contratada também se refira a financiamento imobiliário. Há, portanto, um controle finalístico do enquadramento.

Não se pode perder de vista, como dito alhures, que a regra geral está disposta no inciso II do artigo 221, da Lei n. 6.015/1973: somente são admitidos registro de escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e por testemunhas, com as firmas reconhecidas.

Afinal, a exigência legal de reconhecimento de firma (art. 221, II, LRP) é corolário do princípio da segurança jurídica. Daí a importância do controle finalístico do enquadramento da efetiva operação imobiliária contratada pela instituição financeira (financiamento imobiliário) (art. 221, §5º, LRP), e não apenas as partes envolvidas na contratação. Do contrário, qualquer tipo de contrato celebrado por instituição financeira se beneficiaria indevidamente da nova disposição legal[1], desvirtuando a finalidade da norma, e encerrando desrespeito ao princípio da legalidade estrita e à segurança jurídica que alicerça e ilumina os Registros Públicos.

No caso sub judice, o instrumento particular de cessão foi firmado com uma administradora de consórcios, conforme item “1” do quadro resumo (fls.45) e cláusula especial n. 5, que assim prevê: “nos termos do artigo 5º, §5º da lei n. 11.795/2008, os bens e direitos adquiridos pela administradora em nome do grupo de consórcio, inclusive os decorrentes de garantia, bem como seus frutos e rendimentos, não se comunicam ao seu patrimônio (…)” (fls. 42).

Embora os contratos de compra e venda de imóvel por meio de sistema de consórcio possam ser celebrados por instrumento particular, tal como dispõe o parágrafo único do artigo 45 da Lei n. 11.795/2008, as administradoras de consórcio não se enquadram, propriamente, como instituições financeiras, ainda que desempenhem papel relevante no mercado imobiliário, sejam autorizadas e fiscalizadas pelo Banco Central do Brasil e, para fins específicos, possam ser equiparadas a instituições financeiras, nos termos do artigo 1º, parágrafo único, inciso I, da Lei n. 7.492/1986.

Para melhor compreensão, convém transcrever a definição de instituição financeira prevista no artigo 17 da Lei n. 4.595/64, in verbis:

“Art. 17. Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros.

Parágrafo único. Para os efeitos desta lei e da legislação em vigor, equiparam-se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou eventual.”

Segundo o artigo 2º, da Lei n. 11.795/2008, o consórcio é a reunião de pessoas naturais e jurídicas em grupo, com prazo de duração e número de cotas previamente determinados, promovida por administradora de consórcio, com a finalidade de propiciar a seus integrantes, de forma isonômica, a aquisição de bens ou serviços, por meio de autofinanciamento.

Na hipótese concreta, verifica-se do instrumento apresentado que, de fato, o cedente aderiu ao plano de consórcio administrado pela anuente credora fiduciária, mediante assinatura do contrato de adesão ao grupo de consórcio de bens imóveis, o qual foi incluído no grupo caracterizado pelas cotas especificadas na cláusula 2, o que lhe conferiu o direito de utilizar a carta de crédito mencionada no número 12 do anexo dos anexos do quadro resumo.

Consta, ainda, que o cedente utilizou o valor de sua carta de crédito para o pagamento da compra do imóvel da matrícula n. 220.193, do 6º RI, e que a aquisição do imóvel foi formalizada nos termos do instrumento particular firmado em 13.07.2016, e, em garantia do cumprimento das obrigações assumidas pelo cedente no “instrumento particular de constituição de alienação fiduciária em garantia e outras avenças”, a alienação fiduciária em favor da administradora de consórcio foi registrada sob o R.11/220.193 (fls. 24/25).

Sobre o tema, explica a doutrina de Melhim Namem Chalhub:

“Empregada com frequência em garantia de operações de financiamento para aquisição de bens imóveis ou móveis, no mercado financeiro ou autofinanciamento dos grupos de consórcio, e de operações de crédito para fins empresariais, a propriedade fiduciária não incrementa o patrimônio do credor/proprietário/fiduciário; o que o incrementa é o direito de crédito de que é titular, e não o direito de garantia, pois nessa espécie de operação – financiamento com garantia real – não há mutação subjetiva em relação ao bem. (…)

O contrato de participação em consórcio é negócio jurídico plurilateral de natureza associativa, cujo objeto é a constituição de fundo pecuniário destinado à aquisição de bens e serviços pelos consorciados, mediante autofinanciamento.(…)

Assim, a obrigação de cada consorciado consiste no aporte mensal de certa quantia correspondente a uma cota sobre o número de participantes do grupo, de modo a formar a cada mês o capital necessário à aquisição do bem ou do serviço que constitui o objeto daquele grupo. (…)

Aspecto especialmente relevante é a natureza mutualista que caracteriza a atividade do grupo de consórcio, no qual ressalta a prevalência do interesse da coletividade sobre o de cada consorciado, isoladamente considerado.

