CSM|SP: Registro de Imóveis – Dúvida – Recurso de Apelação – Impugnação parcial e juntada de documento a destempo para cumprir exigência – Circunstâncias que prejudicam o recurso – Exame, em tese, dos óbices controvertidos para nortear futuras prenotações – Instrumento particular de promessa de permuta – Possibilidade de registro desde que assim caracterizado – Inocorrência no caso em exame – Contrato com rótulo de instrumento particular de promessa de permuta, mas que representa desde logo o negócio definitivo – Inexistência de obrigação de as partes declararem vontade futura ou de celebrar o contrato definitivo – Recurso prejudicado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO N° 0008876-60.2011.8.26.0453, da Comarca de Pirajuí, em que é apelante VANGELIO MONDELLI NETO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE PIRAJUÍ.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “PREJUDICADA A DÚVIDA, NÃO CONHECERAM DO RECURSO, V.U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), GONZAGA FRANCESCHINI, ALVES BEVILACQUA, SAMUEL JÚNIOR, SILVEIRA PAULILO E TRISTÃO RIBEIRO.

São Paulo, 23 de maio de 2013.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n° 0008876-60.2011.8.26.0453

Apelante: Vangelio Mondelli Neto

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Pirajuí/SP

VOTO N° 21.175

REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Recurso de Apelação – Impugnação parcial e juntada de documento a destempo para cumprir exigência – Circunstâncias que prejudicam o recurso – Exame, em tese, dos óbices controvertidos para nortear futuras prenotações – Instrumento particular de promessa de permuta – Possibilidade de registro desde que assim caracterizado – Inocorrência no caso em exame – Contrato com rótulo de instrumento particular de promessa de permuta, mas que representa desde logo o negócio definitivo – Inexistência de obrigação de as partes declararem vontade futura ou de celebrar o contrato definitivo – Recurso prejudicado.

Trata-se de apelação interposta por Vangelio Mondelli Neto, objetivando a reforma da r sentença de fls. 43/45, que manteve a recusa do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Pirajuí referente ao instrumento particular de promessa de permuta de bens imóveis e outras avenças.

Alega o recorrente, em suma, admissibilidade do ingresso do título, conquanto não previsto no rol do art. 167, da Lei de Registros Públicos, haja vista que ao contrato em questão aplicam-se as regras referentes à compra e venda (fls. 58/77).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso, caso superada a preliminar de prejudicialidade da dúvida pela impugnação parcial (fls. 107/111).

O Apelante, em seguida, solicitou a retirada do presente recurso da pauta de julgamento – o que foi deferido – e, na mesma petição, trouxe novos argumentos e juntou documentos (fls. 149/423).

A Procuradoria Geral de Justiça reiterou o anterior parecer (fl. 425).

É o relatório.

Como bem frisou a ilustrada Procuradoria Geral de Justiça, o recurso deve ser julgado prejudicado.

Como reconheceu o próprio apelante às fls. 131, os motivos da recusa do registro pretendido foram: a) atipicidade do título; b) inexistência de personalidade jurídica do Espólio para figurar como contratante; c) descrição deficiente dos imóveis permutados; d) não apresentação de CCIR quitado, recibo de ITR atual, CND da Receita Federal e IBAMA; e) quitação das dívidas hipotecárias que oneram o imóvel ou anuência do credor; e f) ausência de georreferenciamento.

O apelante, contudo, impugnou apenas a exigência relativa a atipicidade do contrato. Foi assim na impugnação e nas razões de apelação (fls. 04/08 e 59/76). Apenas após tomar ciência do r. parecer da Procuradoria Geral de Justiça, que apontou para a prejudicialidade da dúvida em razão da impugnação parcial, e de solicitar a retirada de pauta de julgamento do seu recurso, o que foi deferido, o apelante, referindo-se às diversas exigências, afirmou:

…ousa-se discordar da r. sentença a quo já que a totalidade dos requisitos acima identificados podem ser especialmente atendidos pelo Apelante, não havendo que se falar em aceitação tácita de um ou outro requisito eventualmente descumprido, já que nada impede, v.g., que seja exarada uma determinação condicionante ao cumprimento de todos os requisitos, caso seja entendido que o título pode absolutamente ser objeto de acesso ao fólio real, o que se sustenta nestes autos.

