TJ|RS: Agravo de Instrumento. Ação Indenizatória. Acidente de Trânsito. Averbação da Existência da Ação no Registro de Imóveis e junto ao Detran. Possibilidade.
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. AVERBAÇÃO DA EXISTÊNCIA DA AÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS E JUNTO AO DETRAN. POSSIBILIDADE. 1) Considerando que o pronunciamento judicial contém os fundamentos, ainda que sucintos, da convicção do juízo, em observância ao princípio da convencimento motivado, é de ser afastada a preliminar de nulidade do decisum. 2) A medida postulada, em sede de antecipação de tutela, para averbação da existência de ação indenizatória em Cartório de Imóveis e junto ao Detran tem cunho cautelar, uma vez que visa garantir o resultado útil do processo de conhecimento (garantia da higidez do patrimônio do réu para pagamento de valores relativos à eventual condenação na demanda indenizatória) e não antecipar os efeitos da tutela pretendida (recebimento imediato e efetivo de tais valores). Todavia, em nome do princípio da fungibilidade (art. 273, §7º, do CPC), possível o conhecimento da tutela cautelar postulada como antecipação de tutela. 3) A averbação da existência de ação indenizatória no Cartório de Registro de Imóveis e no Detran/RS é medida que não acarreta nenhum prejuízo ao proprietário. Ao contrário, é procedimento que visa prevenir quem eventualmente venha adquirir o bem do agravante, possibilitando que tenha ciência prévia e dimensão das conseqüências que daí poderão advir. Preliminares afastadas. Agravo de instrumento desprovido. (TJRS – Apelação Cível nº 70027322643 – Campina das Missões – 11ª Câm. Cível – Rel. Des. Voltaire de Lima Moraes – DJ 08.04.2009).
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em afastar as preliminares e negar provimento ao agravo de instrumento.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. ANTÔNIO MARIA RODRIGUES DE FREITAS ISERHARD E DES. LUIZ ROBERTO IMPERATORE DE ASSIS BRASIL.
Porto Alegre, 25 de março de 2009.
DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES – Relator.
RELATÓRIO
DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES (RELATOR)
Trata-se de agravo de instrumento interposto por OMAR STEINBRENNER contra decisão proferida nos autos da ação indenizatória que lhe move LARISSA TAIS LERMEN, JACÓ FRIDOLINO LERMEN, DENISE RAQUEL LERMEN, que deferiu a antecipação de tutela pleiteada pelos autores, no sentido de determinar o registro da existência do feito no Cartório do Registro de Imóveis de Porto Xavier/RS e no Detran/RS.
Em suas razões, alega a agravante a ausência de fundamentação da decisão recorrida. Sustenta que a decisão que determinou a averbação da existência de ação nos registros públicos do Detran/RS e do Cartório do Registro de Imóveis, com relação a todos os automóveis e imóveis da agravante é ilegal, uma vez que não há crédito constituído aos agravados para ser protegido. Aduz que o pedido formulado pelos agravados em antecipação de tutela diz respeito a provimento característico cautelar. Discorre sobre sua boa-fé. Postula o efeito suspensivo. Requer o provimento do recurso.
O recurso foi recebido no duplo efeito.
O prazo para oferecer contra-razões transcorreu in albis.
O parecer ministerial é pelo desprovimento do agravo.
É o relatório.
VOTOS
DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES (RELATOR)
Inicialmente, rejeito a preliminar de nulidade da decisão recorrida por ausência de fundamentação, uma vez que tal pronunciamento contém os fundamentos, ainda que sucintos, da convicção do juízo.
A respeito, Theotonio Negrão (in Código de Processo Civil, Saraiva, 29ª edição, p. 448) preleciona: “O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos (RJTJESP 115/207).”
Assim, não há que se falar em nulidade da decisão agravada por ausência de fundamentação, mormente considerando que o ordenamento jurídico pátrio adotou o princípio do livre convencimento motivado ou persuasão racional do Juiz, que restou devidamente observado no caso dos autos.
Por isso, rejeito a preliminar de nulidade da decisão recorrida.
No que diz com a adequação do meio processual adotado pelos agravantes para pleitear a averbação da existência de ação nos registros públicos de imóveis e automóveis (Detran/RS), tenho que deva ser levado em conta o princípio da fungibilidade recursal, princípio esse consagrado no diploma processual (art. 273, §7º) e amplamente reconhecido pela doutrina processual brasileira.
Com efeito, a medida postulada pelos autores em sede de antecipação de tutela tem cunho cautelar, uma vez que visa garantir o resultado útil do processo de conhecimento (garantia da higidez do patrimônio do réu para pagamento de valores relativos à eventual condenação na demanda indenizatória) e não antecipar os efeitos da tutela pretendida (recebimento imediato e efetivo de tais valores).