O recebimento e a administração dos recursos aportados pelos consorciados incumbem à sociedade administradora, à qual a lei atribui a gestão dos negócios do grupo e a defesa dos seus interesses, inclusive em juízo.

Uma vez contemplado, o consorciado adquirirá o bem e imediatamente o vinculará à satisfação do crédito do grupo, em regra mediante alienação fiduciária do bem em garantia em nome da administradora.”(Chalhub, Melhim Namem. Alienação fiduciária: negócio fiduciário. 7ª ed. Rio de Janeiro: Rorense: 2021, p. 231).

Neste contexto, infere-se que a situação em exame não envolveu, tecnicamente, operação de crédito imobiliário (financiamento imobiliário). Assim, reputo correta a posição assumida pelo Oficial, no sentido não ser aplicável, ao presente caso, a exceção prevista no §5º do artigo 221, da Lei n. 6.015/73, motivo pelo qual fica mantida a exigência para o reconhecimento de firma das assinaturas apostas no instrumento particular apresentado, com fundamento no inciso II do artigo 221, da Lei n. 6.015/73. Quanto ao segundo óbice apontado, de impossibilidade de reconhecimento, pelo Oficial ou nesta via administrativa, da cláusula de sub-rogação de bem particular da cessionária Carla Carolina Montagnini Chiaramelli, especificamente em relação ao saldo devedor remanescente de R$ 350.970,78, a ser pago futuramente na constância de seu casamento com Pedro Chiaramelli, também não comporta reparo.

A convenção sobre o regime de bens depende da escolha dos cônjuges a ser feita antes da celebração do casamento e pode revestir-se de uma das quatro formas legais, com disposições que melhor convier ao casal (art. 1639, CC). Se a opção dos nubentes for diferente do regime legal, a estipulação deverá ser feita, antes do casamento, por meio de pacto antenupcial, contrato solene (por escritura pública),no qual as partes definem as regras que irão vigorar quanto ao patrimônio, após a realização do casamento.

Na espécie, a certidão de casamento de Carla Carolina Montagnini Chiaramelli e Pedro Chiaramelli comprova que contraíram matrimônio no dia 09 de abril de 2.016, adotando o regime da comunhão parcial de bens (fls. 74).

No regime da comunhão parcial de bens, comunicam-se os bens adquiridos após a data da realização do casamento, excetuando-se as ressalvas legais:

“Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II – os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III – as obrigações anteriores ao casamento;

IV – as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V – os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;

VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII – as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.”

O Oficial esclareceu que, após a primeira devolução, o título reingressou acompanhado de novos documentos e que, diante da declaração de anuência do cônjuge e da documentação apresentada, restou comprovada a origem particular dos recursos empregados na aquisição da fração ideal no que se refere aos valores pretéritos já pagos diretamente aos cedentes. Contudo, em relação ao saldo devedor remanescente de R$ 350.970,78, que ainda será quitado futuramente durante a constância do matrimônio, não é possível reconhecer, na via administrativa, a que sub-rogação quanto a esta parcela (que ainda pende de quitação, portanto, um evento futuro que ainda não se consumou), ainda que tenha sido apresentada declaração do cônjuge afirmando que o valor será pago exclusivamente pela cessionária, com recursos próprios, depositados em sua conta particular e provenientes de seu trabalho pessoal.

A apresentação de simples declaração não é suficiente para afastar a presunção legal de comunicabilidade das parcelas que serão futuramente satisfeitas durante o casamento, nos termos do regime da comunhão parcial de bens.

Para afastar a presunção legal de comunicabilidade das parcelas futuras (diga-se: um evento futuro que ainda não se consumou), na égide do casamento contraído pelo regime da comunhão parcial de bens, de fato, a sub-rogação de bem particular da cessionária para alcançar a integralidade do saldo devedor remanescente de R$ 350.970,78 somente poderá ser reconhecida em procedimento de jurisdição voluntária específico, nos termos do artigo 725, inciso II, do Código de Processo Civil.

Diante do exposto, Julgo Procedente a dúvida suscitada, para manter os óbices registrários.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C.

São Paulo, 14 de julho de 2025.

Renata Lima Zanetta

Juíza de Direito

[1] Tribunais,2024.[https://proview.thomsonreuters.com/launchapp/title/rt/monografias/290750245/v3/page/RB-4.66]: “Se assim não fosse, qualquer tipo de contrato celebrado por instituição financeira se beneficiaria da disposição legal indevidamente (v.g., créditos pessoais, simples mútuo bancário, contrato de prestação de serviços de pintura ou mesmo de locação de um imóvel para inst o financiamento imobiliário).” PÁGINA: RB-4.66.

(DJEN de 14.07.2025 – SP)