1ª VRP|SP: Dúvida. Escritura Pública. Dados qualificativos. Exigência da apresentação da Certidão de Casamento. Princípio da Continuidade. Regra que se afasta em caso excepcional com autorização do juízo corregedor competente. Casal que figura no título casou-se em 1928, na cidade de Pinsk, Polônia, que, como é cediço, foi devastada durante a 2ª Guerra Mundial, o que impossibilita a apresentação da certidão de casamento nos moldes exigidos pelo Oficial porque a via original simplesmente não mais existe. Situação excepcional. Dúvida improcedente.

Processo 0026584-52.2010.8.26.0100 (100.10.026584-6)

CP. 298

Dúvida

Registro de Imóveis

5º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VISTOS.

Cuida-se de dúvida inversa suscitada por IDA APOR, que se insurge contra a recusa do 5º Oficial de Registro de Imóveis em registrar no imóvel transcrito sob o n. 39.617 os formais de partilha dos inventários de Jejna Josif Juziuk e de Sora Masza Jusiuk. Aduz, em suma, ser impossível apresentar a cópia autenticada da certidão de casamento entre Jejna e Sora, traduzida e registrada no Registro de Títulos e Documentos, porque o casamento ocorreu em 1928, em Pinsk, Polônia, cidade que foi devastada pela 2ª Guerra Mundial, de modo que a via original do documento exigido não existe. Informações do 5º Oficial de Registro de Imóveis às fls. 230/233.

O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls. 236/237).

É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO.

Observe-se, de início, consoante reiterado posicionamento do E. Conselho Superior da Magistratura, que a origem judicial do título não o isenta de qualificação. Nesse sentido: “Apesar de se tratar de título judicial, está ele sujeito à qualificação registrária. O fato de tratar-se o título de mandado judicial não o torna imune à qualificação registrária, sob o estrito ângulo da regularidade formal, o exame da legalidade não promove incursão sobre o mérito da decisão judicial, mas à apreciação das formalidades extrínsecas da ordem e à conexão de seus dados com o registro e a sua formalização instrumental”. O Egrégio Conselho Superior da Magistratura tem decidido, inclusive, que a qualificação negativa não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação cível n.413-6/7).

Quanto à dúvida propriamente dita, destaque-se, por primeiro, o acerto do Oficial em sublinhar que a partilha do inventário de Jejna não tem objeto, haja vista que o imóvel em questão, transcrito sob o n. 39.617, já havia sido partilhado, em sua integralidade, nos autos do inventário dos bens deixados pelo falecimento de Sora.

A exigência do Oficial consistente na apresentação da certidão de casamento de Jejna e Sora encontra amparo na lei e na jurisprudência. Jejna está qualificado apenas como “casado” no registro de imóveis, sem qualquer menção aos dados qualificativos de sua esposa e o regime de bens adotados.

Nesse caso, exige-se a prévia averbação da certidão de casamento do titular de domínio para que se possa observar a continuidade registral. Nesse sentido, o trecho do v. Acórdão proferido nos autos da Apelação nº 44.562-0/6, pelo E. Conselho Superior da Magistratura, lembrado pelo Oficial às fls. 232: “O princípio da continuidade registrária impõe um perfeito encadeamento de titularidades, na medida em que somente será possível a inscrição de um direito se o outorgante aparecer no registro em momento imediatamente anterior. Desta forma, o inconformismo não se sustenta, porque é induvidoso que a averbação do casamento e do óbito é indispensável ao registro da transmissão feita por quem comparece apenas como casado, sem qualquer outra qualificação. E isso porque o matrimônio e o óbito representam fatos jurídicos de evidentes repercussões patrimoniais, condicionadas à atuação dos Registros Públicos, e cuja exterioridade é do interesse de todos.

Insustentáveis os argumentos contidos nas truncadas razões recursais, que do item 6 de fls. 62 salta para o item 11 de fls. 63, no sentido de que deva ser prestigiada a ordem judicial do título e da dificuldade ou impossibilidade na localização pessoal dos titulares de domínio. A prévia averbação da circunstância é a medida que se impõe, mediante a apresentação de documentos hábeis, relembrando-se que, consoante tranquila orientação deste Colendo Conselho Superior da Magistratura, também os títulos judiciais submetem-se à qualificação do oficial registrador, principalmente para a verificação de sua conformidade com os postulados registrários (Apelações Cíveis nºs 15.028-0/7, da Comarca de Praia Grande, 20.745-0/6, da Comarca de Itu, e 22.417-0/4, da Comarca de Piracaia)”.

A despeito de a apresentação da certidão de casamento de Jejna e Sora ser de rigor, a peculiaridade do caso permite a sua excepcional dispensa. Colhe-se dos documentos dos autos, mormente o de fls. 135, que Jejna e Sora casaram-se em 1928, na cidade de Pinsk, Polônia, que, como é cediço, foi devastada durante a 2ª Guerra Mundial, o que impossibilita a apresentação da certidão de casamento do casal nos moldes exigidos pelo Oficial porque a via original simplesmente não existe mais.

Em caso de impossibilidade absoluta de cumprimento da exigência, desde que não haja risco de prejuízo a terceiro e existam documentos hábeis a comprovar a informação exigida pelo Oficial, é possível ao juízo corregedor permanente, na forma do art. 198, da Lei nº 6.015/73, dispensá-la e autorizar o registro do título.

E essa é a hipótese ora em exame.

A interessada não tem como apresentar cópia autenticada traduzida e registrada no Registro de Títulos e Documentos da certidão de casamento de Jojna e Sora porque a original não existe mais. Contudo, a interessada juntou às fls. 135 cópia da tradução juramentada de referida certidão que, somada aos demais documentos dos autos, como as certidões de óbito de Jejna e de Sora, nas quais constam que eram casados (fls. 154 e 175) e os formais de partilha que tramitaram junto a 10ª e 12ª Varas da Família, permite que se afirme, com a segurança necessária para fins de registro, que Jejna e Sora casaram-se desde 21.02.1928, data anterior à da aquisição do imóvel.

Assim, não havendo dúvidas de que Jejna era casado com Sora quando adquiriu o imóvel transcrito sob o nº 39.617, no 5º Registro de Imóveis, a exigência deve ser superada para: a) averbação dos dados qualificativos de Sora, esposa de Jejna; e b) registro do formal de partilha de Sora. Neste sentido, o r parecer do Ministério Público (fls. 236/237).

Posto isso, julgo improcedente a dúvida inversa suscitada por IDA APOR para determinar, na matrícula a ser descerrada no lugar da transcrição nº 39.617, do 5º Registro de Imóveis, a averbação dos dados qualificativos de Sora Masza Jusiuk, esposa de Jejna Josif Juziuk, e o registro do formal de partilha dos bens de Sora Masza Jusiuk.

Para os fins do art. 203, II, da Lei nº 6015/73, servirá esta de mandado, nos termos da Portaria Conjunta nº 01/08, da 1ª e 2ª Varas de Registros Públicos da Capital. Nada sendo requerido no prazo legal, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 31 de janeiro de 2011.

Gustavo Henrique Bretas Marzagão, Juiz de Direito.