CSM|SP: Registro de imóveis – Escritura pública de venda e compra de fração ideal – Elementos indicativos de parcelamento ilegal do solo – Vendas sucessivas de frações ideais do mesmo bem imóvel – Ausência de vínculo entre os coproprietários – Desqualificação registral confirmada – Registro obstado – Recurso não provido.

 

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0000682-07.2014.8.26.0408, da Comarca de Ourinhos, em que é apelante MARIA INÊS INIGO LEME GONÇALVES, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS E CIVIL DE PESSOA JURÍDICA DA COMARCA DE OURINHOS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, V.U.“, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores, PAULO DIMAS MASCARETTI (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA), ADEMIR BENEDITO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), LUIZ ANTÔNIO DE GODOY (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), RICARDO DIP (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E SALLES ABREU (PRESIDENTE DA SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 25 de fevereiro de 2016.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível n.° 0000682-07.2014.8.26.0408

Apelante: Maria Inês Inigo Leme Gonçalves

Apelado: Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Ourinhos

VOTO N° 29.112

Registro de imóveis – Escritura pública de venda e compra de fração ideal – Elementos indicativos de parcelamento ilegal do solo – Vendas sucessivas de frações ideais do mesmo bem imóvel – Ausência de vínculo entre os coproprietários – Desqualificação registral confirmada – Registro obstado – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a r. sentença que julgou a dúvida procedente porque, configurada a venda de fração ideal, vedada nos termos do item 171 do Cap. XX das NSCGJ, e presentes indícios de parcelamento ilegal do solo, resta desautorizado o registro da escritura pública de venda e compra.

A apelante diz que a fração mínima de parcelamento para a propriedade é de 2 hectares e que a área adquirida é de 3,599992 hectares. Acrescenta que caso admitido o ingresso do título, o imóvel remataria condomínio geral pro indiviso com condôminos titulares de frações ideais, o que na falta de outros elementos, não permite a conclusão da utilização da estrutura jurídica do condomínio geral com finalidade ilícita. Aduz que a finalidade lícita do condomínio traduz-se pela existência da utilização do imóvel para o cultivo de mandioca em comum com toda área remanescente, demonstrando o bom convívio entre vendedores e compradores.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

A venda e compra formalizada pela escritura pública tem por objeto alienação de fração ideal de 6,53299% do imóvel rural matriculado sob número 20.994, equivalente a 3,599992 hectares (35.999,90 metros quadrados). Os coproprietários Takeo e Cazue adquiriram 301.055,944 metros quadrados do imóvel, conforme “R5” e já alienaram três partes ideais conforme registros números 08, 15 e 16, equivalentes a 24,05%. Há notícia da existência de outro título de compra e venda prenotado sob número 85.065 referente à alienação de fração ideal de 5,4417% do imóvel e equivalente a 30.000,00 metros quadrados a Valdomiro Inigo Mansano Júnior e sua mulher.

As transmissões registradas, com sucessivas alienações de frações ideais da parte ideal identificada na referida matrícula são indicativas de parcelamento ilegal do solo, prestigiado pela ausência inquestionada de vínculos entre os condôminos (exceto quanto ao mencionado título prenotado pela registradora, sem, contudo, ter a recorrente comprovado o parentesco alegado) a impedir a inscrição perseguida.

A desqualificação registrária, assim, revelou-se acertada; encontra amparo na regra do item 171 do Cap. XX das NSCGJ, de acordo com o qual é vedado proceder a registro de venda de frações ideais, com localização, numeração e metragem certa, ou de qualquer outra forma de instituição de condomínio ordinário que desatenda aos princípios da legislação civil, caracterizadores, de modo oblíquo e irregular, de loteamentos ou desmembramentos.

E nessa trilha, é oportuno lembrar precedente do C. CSM, rel. Des. Maurício Vidigal, no qual acentuado que a ausência de atrelamento da fração ideal ao solo, por si só, não legitima o registro, porquanto a simples expansão de condomínio supostamente pro indiviso no tempo, sem nenhuma relação de parentesco entre os sujeitos de direito, é indicativa, segundo o que normalmente acontece, de divisão informal, sem o controle registrário. (Apelação Cível n.° 990.10.512.895-5, J. 5.5.2011).

Outro, e com referência a elucidativo parecer do então Juiz Auxiliar da Corregedoria Cláudio Luiz Bueno de Godoy, lavrado nos autos do processo CG n.° 21/2003, seguiu o mesmo caminho, ao enfrentar a questão da aquisição e do registro de frações ideais com indícios de parcelamento ilegal do solo, vedando o assento do título correspondente. (Apelação Cível n.° 0000182-09.2012.8.26.0408, j. 23.8.2013).

No parecer aludido, inclusive, em apontamento aplicável ao caso vertente, que igualmente abrange bem imóvel rural, constou:

também irrelevante o fato de se tratar de imóvel rural. Isto porquanto, se não aplicável a Lei 6.766/79, o Dec. Lei 58/37 (art. 1°), e também o Estatuto da Terra (art. 61), complementado pelo art. 10 da Lei 4.947, ao regrar o parcelamento do imóvel rural, igualmente exigem uma série de providências acautelatórias dos adquirentes e do meio ambiente, no caso contornadas pelo expediente de aparente instauração de condomínio civil, com vendas de partes ideais, todavia em burla à lei.

Isto posto, nego provimento ao recurso.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator

(DJe de 05.05.2016 – SP)