1ª VRP|SP: Dúvida. Escritura Pública. Serviço Notarial e Registral que figura no título como credor hipotecário. Ausência de personalidade jurídica. Dúvida procedente.
Processo nº. 0047209.10.2010.8.26-0100
CP. 480
Dúvida
Quarto Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo
VISTOS.
Cuida-se de dúvida suscitada pelo 4º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, que recusou o registro da escritura pública de dação em hipoteca por meio da qual o suscitado, em cumprimento ao disposto no art. 11, da Lei Estadual do Rio de Janeiro nº 2.891/98, ofereceu em hipoteca a Mônica Moreira de Bivar, titular do 1º Ofício de São João da Barra, RJ, o imóvel objeto da matrícula nº 164.802, daquela Circunscrição Imobiliária.
Segundo a Oficial, o título foi recusado por não estarem presentes os elementos caracterizadores da hipoteca, mormente em razão da natureza da obrigação e da posição da credora.
Aduz, por fim, que o título poderia ser sanado mediante a indicação do Estado do Rio de Janeiro como credor da garantia hipotecária e que não se oporia ao registro se apresentado o aceite da E. Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
A dúvida foi impugnada às fls. 21/34 e o Ministério Público opinou pela procedência (fls. 52/55).
É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO.
O Serviço Notarial e Registral do 1º Ofício de Justiça da Comarca de São João da Barra, no Rio de Janeiro, não é dotado de personalidade jurídica que lhe permita adquirir direitos reais de garantia. Em sendo assim, não pode figurar como credor hipotecário do título recusado. Com razão, neste ponto, a Oficial.
O contrato de hipoteca instrumentalizado na escritura recusada foi celebrado entre José Otávio dos Santos (devedor hipotecante) e o Serviço Notarial e Registral do 1º Ofício de Justiça da Comarca de São João da Barra (credor hipotecário), representado por sua delegada titular, Mônica Moreira de Bivar.
Nele consta que o devedor hipotecante, titular de domínio, dá em hipoteca o imóvel objeto da matrícula nº 164802, do 4º Registro de Imóveis, em favor do credor hipotecário a fim de garantir as perdas e danos que vierem a ser judicialmente carreadas ao credor hipotecário, por atos de ofício de sua titular, até o limite de R$ 300.000,00; e que a hipoteca se destina a cobrir indenizações a terceiros prejudicados e em garantia do exercício profissional da notária/registradora (cláusulas 1, 2, 3 e 4 – fls. 13/13v). Em seguida, estipula as hipóteses de cobertura, exclusão, execução e extinção.
A hipoteca foi firmada em obediência ao art. 11, da Lei Estadual do Rio de Janeiro nº 2.891/98: “No prazo de 30 (trinta) dias contados da publicação do ato a que se refere o artigo nono da presente Lei, o delegado notário e/ou o registrador prestará caução real ou fiduciária mínima equivalente a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) para o exercício de suas atividades, sob pena de ficar sem efeito a delegação e reabrir-se aos que lhe seguirem, na ordem de classificação no concurso, a oportunidade de escolha prevista no parágrafo 1º do artigo décimo acima. § 1º – A caução poderá ser prestada em apólice de seguro de responsabilidade, renovável a cada ano, de acordo com as normas regulamentares da Corregedoria Geral da Justiça. § 2º – A caução, de que trata o “caput” deste artigo, responderá, precipuamente, pelo ressarcimento de danos eventualmente causados pelos notários ou registrador ou por seus prepostos nos termos do art. 22, da Lei Federal nº 8.935/94”.
Malgrado aparentemente não se preste à finalidade anunciada, haja vista que o Estado deveria figurar como credor hipotecário e não o cartório ou seu delegada, esse exame deve ficar a critério da E. Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro.
Observe-se, neste ponto, não haver qualquer abuso ou arbítrio na qualificação da Oficial, porque feita com base em precedente do E. Conselho Superior da Magistratura que lhe autorizava examinar a natureza jurídica do negócio jurídico celebrado (Ap. 480-6/1). E, de acordo com seu prudente critério, devidamente fundamentado, resolveu suscitar dúvida porque o contrato, da forma como redigida, realmente gera incerteza em relação à sua real natureza – de seguro ou de hipoteca – o que, porém, somente poderá ser dirimido por seu destinatário que é o E. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Por fim, observe-se que, como muito bem ponderou, mais uma vez, o Ministério Público, nem mesmo a anuência da E. Corregedoria Geral da Justiça do Rio de Janeiro seria capaz de superar o óbice porque a Unidade de Serviço não tem personalidade jurídica para figurar como titular de direito real de garantia.
Posto isso, julgo procedente a dúvida suscitada pelo 4º Oficial de Registro de Imóveis a requerimento de Jose Otávio dos Santos Pinto. Oportunamente, cumpra-se o disposto no artigo 203, I, da Lei nº 6.015/73. Nada sendo requerido no prazo legal, ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 19 de janeiro de 2011.
Gustavo Henrique Bretas Marzagão. Juiz de Direito.