CGJ|SP: Consulta formulada por Corregedoria Permanente a partir de reclamação de advogado contra atendimento em serventia extrajudicial – Questões analisadas: (i) atendimento prioritário a idosos e (ii) acesso direto ao acervo da serventia por advogados – Reformada, de ofício, a decisão da Corregedoria Permanente quanto à prioridade, para adequação ao item 80, “b”, do Capítulo XIII, Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, que prevê atendimento prioritário sem prejuízo da ordem de protocolo, salvo nos casos previstos em lei – Quanto ao acesso ao acervo, reafirmado o entendimento de que é vedado o acesso físico direto a documentos nas serventias, mesmo por advogados, devendo a obtenção de informações ocorrer por certidão ou pedido de informações, resguardando o sigilo e a segurança dos dados – Desnecessária a edição de nova norma, diante da regulamentação já existente – Jurisprudência administrativa reafirmada.

 

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo n° 2025/81764

(252/2025-E)

EMENTA: Consulta apresentada pela Corregedoria Permanente. Acesso a documentos em serventias.

I. Caso em Exame

1. Consulta extraída de pedido de providências instaurado em razão de reclamação por advogado contra o atendimento que lhe foi dispensado em serventia extrajudicial. Proposta de normatização para solucionar a questão relativa à consulta direta do acervo de serventia extrajudicial por advogado. Decisão que também determinou a observância da prioridade de atendimento aos idosos, em detrimento da ordem de protocolo.

II. Questão em Discussão

2. Duas são as questões em discussão: o atendimento prioritário a idoso em serventia extrajudicial e o acesso direto a documentos mantidos na serventia extrajudicial.

III. Razões de Decidir

3. A serventia deve observar o que o item 80, letra “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das NSCGJ dispõe: “Na prestação dos serviços, os notários e registradores devem: b) atender por ordem de chegada, assegurada a prioridade às pessoas com deficiência, aos idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, com prioridade especial aos maiores de 80 (oitenta) anos, às gestantes, às pessoas com crianças de colo e aos obesos, exceto no que se refere à prioridade de registro prevista em lei”. Pelo poder hierárquico exercido por esta Corregedoria Geral da Justiça, a decisão fica reformada para que se observe o disposto no item em referência das NSCGJ.

4. O acesso direto aos documentos é vedado, devendo ocorrer por certidão ou pedido de informações, preservando o sigilo e segurança do acervo.

5. Despicienda a alteração das normas de serviço.

V. Dispositivo e Tese

6. Revisão, de ofício, da determinação da Corregedoria Permanente sobre o atendimento aos idosos, a fim de que seja observado o disposto no item 80, letra “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça e rejeição da consulta quanto à normatização para dispor sobre o acesso direto aos acervos das serventias extrajudiciais.

Tese de julgamento: “1. Atendimento a idosos deve seguir o disposto no item 80, letra “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das NSCGJ. 2. Acesso a documentos deve ser indireto, por certidão ou informações, para garantir sigilo e segurança”.

Legislação Citada:

Art. 7º, VI, letras “b” e “c” do Estatuto da Advocacia; NSCGJ, Tomo II, Cap. XIII, item 30, subitem 30.1, item 31 e item 80, “b”.

Jurisprudência Citada:

Parecer n∘ 88/14-E – Processo CG n∘ 2014/00002070.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de Consulta encaminhada pelo Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de … extraída dos autos de Pedido de Providências (processo nº 0000691-…) originado de Reclamação do usuário e com referência ao atendimento que lhe foi prestado na serventia em apreço, por ocasião de seu comparecimento no início de abril de 2025.

Segundo o reclamante, o acesso físico direto à matrícula imobiliária de imóvel de seu interesse lhe foi negado, apesar de ser advogado, e não se lhe dispensou o tratamento prioritário por ser idoso (nonagenário).

Após a manifestação do Oficial de Registro de Imóveis, o MM. Juiz Corregedor Permanente julgou a reclamação, assegurando o cumprimento do disposto no artigo 3º, da Lei Federal nº 10.741/2003, e determinando ao delegatário que, em detrimento da ordem de protocolo, dispensasse atenção e prioridade aos idosos. Com referência ao direito de acesso ao conteúdo de qualquer matrícula imobiliária, entendeu que, após o pagamento das taxas e emolumentos (quando não isentado), o direito é assegurado por meio de fornecimento de certidão de matrícula.

