CSM|SP: Direito Registral – Adjudicação compulsória extrajudicial – Impugnação da proprietária (CDHU) – Empreendimento habitacional inserido em área maior, sem instituição de condomínio e em processo de regularização fundiária – Impugnação fundada – Via administrativa inviável – Remessa às vias ordinárias – Extinção do procedimento e cancelamento da prenotação – Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1073459-38.2025.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes MARIA ADINERES CHAVES DOS SANTOS BORGES e IVAN DA SILVA BORGES, são apelados COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO e 11º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento à apelação, com determinação, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 27 de agosto de 2025.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1073459-38.2025.8.26.0100

Apelantes: Maria Adineres Chaves dos Santos Borges e Ivan da Silva Borges

Apelados: Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo e 11º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Capital

VOTO Nº 43.883

Direito registral – Compromisso de venda e compra – Negado seguimento à adjudicação compulsória requerida na via extrajudicial – Acolhimento da impugnação oposta pela proprietária – Apelo desprovido.

I. Caso em Exame.

1. Apelação interposta contra sentença que manteve a recusa do Oficial em dar regular seguimento ao processo de adjudicação compulsória extrajudicial. 2. Os apelantes, promitentes compradores do imóvel não matriculado, alegam que a impugnação da proprietária, promitente vendedora, não se sustenta; pedem, assim, sua rejeição. 3. O imóvel objeto da adjudicação se encontra matriculado em área maior, parcelada irregularmente. 4. Foi construído conjunto habitacional, sem, porém, a instituição de condomínio edilício, o que impede a adjudicação de unidade autônoma.

II. Questão em Discussão.

3. A controvérsia diz respeito à eficácia inibitória da impugnação, de sua força para obstar o prosseguimento do processo de adjudicação compulsória extrajudicial.

III. Razões de Decidir.

4. A impugnação oposta, versando sobre a necessidade de regularização do referido empreendimento, que se encontra em fase de complementação do projeto de parcelamento do solo, com o objetivo de incluir as áreas atualmente ocupadas, visando posterior encaminhamento para regularização fundiária do Conjunto Habitacional no qual está inserido o imóvel objeto da controvérsia, qualifica-se como fundada e é, nessa senda, obstativa da via extrajudicial; remete o dissenso às vias ordinárias; a controvérsia, assim, deve ser solucionada por meio de processo contencioso.

IV. Dispositivo.

5. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: “1. A impugnação fundada impede o seguimento do processo de adjudicação compulsória extrajudicial. 2. Questões de mérito da impugnação devem ser resolvidas na via judicial, em processo contencioso”.

Legislação citada:

Lei nº 6.015/73, art. 216-B, caput e § 1.º, IV; Provimento nº 149/2023 da Corregedoria Nacional de Justiça, arts. 440 AB; NSCGJ, t. II, item 471 do Cap. XX.

Jurisprudência citada:

CSM/SP, Apelação Cível nº 1001782-45.2025.8.26.0100, rel. Des. Francisco Loureiro, j. 05/05/2025.

Trata-se de recurso de apelação (fls. 135/149), interposto por MARIA ADINERES CHAVES SANTOS BORGES e IVAN DA SILVA BORGES, contra a r. sentença proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente do 11º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo (fls. 110/114), que julgou procedente a dúvida suscitada e manteve a recusa ao registro do requerimento de adjudicação compulsória extrajudicial, eis que acolhida a impugnação apresentada pela titular do domínio (fls. 21/28).

A r. sentença manteve a recusa do registro do título extrajudicial porque: (i) a impugnação apresentada veiculou matéria intrínseca às obrigações contratuais assumidas pelas partes no contrato de compromisso de compra e venda e eventual impossibilidade de cumprimento da obrigação de transmissão da propriedade aos cessionários, mesmo após a quitação do financiamento; (ii) as alegações são relevantes e, acaso comprovadas, podem acarretar eventual julgamento negativo ao requerimento de adjudicação compulsória, restando configurado conflito em relação ao direito material perseguido; (iii) impossibilitada, portanto, a análise da questão pelo Juízo administrativo, deve ser, então, remetida às vias ordinárias em que há contraditório e ampla defesa, com a possibilidade de dilação probatória.

Os embargos de declaração opostos à r. sentença (fls. 123/131) foram rejeitados pela decisão de fl. 132.

Em seu recurso, os apelantes afirmam que o Oficial e a Corregedoria Permanente não podem se valer de critérios subjetivos para obstar a aplicação da adjudicação compulsória extrajudicial. Dizem que juntaram toda a documentação necessária para o provimento de seu requerimento, ressaltando que não houve impugnação específica quanto a ele. Insistem que o imóvel objeto do compromisso de venda e compra de fls. 34/57 (firmado em 1993) foi quitado em 2015, conforme termo de fls. 58/60, emitido pela própria CDHU e que, até o momento, não lograram dela obter a outorga da escritura.

Pedem a reforma da sentença e, alternativamente, que o recurso seja encaminhado à Corregedoria Nacional de Justiça ou ao próprio C.N.J. “a fim de especificar de forma objetiva em que casos a IMPUGNAÇÃO é fundamentada e deve ser aceita pelo CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS e também as CORREGEDORIAS PERMANENTES – já que restou notória na presente ‘suscitação de dúvida’ que os critérios são subjetivos, protelatórios e sem qualquer fundamentação legal, restando notória a necessidade de unificar os procedimentos de adjudicação compulsória extrajudicial em razão dos prejuízos materiais e dores morais dos ADJUDICANTES que buscam esse tipo de ADJUDICAÇÃO nos Cartórios de Registros de IMÓVEIS”.

