CSM|SP: Registro de Imóveis – Transferência de bens imóveis de sociedade empresária a sócio – inaplicabilidade da regra excepcional de forma contida no art. 64 da lei n. 8.934/94 – necessidade de escritura pública – Recurso não provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO Nº 0039109-22.2011.8.26.0071, da Comarca de Bauru, em que é apelante MARTINO MONDELLI, e apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE BAURU.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.“, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, ALVES BEVILACQUA, SAMUEL JÚNIOR, SILVEIRA PAULILO E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 9 de maio de 2013.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n° 0039109-22.2011.8.26.0071

Apelante: Martino Mondelli

Apelado: 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Bauru

VOTO N° 21.144

REGISTRO DE IMÓVEIS – Transferência de bens imóveis de sociedade empresária a sócio – inaplicabilidade da regra excepcional de forma contida no art. 64 da lei n. 8.934/94 – necessidade de escritura pública – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta contra r. sentença que reconheceu impossibilidade do registro da transmissão da propriedade de bens imóveis de sociedade empresarial a sócio por meio de instrumento particular.

Sustentam os apelantes a possibilidade da transmissão da propriedade de imóvel de sociedade empresarial para sócio por instrumento particular com fundamento no art. 64 da lei n. 8.934/94 (a fls. 60/85).

O processo foi remetido pela Corregedoria Geral de Justiça a este colegiado (a fls. 142/144). Houve manifestação do apelante reiterando os fundamentos das razões recursais (a fls. 116/139).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (a fls. 111/113 e 152). Remetido à sessão de julgamento o processo foi retirado de pauta (a fls. 156).

O apelante requereu a suspensão do processo em razão do processamento de recuperação judicial da sociedade empresarial que lhe transmitira os bens móveis constantes do instrumento levado ao registro (a fls. 157/289 e 290/297).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça reiterou sua manifestação anterior (a fls. 300).

Houve o ingresso de terceiro interessado que requereu o julgamento do recurso (a fls. 302/327).

É o relatório.

O processamento de recuperação judicial não tem o condão de suspender o presente processo administrativo em virtude do art. 6º da Lei n. 11.101/05 somente se referir às ações de natureza jurisdicional. Além disso, o objeto desta dúvida trata apenas do registro do título particular apresentado sem qualquer efeito perante a recuperação judicial, eventuais questões correlatas deverão ser decididas, se o caso, na via jurisdicional adequada.

Nestes termos, indefiro a suspensão deste processo administrativo e passo ao seu julgamento.

A forma do contrato é o meio social por meio do qual as partes manifestam seu consentimento.

No Brasil adota-se o princípio da liberdade de forma, nos termos do art. 107 do Código Civil, assim, a forma pode ser livremente escolhida pelos contratantes, exceto no caso da lei impor forma específica, pena de nulidade (Código Civil, art. 166, inc. IV).

A transmissão de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta salários mínimos somente pode ser realizada por meio de contratos com forma pública, conforme disposto no art. 108 do Código Civil, o qual tem a seguinte redação:

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

De outra parte, em conformidade à regra de exceção contida na parte inicial do art. 108 do Código Civil, no caso da integralização de patrimônio de sociedade empresarial é dispensada a forma para pública para transferência da propriedade de bens imóveis em razão do disposto no art. 64, da lei n. 8.934/94, como segue:

Art. 64. A certidão dos atos de constituição e de alteração de sociedades mercantis, passada pelas juntas comerciais em que foram arquivados, será o documento hábil para a transferência, por transcrição no registro público competente, dos bens com que o subscritor tiver contribuído para a formação ou aumento do capital social.

Essa regra, de exceção, deve ser interpretada restritivamente por encerrar especificidade à regra geral de forma, portanto, cabe excluir a interpretação pretendida, porquanto o dispositivo legal em comento não permite que se faça a transferência de bens imóveis da sociedade aos sócios por meio de instrumento particular arquivado na junta comercial.

De outra parte, o entendimento jurisprudencial referido nas razões recursais encerra hipótese diversa da ora tratada, pois, no caso em julgamento não houve extinção da sociedade empresarial por meio de resilição voluntária bilateral.

Seja como for, ainda nessa hipótese pensamos não ser possível excepcionar a regra de direito em exame por força da diversidade de situação jurídica quanto à transmissão de bens imóveis à sociedade e desta aos sócios, aplicando-se a regra geral quanto à forma pública nesse último caso.

Há precedentes administrativos a respeito, conforme segue:

REGISTRO DE IMÓVEIS — Extinção de sociedade — Impossibilidade de transferência de bens imóveis por instrumento particular ante a falta da prova de valor inferior a trinta salários mínimos — não aplicação do disposto no art. 64 da Lei n. 8.934/94 para além da hipótese de transferência de bens dos sócios à sociedade — Recurso não provido (Ap. n. 0001644-10.2010.8.26.026, j. 28/07/2011, Rel. Des. Maurício Vidigal).

Registro de Imóveis — Dúvida julgada procedente — Negativa de acesso ao registro de instrumento particular de distrato social de pessoa jurídica, com transferência de bens imóveis da sociedade para os sócios — Inviável o registro à luz do disposto no art. 134, II, § 6º, do Código Civil de 1916 e no art. 108 do novo Código Civil — Indispensabilidade da transferência dos bens por intermédio de escritura pública — Não incidência, no caso, da norma do art. 64 da Lei n° 8.934/1994 — Recurso não provido (Ap. Civ. n. 491-6/1, j . 11/05/2006, Rel. Des. Gilberto Passos de Freitas).

Pelo exposto, nego provimento ao recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 26.06.2013 – SP)