2ª VRP|SP: Direito notarial – Pedido de providências – Tabelionato de notas – Exigência de ITCMD e emolumentos com base no valor venal de referência – Insurgência contra a serventia – Alegação de ilegalidade da base de cálculo fixada por decreto, em detrimento do valor venal do IPTU – Notário vinculado ao princípio da legalidade estrita, não podendo afastar norma tributária por conta própria – Matéria tributária que deve ser discutida na via jurisdicional, e não em sede administrativa perante a Corregedoria Permanente – Ausência de falha ou ilícito administrativo – Exigência mantida – Pedido indeferido e autos arquivados.

Processo nº: 1105621-86.2025.8.26.0100
Classe – Assunto: Pedido de Providências – Tabelionato de Notas
Requerente: V.L.M.P.
Juiz de Direito: Marcelo Benacchio

Vistos.

Cuida-se de representação formulada por V. L. M. P., em face do Senhor 26º Tabelião de Notas desta Capital, insurgindo-se contra a exigência da serventia de notas, que reputa incorreta e ilegal, quanto ao recolhimento do ITCMD e dos emolumentos com base no valor venal de referência do imóvel, em detrimento do valor venal para fins de IPTU.

Os autos foram instruídos com os documentos de fls. 04/28.

O Senhor Titular prestou esclarecimentos à fl. 33/36, apontando, em suma, que o Notário deve observar a legalidade estrita, de modo que não tem o poder de afastar exigência legal.

A Senhora Representante tornou aos autos para reiterar os termos de seu protesto inicial (fls. 40/46).

O Ministério Público opinou pelo deferimento do pedido (fls. 49/50).

É o breve relatório. Decido.

Cuidam os autos de representação formulada por V. L. M. P., em face do Senhor 26º Tabelião de Notas desta Capital.

Em suma, protesta a parte interessada contra a exigência da serventia de notas, a qual reputa incorreta e ilegal, quanto ao recolhimento do ITCMD e dos emolumentos com base no valor venal de referência, em detrimento do valor venal para fins de IPTU.

Sustenta a Senhora Representante que a exigência de se considerar o valor de venal de referência, estabelecido por meio de Decreto, carece de amparo legal, uma vez que o Fisco não poderia fixar unilateralmente a base de cálculo do imposto por ato administrativo.

Sem prejuízo, aponta a interessada que a jurisprudência do TJSP é uníssona no sentido da ilegalidade da imposição unilateral da base de cálculo.

A seu turno, o Senhor Tabelião esclareceu que não pode, por conta própria, afastar o regulamento fiscal que a interessada reputa incorreto, uma vez que a delegação está subordinada ao princípio da legalidade estrita, de modo que eventual inconstitucionalidade da normativa deve ser objeto de apreciação pelo Poder Judiciário.

Pois bem.

Primeiramente, esclareço à Senhora Representante que a matéria aqui ventilada é objeto de apreciação no limitado campo de atribuição administrativo desta Corregedoria Permanente, que desempenha, dentre outras atividades, a verificação do cumprimento dos deveres e obrigações dos titulares e interinos de delegações afetas à Corregedoria Permanente desta 2ª Vara de Registros Públicos da Capital.

Portanto, extrapola do âmbito de atribuições deste Juízo a matéria atinente à legalidade da base de cálculo do ITCMD, a qual pode ser questionada pelas vias adequadas.

Igualmente, não pode este Juízo Corregedor Permanente, e tampouco o próprio Tabelião, afastar ou alterar a base de cálculo da cobrança dos emolumentos, conforme normativa que recai sobre a matéria, haja vista sua natureza tributária.

No caso em tela, o Senhor Notário cumpriu seu dever de fiscalizar o recolhimento do tributo e aplicar a devida cobrança de emolumentos, conforme exigência da Legislação Estadual e seus respectivos Decretos regulamentadores, resguardando-se em face da atuação fazendária.

Assim o é porque, nos termos do art. 134, inciso VI, do Código Tribunal Nacional e do art. 289 da Lei nº 6.015/73, incumbe aos Oficiais Registradores e aos Tabeliães a fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força de seus atos, sob pena de serem por eles responsabilizados solidariamente.

No mesmo quesito, em vista da natureza tributária dos emolumentos, é certo que a fixação, majoração, redução, dispensa ou alteração de tais valores somente pode ocorrer por meio de norma legal expressa, sob pena de afronta ao Princípio da Legalidade Tributária, nos termos do art. 150, I, e §6º, da Constituição Federal, e do art. 97 do Código Tributário Nacional.

Portanto, agiu o Notário em respeito à legalidade, à segurança jurídica e à eficácia do ato jurídico que lhe foi apresentado.

Não obstante, é certo que o debate na seara tributária remanesce, devendo a questão ser decidida no âmbito jurisdicional, e não administrativo, por não ser da atribuição deste Juízo Corregedor Permanente decidir acerca da inconstitucionalidade, incompatibilidade ou ilegalidade da normativa estadual.

Dessarte, diante dos esclarecimentos prestados, mantenho o óbice imposto pelo Senhor Tabelião, e verifico que a insurgência não merece acolhimento, não havendo que se falar em falha ou ilícito administrativo pelo Senhor Tabelião na prestação dos serviços extrajudiciais, ante à exigência do recolhimento do imposto, e consequente cobrança de emolumentos, com fulcro na legislação estadual.

Por conseguinte, reputo satisfatórias as explicações apresentadas pelo Senhor Tabelião para exigência do recolhimento do ITCMD, e consequente cobrança de emolumentos, nos termos da normativa estadual vigente ou à vista de eventual Mandado de Segurança que assegure à interessada a base de cálculo almejada, não vislumbrando responsabilidade funcional apta a ensejar a instauração de procedimento administrativo, no âmbito disciplinar.

Nessas condições, à míngua de providência censório-disciplinar a ser adotada, determino o arquivamento dos autos.

Encaminhe-se cópia desta decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente como ofício.

Ciência ao Senhor Delegatário e ao Ministério Público.

P.I.C.

(DJEN de 04.09.2025 – SP)