Todavia, em nome do princípio da fungibilidade, entendo viável o conhecimento de tal medida postulada no bojo do processo cognitivo com a nominação de antecipação de tutela, a teor dos ensinamentos de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (in Código de Processo Civil Comentado. São Paulo: RT, 2008. p.275/276), in verbis:
“Em uma interpretação literal pode ser dito que o art. 273, §7º, CPC, pretende somente viabilizar a concessão no bojo do processo de conhecimento da tutela cautelar que foi chamada de maneira inadequada de tutela antecipatória. Se a tutela foi batizada de antecipatória, mas a sua substância é cautelar, ela pode ser deferida dentro do processo de conhecimento, desde que haja dúvida fundada e razoável quanto à sua natureza.”
Assim, entendo possível o conhecimento da tutela cautelar postulada como antecipação de tutela.
No que diz com o comando judicial de expedição de ofício ao Cartório de Imóveis e ao Detran/RS, no sentido de determinar a averbação da existência de demanda judicial indenizatória, tenho que perfeitamente viável, uma vez que visa resguardar eventual terceiro de boa-fé que pretenda adquirir os bens da ré.
Até porque, não há qualquer violação ao direito de propriedade da requerida, tampouco tal medida impede a livre negociação dos bens. Ao contrário, ela visa garantir que os agravados possam vir a receber pagamento decorrente de eventual condenação na ação indenizatória, assim como resguardar os direitos de terceiros de boa-fé que pretendam adquirir tais bens.
Nessa linha, são os precedentes desta Corte:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CAUTELAR. POSSIBILIDADE DE AVERBAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE DEMANDA JUDICIAL JUNTO AO DETRAN COM A FINALIDADE DE DAR CIÊNCIA A TERCEIRO DE QUE O VEÍCULO POSSA SER OBJETO DE FORTUÍTA CONSTRIÇÃO JUDICIAL. AVERBAÇÃO QUE NÃO FERE O DIREITO DE PROPRIEDADE DO DEVEDOR E NEM IMPEDE A LIVRE NEGOCIAÇÃO DO BEM. NEGADO SEGUIMENTO AO AGRAVO. (Agravo de Instrumento Nº 70025240730, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Romeu Marques Ribeiro Filho, Julgado em 09/07/2008)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. INDENIZATÓRIA POR ACIDENTE DE TRÂNSITO. AVERBAÇÃO JUNTO AO DETRAN DA EXISTÊNCIA DA AÇÃO. Cabível o deferimento do pedido para que seja averbada a existência da ação indenizatória, junto ao DETRAN. Medida que objetiva dar ciência a terceiros, sem natureza restritiva. Lide já angularizada. Autor que foi atropelado pelo automóvel dos demandados, em madrugada de inverno. Acidente do qual resultou a morte de outro pedestre. Notícia de que o veículo envolvido no acidente é o único bem do recorrente. Agravo liminarmente provido. (Agravo de Instrumento Nº 70023308398, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Orlando Heemann Júnior, Julgado em 06/03/2008)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AVERBAÇÃO DA AÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO E NO DETRAN. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. É possível a averbação da existência da ação junto ao Detran e ao Registro de Imóveis, sem cunho restritivo, com o objetivo de informar a terceiros de boa-fé acerca da existência da ação, uma vez que os documentos acostados à exordial preenchem os requisitos do art. 273, do CPC. Agravo de instrumento provido. (Agravo de Instrumento Nº 70018619833, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vicente Barrôco de Vasconcellos, Julgado em 27/02/2007)
De outra banda, conforme bem salientou o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Reginaldo Maciel Franco, inviável a oferta de garantia real pela agravante, uma vez que os veículos oferecidos estão alienados fiduciariamente, não integrando, assim, a esfera patrimonial da recorrente.
Por tais razões, afasto as preliminares e nego provimento ao agravo.
É o voto.
DES. ANTÔNIO MARIA RODRIGUES DE FREITAS ISERHARD – De acordo.
DES. LUIZ ROBERTO IMPERATORE DE ASSIS BRASIL – De acordo.
DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES – Presidente – Agravo de Instrumento nº 70027322643, Comarca de Campina das Missões: “AFASTARAM AS PRELIMINARES E NEGARAM PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNÂNIME.”
Julgador(a) de 1º Grau: PAULO RENATO NICOLA CAPA.
Fonte: Boletim INR nº 4499 – Grupo Serac – São Paulo, 21 de Março de 2011.