A impugnante, ao apresentar suas contrarrazões, reiterou as razões de impugnação apresentadas no procedimento extrajudicial, aguardando, em suma, o desprovimento do recurso (fls. 153/155).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 176/177).

É o relatório.

Os interessados, ora recorrentes, MARIA ADINERES CHAVES SANTOS BORGES e IVAN DA SILVA BORGES pediram, na via extrajudicial, com fundamento no art. 216-B da Lei nº 6.015/1973, e nos arts. 440-A e seguintes do Provimento nº 149/2023 da Corregedoria Nacional de Justiça, exibindo os documentos exigidos, a adjudicação compulsória do apartamento nº 2-A do Bloco 11, integrante do Conjunto Habitacional Jardim São Luiz, inserido na área maior que se acha registrada pela Matrícula de nº 364.397 daquela serventia, sob a titularidade dominial da COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO HABITACIONAL E URBANO DO ESTADO DE SÃO PAULO CDHU (fls. 09/14), que, contudo, a impugnou.

Em sua impugnação, a proprietária, promitente vendedora, esclareceu que o empreendimento do qual faz parte integrante o imóvel objeto deste pedido foi classificado como habitação de interesse social, para atender a política pública habitacional do Governo do Estado de São Paulo, e que, após sua edificação, iniciou-se sua regularização.

Todavia, sustentou que se trata de regularização fundiária complexa, que depende da atuação de vários órgãos, esclarecendo que “atualmente, o processo de regularização do referido empreendimento se encontra em fase de complementação do projeto de parcelamento do solo, com o objetivo de incluir as áreas atualmente ocupadas“.

Disse que, após a referida complementação, o processo será encaminhado para regularização fundiária do Conjunto Habitacional Campo Limpo B, junto à Secretaria Municipal de Habitação de São Paulo (SEHAB/PMSP), para obtenção da Certidão de Regularização Fundiária (CRF) e, subsequentemente, o registro da respectiva REURB.

Conclui, então, que não é possível, no momento, proceder com a transferência definitiva da unidade aos impugnados e que, “após a regularização, a CDHU emitirá o Instrumento de quitação com força de escritura definitiva em nome dos mutuários, ora notificantes”.

Ou seja, a proprietária, promitente vendedora, impugna, de forma articulada e fundamentada, a obrigação de outorgar a escritura definitiva do imóvel porque a regularização do empreendimento em que se situa ainda não se efetuou.

Dentro desse contexto, o acolhimento da impugnação era, e é, inarredável.

As questões suscitadas pela impugnante, proprietária do imóvel, não comportam resolução na seara administrativa, exigindo solução na via jurisdicional, por meio de processo contencioso, daí a remessa do dissenso às vias ordinárias.

Enfim, ao negar seguimento ao processamento do pedido, o Oficial (primeiro) e o Juízo Corregedor Permanente (depois) acertaram.

A impugnação é fundada, detalha as razões da oposição manifestada e não trata de matéria estranha à adjudicação compulsória, na medida em que é relacionada ao dever de outorga da escritura de venda e compra, logo, ao cumprimento de obrigação resultante do compromisso de venda e compra.

Ademais, não se subsume a qualquer uma das situações tratadas no art. 440-AB do Provimento nº 149/2023 da E. Corregedoria Nacional de Justiça.

Frise-se, por oportuno, que o registro da incorporação e especificação de condomínio do Conjunto Habitacional “Jardim São Luiz IB (Campo Limpo B)” não consta da matrícula do imóvel (matrícula nº 364.397, fls. 09/14).

In casu, a r. sentença atacada encontra amparo normativo no item 471 do Cap. XX das NSCGJ, t. II, de acordo com o qual o pedido de adjudicação compulsória será indeferido, caso fundada a impugnação.

Não é dado ao Oficial de Registro nem mesmo, no âmbito de processo administrativo, ou ao MM. Juízo Corregedor Permanente, apreciar o mérito da impugnação, in concreto.

Deste modo, não lhes é dado valorar e decidir a respeito da controvertida necessidade de regularização do empreendimento situado na referida área maior, que corresponde a um terreno com área total de superfície de 192.254,28m².

Nesta seara, de fato, cabe-lhes, então, apenas analisar se o alegado goza de mínimo fundamento.

Ora, é evidente que a impugnação apresentada pela proprietária do bem é impeditiva da utilização da via administrativa, sendo determinante da extinção do processo extrajudicial instaurado com vistas à adjudicação compulsória.

Nessa linha, aliás, recentemente deliberou este C. Conselho Superior da Magistratura, na Apelação Cível nº 1001782-45.2025.8.26.0100, de minha relatoria, j. 05/05/2025.

Por conseguinte, não se justifica, aqui, a pretendida reforma da r. sentença de fls. 110/114.

Em arremate, cabe a ressalva, que, a r. sentença questionada, ao contrário do alegado pelos interessados/recorrentes, não se valeu de critérios subjetivos para obstar a aplicação da adjudicação compulsória extrajudicial.

A propósito, em seu trecho inicial, destaca que:

“A adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão, sem prejuízo da via jurisdicional, poderá ser processado diretamente perante o Oficial de Registro de Imóveis da situação do imóvel, seguindo rito próprio da via extrajudicial, com regulação pelo artigo 216- B da Lei n. 6.015/1973, pela Seção XVI, Cap. XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça e Provimento n. 149/2023, com as disposições específicas introduzidas pelo Provimento n. 150/2023, ambos do CNJ.

Assim, como a parte interessada optou pela via extrajudicial para alcançar o registro de transferência da propriedade do imóvel, a análise deve ser feita dentro de seus requisitos normativos”. (g.n.)

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação e, portanto, determino ao Oficial a extinção do processo e o cancelamento da correspondente prenotação.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

(DJEN de 05.09.2025 – SP)