Não obstante, o MM. Juiz Corregedor Permanente também deduziu Consulta a esta Corregedoria Geral da Justiça sobre “a prerrogativa de acesso pelos Profissionais Advogados ao interior das unidades cartorárias, amiúde para o exame físico de documentos“.

É o breve relatório.

PASSO A OPINAR.

A Consulta formulada, s.m.j., deteve-se apenas na questão referente ao acesso direto dos advogados ao interior das unidades cartorárias para o exame físico de documentos. No caso, o reclamante pretendia ter acesso direto à matrícula imobiliária de imóvel de seu interesse.

A questão relativa ao atendimento prioritário de idosos não foi objeto de consulta, mas como a decisão proferida está em conflito com o disposto no item 80, letra “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das NSCGJ, é imperioso seja modificada, de ofício, em decorrência do exercício do poder hierárquico desta Corregedoria Geral da Justiça.

Confira-se a redação do item:

“80. Na prestação dos serviços, os notários e registradores devem:

(…)

b) atender por ordem de chegada, assegurada prioridade às pessoas com deficiência, aos idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, com prioridade especial aos maiores de 80 (oitenta) anos, às gestantes, às lactantes, às pessoas com crianças de colo e aos obesos, exceto no que se refere à prioridade de registro prevista em lei”.

A decisão proferida pela Corregedoria Permanente determinou ao delegatário que, em detrimento da ordem de protocolo, dispensasse atenção e prioridade aos idosos, conflitando, portanto, com o contido nas NSCGJ.

Mister, portanto, seja revista, de ofício, a fim de que seja observado o contido no item 80, alínea “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das NSCGJ, ficando sem efeito eventual determinação em sentido contrário.

Quanto à questão de consulta direta a documentos nas serventias extrajudiciais pelos Advogados, não se vislumbra necessidade de firmar orientação nas NSCGJ.

O advogado tem direito de acesso à serventia e, ao que consta, isso não lhe foi negado, resguardando-se, então, o disposto no artigo 7º, VI, “b”, do Estatuto da Advocacia. De outra parte, a informação sobre o contido na matrícula imobiliária ser-lhe-ia fornecida mediante certidão, de modo a assegurar o atendimento do que estabelece o artigo 7º, VI, “c”, do mesmo diploma legal.

Sobre o acesso direto aos acervos das serventias extrajudiciais, esta E. Corregedoria Geral da Justiça já se pronunciou, conforme parecer de nº 88/14-E (Processo CG n∘ 2014/00002070), da lavra do Juiz Assessor da Corregedoria, Gustavo Henrique Bretas Marzagão, aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, Desembargador Hamilton Elliot Akel, valendo destacar a ementa e trechos do parecer:

“Ementa: SERVENTIA EXTRAJUDICIAL Acervo documental Requerimento formulado por empresa particular que busca autorização para examinar, digitalizar e divulgar via internet parte dos acervos de diversos Tabeliães de Notas – Impossibilidade – Acesso ao acervo que dá por meio de certidões ou pedido de informações Serviço Público prestado em caráter privado – Dever de guarda e sigilo – Indeferimento

(…)

É certo que o acervo das Serventias Extrajudiciais tem natureza pública, isto é, pertencem ao Estado e não ao titular que, momentaneamente, exerce a delegação que lhe foi outorgada por meio de concurso público.

(…)

Mas é preciso observar que o fato de ser público não torna o acervo acessível a qualquer pessoa. São as informações – e não os livros que as contêm que estão ao alcance de todos, excetuados os casos resguardados por sigilo.

Essa conclusão se extrai da Lei de Registros Públicos, cujo art. 16 traz as formas pelas quais o usuário dos serviços notariais e registrais pode ter acesso ao acervo: certidão ou pedido de informações.

O item 36, do Capítulo XIII, das Normas de Serviço desta Corregedoria Geral, dispõe no mesmo sentido:

Os notários e registradores lavrarão certidões do que lhes for requerido e fornecerão às partes as informações solicitadas, salvo disposição legal ou normativa expressa em sentido contrário.

Os acervos registrais contêm, além das informações disponíveis a todos, as sigilosas ou com restrição legal de acesso. Estas, portanto, não se encontram ao alcance de qualquer pessoa e dependem sempre de autorização judicial para serem reveladas.

Assim, ao emitir uma certidão, o notário ou o registrador consulta seu acervo e divulga apenas o conteúdo não protegido por sigilo, preservando as informações sensíveis para as quais a lei exige prévia autorização judicial para difusão. Exerce, pois, um verdadeiro filtro.

