1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Dúvida – Ausência de direito sucessório do ex-companheiro da herdeira pré-morta – Inteligência do artigo 1.830 do Código Civil – Dúvida improcedente.

Processo 1059227-07.2014.8.26.0100
Dúvida
Registro de Imóveis
R. A. F. T. e outros
Registro de Imóveis – Dúvida – ausência de direito sucessório do ex-companheiro da herdeira pré-morta – inteligência do artigo 1.830 do Código Civil – dúvida improcedente.
O 8º Oficial de Registro de Imóveis suscitou a presente dúvida, a requerimento de R. A. F. T. e outros, diante da recusa de registro da escritura pública de inventário e partilha e da posterior re-ratificação, ambas lavradas no 1º Tabelião de Notas de Diadema, cujo objeto é o imóvel matriculado sob o nº 25.073 daquela Serventia.
Segundo narrado pelo Oficial, a qualificação negativa dos títulos ocorreu porque à época da sucessão de R. T. e sua mulher R. T., a herdeira pré-morta, L., era casada em segundas núpcias, pelo regime de comunhão parcial de bens, com J. P. de L. F., sendo que este não consta como herdeiro de seus bens particulares (fls.02/09).
Os interessados alegam, em síntese, que L. conviveu com J. P. de L. F. durante 13 anos e que, nesse período, o casal não teve filhos e não adquiriu bens. Ainda, informam que quando da abertura da sucessão, constatou-se que o casal estava separado de fato há mais de 04 anos (meados de 2001 até a data da morte em 17 de março de 2013). Deste modo, entendem não assistir qualquer direito sucessório ao ex-cônjuge (fls.17/39).
O Ministério Público opinou pela improcedência da dúvida (fls.104/105).
É o relatório. DECIDO.
Com razão os suscitados e o Ministério Público. Não basta para ingressar na ordem de vocação hereditária a qualidade de ex-companheiro, mas, pelo contrário, é preciso que no momento da morte o casamento se encontre vigente. De acordo com os documentos juntados e a ordem cronológica exposta no pedido (fls.20), não há dúvidas de que à data do óbito já estava desfeita a vida em comum do casal.
O legislador, nos termos do artigo 1.830, só reconhece o direito sucessório aos cônjuges supérstite, in verbis: “Somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de que esta convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente”.
A jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça Paulista é pacífica quanto a esse entendimento, in verbis: “Inventário – Decisão que determinou a apresentação de novo plano de partilha, constando um único herdeiro – Agravante que estava separada judicialmente do de cujus, por ocasião do falecimento – Exclusão da sucessão que se impõe – exegese do art. 1830 do Código Civil – Imóvel pertencente ao falecido em razão de sucessão, portanto, excluído da comunhão – Art. 1.659, inciso I, do Código Civil” (TJSP, AI 90101282089, Rel. Christine Santini Anafe, j. 01/09/2010).
Cabe referir à doutrina de Carlos Roberto Gonçalves: “O Superior Tribunal de Justiça, antes do advento do Código Civil de 2002, já firmara entendimento (o ilustre Desembargador menciona, em nota de rodapé, RT, 735/131, 760/232) de que o regime de comunhão entre os cônjuges cessa se há prolongada separação de fato do casal, estando desfeita a vida em comum, extinta a “afectio societatis”, não se comunicando os bens que um deles tiver adquirido, nesse tempo, sem qualquer esforço ou colaboração do outro, com que não mais coabitava”. (Direito Civil Brasileiro, vol. 7 – Direito das Sucessões, 4ª edição, Saraiva, 2010, p. 181).
Por fim, importante salientar a orientação do artigo 1.659 quanto à separação parcial de bens, in verbis: “Art. 1.659 – Excluem-se da comunhão: I – os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar.”
Assim, reconhecida a ausência de direito sucessório por parte de J., sendo certo que o imóvel de L. fora adquirido por herança, imperioso concluir que não prospera o óbice imposto pelo Registrador.
Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE a dúvida suscitada pelo 8º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo e determino o registro dos documentos apresentados. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Encaminhe-se à Serventia extrajucidial os documentos originais, após o trânsito em julgado desta decisão, que deverão ser retirados pelo interessado no prazo de 15 dias. Oportunamente, arquivem-se os autos.
P. R. I.C
(D.J.E. de 01.09.2014 – SP)