A despeito do esforço do apelante, fato é que a jurisprudência deste C. Conselho Superior é tranquila no sentido da impossibilidade de se prolatar decisão condicionamente no casos de impugnação parcial:

A posição do Egrégio Conselho Superior da Magistratura, como bem ressaltado pelo digno Procurador de Justiça, é tranqüila no sentido de se ter como prejudicada a dúvida, em casos como o que se examina, em que admitida como correta uma das exigências, não sendo a outra cumprida, posto que permanece a impossibilidade de acesso do título ao fólio. Nesse sentido os julgados das Apelações Cíveis números 54.073-0/3, 60.046-0/9, 61.845-0/2 e 35.020-0/2. Posicionar-se de maneira diversa importaria admitir uma decisão condicional pois, somente se atendida efetivamente a exigência tida como correta é que a decisão proferida na dúvida, eventualmente afastando o óbice discutido, é que seria possível o registro do título. A discussão parcial dos óbices, por outro lado, sem cumprimento daqueles admitidos como corretos, possibilitaria a prorrogação indevida do prazo de prenotação, com conseqüências nos efeitos jurídicos desta decorrentes, tal como alteração do prazo para cumprimento das exigências ou a prorrogação da prioridade do título em relação a outro a ele contraditório ” (Apelação Cível n° 93.875-0/8).

Observe-se, ainda, que o apelante somente apresentou impugnação a todos os óbices impostos após tomar ciência do r. parecer do ilustrada Procuradoria Geral de Justiça, o que, no entanto, não tem o condão de sanear a prejudicialidade ocorrida em primeiro grau, notadamente em virtude da preclusão consumativa. Mas não é só. No intuito de, tardiamente, impugnar e discorrer sobre as exigências, o apelante terminou concordando com algumas e até juntou documentos para demonstrar o atendimento.

Em relação à não apresentação de CCIR quitado, recibo de ITR atual, CND da Receita Federal e IBAMA, disse que “já foram providenciados pelo Apelante, constando no anexo”. Quanto à quitação de dívidas hipotecárias, “Referidas quitações já existem e estão anexas à presente”. Por fim, quanto ao georreferenciamento, asseverou: “Todos os trabalhos técnicos já foram iniciados no INCRA, sendo que a PROPRIEDADE JÁ RECEBEU A CERTIFICAÇÃO do MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO, possuindo o n. 081206000058-30, conforme se observa do documento anexo” (fl. 146).

A juntada de documentos no curso da dúvida – ou de seu recurso – para cumprir exigências feitas pelo Oficial de Registro de Imóveis também a prejudica, conforme pacífica jurisprudência deste Conselho:

“A dúvida registrária não se presta para o exame parcial das exigências formuladas e não comporta o atendimento de exigência depois de sua suscitação, pois a qualificação do título é feita, integralmente, no momento em que é apresentado para registro. Admitir o atendimento de exigência no curso do procedimento da dúvida teria como efeito a indevida prorrogação do prazo de validade da prenotação e, em conseqüência, impossibilitaria o registro de eventuais outros títulos representativos de direitos reais contraditórios que forem apresentados no mesmo período. Em razão disso, a aquiescência do apelante com uma das exigências formuladas prejudica a apreciação das demais matérias que se tornaram controvertidas. Neste sentido decidiu este Colendo Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível n° 60.460-0/8, da Comarca de Santos, em que foi relator o Desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição, e na Apelação Cível n° 81.685-0/8, da Comarca de Batatais, em que foi relator o Desembargador Luís de Macedo” (Apelação Cível n° 220.6/6-00, grifou-se).

Por todas essas razões é que o recurso não pode ser conhecido porque prejudicada a dúvida.

Nada impede, no entanto, o exame – em tese – da exigência impugnada a fim de orientar futuras prenotações.

Este Conselho Superior da Magistratura, por mais de uma vez, já se pronunciou no sentido da possibilidade do registro da promessa de permuta dada a sua similitude à promessa de compra e venda, cujo registro é admitido expressamente pelo art. 167, da Lei n° 6.015/73:

Porque, a rigor, a promessa de permuta constituiria duas promessas recíprocas e simultâneas de venda, mesmo paralelo existente entre a permuta em si e o contrato definitivo de venda e compra (v.g. Valmir Pontes, Registro de Imóveis, Saraiva, 1982, p. 91), seu registro não seria, por isso, impossível. Aliás, isto já decidiu o Conselho Superior, com lastro em numerosa doutrina citada, nacional e estrangeira (v. Apelação n. 37.727-0/3, Comarca de Itu), reconhecendo que o contrato de promessa de permuta é apto a induzir efeitos reais, quando registrado, o que, inclusive, foi objeto de exigência, em aresto da Suprema Corte (RE 89.501-9-RJ), para deferimento de adjudicação compulsória, destarte com aplicação, à espécie, justamente do regramento da promessa de compra e venda. O problema, no caso, é outro, de resto o mesmo que se enfrentou no acórdão do Conselho, acima citado, E que, malgrado nominado como de promessa de permuta, o ajuste em tela consubstanciou, verdadeiramente, um negócio definitivo. A propósito, basta verificar que, em momento algum, as partes, pelo instrumento juntado, se obrigaram a declarar vontade, característica básica do contrato preliminar.(Ap. Cível n° 0101195-0/5, Rel. Des. Luiz Tâmbara).

No caso em exame, no entanto, assim como no precedente supra, embora se tenha dado o nome de promessa de permuta ao instrumento particular, está-se diante de avença definitiva de extinção de condomínio.

A análise do contrato de fls. 13/26 mostra que o intuito dos contratantes é extinguir e partilhar o patrimônio comum que, não por acaso, foi denominado de “CONDOMÍNIO” ao longo do contrato.

Pretende-se, assim, em caráter já definitivo, dividir o patrimônio comum existente a fim de se atribuir a propriedade exclusiva de determinados bens às pessoas ali indicadas, o que não se confunde com a troca que, como se sabe, é o negócio jurídico por meio do qual os contratantes se obrigam a prestar uma coisa por outra diversa de dinheiro; a alienação de uma coisa por outra.

No caso, inexiste a alienação de uma coisa por outra, mas apenas a partilha delas (aí inseridos diversos imóveis) entre os atuais condôminos. Não há que se falar, por conseguinte, em troca, mas em extinção do condomínio.

Além disso, como bem frisado pela ilustrada Procuradoria Geral da Justiça, em momento algum os contratantes se obrigam a declarar vontade futura ou celebrar outro contrato, características básicas do contrato preliminar. Frise-se, neste ponto, que as obrigações futuras a que se obrigam as partes (apresentação de certidões de matrícula, de ações distribuídas, negativas de débito, do formal de partilha e a realização de geo-referenciamento em alguns imóveis) não podem ser confundidas com a obrigação de declaração definitiva de vontade, de modo que não têm o condão de retirar do contrato ora em exame a sua natureza de contrato definitivo.

Ainda sobre as diferenças entre o contrato preliminar e o definitivo, o Conselho Superior da Magistratura, nos autos da apelação cível n° 37.727-0/3, relatada pelo então Corregedor Geral da Justiça Márcio Bonilha, ressalvou que:

Sabido que a natureza e o tipo do contrato fixam-se por seu conteúdo e não pela denominação, ou rótulo, que lhes deram as partes contratantes. Conceitua-se o contrato preliminar como aquele por via do qual ambas as partes se comprometem a celebrar mais tarde outro contrato, que será o contrato principal. Diferencia-se do contrato principal pelo objeto, que no preliminar é a obrigação de concluir outro contrato, enquanto que o do definitivo é uma prestação substancial (Francesco Messineo, Dottrina Generale Del Contrato, pág. 207). (Ap. Cível n° 37.727-0/3, rel. Des. Márcio Bonilha)

No caso em exame, a avença, além de não ter natureza jurídica de promessa de permuta, é definitiva. Indispensável, portanto, o uso da escritura pública, na forma do art. 108, do Código Civil, sem a qual o registro é inviável.

Não há óbice na participação do Espólio no contrato porque, de acordo com os documentos recém apresentados pelo apelante – aos quais o Oficial de Registro de Imóveis não teve acesso – o MM. Juízo da 2ª Vara da Família e das Sucessões de Bauru expediu alvará autorizando que o Espólio, representado por Vangelio Mondelli, venda, ceda, transfira, permute, dê em pagamento, ofereça em garantia real ou aliene fiduciariamente o imóvel objeto das matrículas n°s 11.381 e 4.977.

Por fim, os fatos relativos à recuperação judicial e à execução em curso, trazidos só agora pelo apelante, em nada interferem na qualificação registral. Assim, não há espaço para qualquer discussão sobre referidas ações nestes autos, cujo escopo é, frise-se, apenas examinar a pertinência da recusa do registro, para mantê-la ou rechaçá-la.

Ante o exposto, prejudicada a dúvida, não conheço do recurso.

JOSÉ RENATO NALINI

Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 26.06.2013 – SP)