Se o acesso do particular ao acervo ocorresse por meio de contato direto com os livros e demais documentos arquivados nas Serventias Extrajudiciais, o conteúdo protegido por sigilo restaria comprometido, porque o titular da delegação não teria como controlar, a cada manuseio das páginas dos livros, o que o usuário está vendo.

Foi por isso que o legislador fixou como critério o acesso indireto ao acervo por meio de certidão ou informações. Só assim o titular da Serventia Extrajudicial tem condições de filtrar os dados que serão entregues aos solicitantes, preservando os sigilosos.

Além de zelar pelo conteúdo dos registros, os notários e registradores também são responsáveis pela guarda física do acervo. Devem, assim, manter em segurança os respectivos livros e documentos, sob pena de responderem pessoalmente em caso de dano ou extravio injustificados.

A atividade notarial e registral é remunerada por meio de emolumentos fixados por lei. E o direito à percepção desses emolumentos está expresso no art. 28, da Lei n∘8.935/94

Os notários e oficiais de registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei.

Assim, têm direito a receber emolumentos pelas certidões que emitem e, quando autorizados por lei, também pelas informações prestadas ‘em balcão’.

Por todas essas razões, e diante de ausência de dispositivo legal ou normativo que dê lastro ao acesso, à digitalização e à divulgação pretendidos, o pedido da requerente, se deferido, implicaria, de um lado, lesão aos direitos constitucionais à intimidade, à privacidade e à segurança jurídica daqueles cujos dados encontram-se arquivados nas Serventias; de outro, supressão do direito dos notários e registradores de receberem os emolumentos pelos serviços que prestam nas Serventias das quais são delegatários”.

Por oportuno, o anterior item 36 do Capítulo XIII do Tomo II das NSCGJ corresponde ao atual item 30 do mesmo capítulo:

“30. Os notários e registradores lavrarão certidões do que lhes for requerido e fornecerão às partes as informações solicitadas, salvo disposição legal ou normativa expressa em sentido contrário”.

E é possível que as informações sejam prestadas independentemente de expedição de certidão, se assim solicitado, observados os emolumentos incidentes (item 30.1), podendo ser pessoais, computadorizadas, por via eletrônica ou por sistema de telecomunicações (item 31).

Como a normatização existente soluciona a questão relativa à prestação de informações e, nos termos do precedente invocado, o acesso direto aos acervos das serventias implicaria lesão aos deveres de sigilo e de guarda impostos aos notários e registradores, além da supressão de seu direito de recebimento de emolumentos, não há razão para modificação ou complementação das normas de serviço desta Corregedoria Geral da Justiça.

Essa conclusão não se infirma pelo fato de o interessado na obtenção das informações ser advogado.

O que o Estatuto da Advocacia assegura ao advogado é o direito de ingresso em qualquer edifício ou recinto em que funcione repartição judicial ou outro serviço público onde deva praticar ato ou colher prova ou informação útil ao exercício da atividade profissional, e isso não lhe foi negado.

Ao contrário, foi-lhe dito que obteria as informações, mediante a expedição de certidão, após o pagamento dos emolumentos incidentes, como de rigor.

Pelas razões expostas, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é: 1) pela revisão, de ofício, da determinação da Corregedoria Permanente sobre o atendimento prioritário aos idosos, a fim de que seja observado o disposto no item 80, letra “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça; e 2) pela rejeição da consulta quanto à normatização para dispor sobre o acesso direto aos acervos das serventias extrajudiciais.

Sub censura.

São Paulo, data registrada no sistema.

Cristina Aparecida Faceira Medina Mogioni

Juíza Assessora da Corregedoria

Assinatura Eletrônica

CONCLUSÃO

Em 04 de julho de 2025, faço estes autos conclusos ao Doutor FRANCISCO LOUREIRO, Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça.

Eu, Vanessa Gomes Caxito, Escrevente Técnico Judiciário, GAB 3.1, subscrevi.

Proc. nº 2025/81764

Vistos,

Aprovo o parecer apresentado pela MM. Juíza Assessora da Corregedoria e por seus fundamentos, ora adotados, revejo, de ofício, a decisão da Corregedoria Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de … para cientificar o Oficial de que observe, no atendimento a idosos, o disposto no item 80, “b”, do Capítulo XIII, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

Outrossim, rejeito a consulta formulada quanto à normatização para dispor sobre o acesso direto aos acervos das serventias extrajudiciais.

São Paulo, data registrada no sistema.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Assinatura Eletrônica