CSM|SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de conferência de bens – Desqualificação – Suposta incorreção da base de cálculo utilizada para o recolhimento do ITBI – Atuação que extrapola as atribuições do Oficial – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Lançamento, ademais, feito pelo próprio sujeito ativo da obrigação tributária, na forma da legislação municipal – Recurso a que se dá provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1009023-43.2016.8.26.0405, da Comarca de Osasco, em que são partes é apelante RELUCA PARTICIPAÇÕES LTDA, é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE OSASCO.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação, para julgar a dúvida improcedente, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, JOÃO CARLOS SALETTI, RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E PÉRICLES PIZA.

São Paulo, 20 de julho de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação nº 1009023-43.2016.8.26.0405

Apelante: Reluca Participações Ltda

Apelado: 2º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Osasco

VOTO Nº 29.779

Registro de Imóveis – Escritura pública de conferência de bens – Desqualificação – Suposta incorreção da base de cálculo utilizada para o recolhimento do ITBI – Atuação que extrapola as atribuições do Oficial – Dever de fiscalização que se limita ao recolhimento do tributo – Lançamento, ademais, feito pelo próprio sujeito ativo da obrigação tributária, na forma da legislação municipal – Recurso a que se dá provimento.

Trata-se de recurso de apelação interposto por Reluca Participações Ltda. contra a sentença de fls. 156/157, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 2º Registro de Imóveis de Osasco, obstando o registro na matrícula nº 6.442 de escritura pública de conferência de bens, sob o argumento de que a apelante utilizou base de cálculo incorreta para o recolhimento do ITBI.

Sustenta a apelante, em síntese, que o valor do tributo foi recolhido com base em documento de arrecadação emitido pelo Município; e que cabe ao registrador zelar pelo recolhimento do tributo, mas não pela exatidão. Após citar diversos precedentes deste Conselho Superior, pede a reforma da decisão de primeiro grau (fls. 158/169).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 187/189).

É o relatório.

Inicialmente, cabe destacar que, recentemente, este Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em acórdão de minha relatoria, entendeu que sociedade simples, que adota o modelo da sociedade limitada, pode obter a transferência da propriedade de imóvel utilizado para a formação ou aumento de capital social, apresentando a registro certidão expedida pelo Registro Civil das Pessoas Jurídicas. Nesse sentido:

REGISTRO DE IMÓVEIS – Conferência de bens – Bens transferidos por um dos sócios para sociedade simples limitada – Óbice ao registro pela não formalização da transferência dos imóveis por escritura – Sentença de procedência da dúvida – Reforma da decisão – Sociedade simples limitada que é regida pelas normas aplicáveis às sociedades empresárias limitadas (art. 983 do CC) – Certidão de alteração de sociedade simples limitada, passada pelo Registro Civil da Pessoa Jurídica, que constitui documento hábil para a transferência de bens imóveis – Inteligência dos artigos 983 do CC e 64 da Lei nº 8.934/94 – Recurso provido para julgar improcedente a dúvida” (Apelação nº 1031098-21.2016.8.26.0100, j. em 2/2/2017).

Com base nesse voto, não haveria motivo para o Oficial exigir a lavratura de escritura pública de conferência de bens, como ocorreu previamente à suscitação dessa dúvida (fls. 1). Todavia, como essa exigência foi feita em data anterior à prolação do voto acima citado (18 de dezembro de 2015 fls. 1), não há que se cogitar em falha do registrador.

No mais, foi apresentada a registro, no 2º RI de Osasco, escritura pública de conferência de bens (fls. 43/46), por meio da qual Carlos Pinto e Regina Lucia Pinto transferiram a Reluca Participações Ltda. o imóvel matriculado sob nº 6.442.

O título foi desqualificado, sob o argumento de que houve erro no valor utilizado para o cálculo do ITBI. Por essa razão, exigiu o Oficial a complementação do valor do tributo (fls. 1/2).

O MM. Juiz Corregedor Permanente julgou procedente a dúvida, mantendo o óbice (fls. 156/157).

O caso, no entanto, é de reforma da decisão.

Como já decidiu esse Conselho Superior, no julgamento da apelação nº 0002604-73.2011.8.26.0025, em voto da lavra do então Excelentíssimo Corregedor Geral da Justiça, Desembargador José Renato Nalini:

“A falha apontada pelo Oficial envolve questão de questionamento no âmbito do direito material.

Não foi atacada a regularidade formal do título nem mesmo a temporalidade do recolhimento ou o ato em si. Ao contrário, a exigência envolve exame substancial do montante do pagamento do imposto devido, que é atribuição dos órgãos fazendários competentes, sendo que seu questionamento mereceria a participação da Fazenda Pública, principal interessada.

Ao Oficial cabe fiscalizar, sob pena de responsabilização pessoal, a existência da arrecadação do imposto previsto e a oportunidade em que foi efetuada. O montante, desde que não seja flagrantemente equivocado, extrapola a sua função.

Neste sentido é o parecer da D Procuradora de Justiça, citando precedente deste E. Conselho Superior da Magistratura (Apelação Cível 996-6/6, de 09/12/2088).”

É o que ocorre no caso em tela.

Embora zelosa, a atitude do registrador vai além de suas atribuições normais, pois não lhe cabe aferir se o montante do tributo recolhido está correto, devendo apenas zelar pela existência de recolhimento e pela razoabilidade da base de cálculo utilizada.

Na hipótese, o Código Tributário do Município de Osasco, instituído pela Lei Complementar Municipal nº 139/2005, no Capítulo destinado ao Imposto sobre a Transmissão Onerosa de Bens Imóveis Inter Vivos ITBI, preceitua:

Art. 48. Nas transmissões ou nas cessões, o contribuinte, antes da lavratura da escritura ou do instrumento, conforme o caso, comparecerá ao setor competente da Administração, com a descrição completa do imóvel, suas características, localização, área do terreno, tipo de construção, benfeitorias e outros elementos que possibilitem a estimativa de seu valor pelo fisco, que promoverá o lançamento do tributo e expedirá o Documento de Arrecadação Municipal – DAM.

Trata-se de lançamento por declaração, no qual a autoridade administrativa, com apoio nas informações prestadas pelo contribuinte ou responsável, informa qual o valor do tributo devido.

E assim foi feito.

Apresentada as informações necessárias, a Prefeitura emitiu o documento de Arrecadação Municipal com o valor que entendeu cabível e o apelante o pagou (fls. 47).

Assim, se o valor do imposto foi calculado pelo próprio sujeito ativo da obrigação tributária, não há razão para que se impeça o ingresso do título por suposta insuficiência de seu recolhimento.

E o próprio Código Tributário do Município de Osasco vai ao encontro da posição consolidada deste Conselho Superior. Com efeito, prescreve o artigo 54 que o registrador deve exigir a prova do recolhimento do tributo, mas não lhe impõe a análise da exatidão desse valor:

Art. 54. Os tabeliães, escrivães e oficiais de Registro de Imóveis não praticarão quaisquer atos atinentes a seu ofício, nos instrumentos públicos ou particulares relacionados com a transmissão de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, sem a prova do pagamento do imposto.

Por todo o exposto, dou provimento à apelação, para julgar a dúvida improcedente.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 31.08.2017 – SP)