1ª VRP|SP: Dúvida – Registro formal de partilha – Título judicial não está imune à qualificação do oficial registrador – Casamento celebrado com regime da separação total de bens – Inaplicabilidade da Súmula 377 do STF – Não há que se falar em meação, devendo a totalidade dos bens imóveis ser partilhada entre a viúva como herdeira necessária e os demais herdeiros – Nulidade do pacto antenupcial deve ser pleiteada na esfera judicial própria – Dúvida procedente.

Processo 1025290-06.2014.8.26.0100
Dúvida
Registro de Imóveis
Alessandra Mortada de Castro e outros
CONCLUSÃO Em 14 de abril de 2014, faço estes autos conclusos ao MM Juiz de Direito Dr Paulo Cesar Batista dos Santos da 1ª Vara de Registros Públicos. Eu, ___ Bianca Taliano Beraldo, escrev., digitei.
Dúvida – Registro Formal de Partilha – Título judicial não está imune à qualificação do oficial registrador – casamento celebrado com regime da separação total de bens – inaplicabilidade da Súmula 377 do STF – não há que se falar em meação, devendo a totalidade dos bens imóveis ser partilhada entre a viúva como herdeira necessária e os demais herdeiros – nulidade do pacto antenupcial deve ser pleiteada na esfera judicial própria – dúvida procedente.
Vistos.
Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Alessandra Mortada de Castro e outros, em face da recusa em proceder ao registro do Formal de Partilha dos bens deixados pelo falecimento de N. M., consistentes em três imóveis matriculados sob nºs 155.905, 158.502 e 158.494. Segundo o Oficial Registrador, a inviabilidade do registro ocorreu em razão de ter sido determinada a partilha de 50% dos imóveis acima mencionados a A. M. de C., ficando os outros 50% para T. T. S. M., a título de meação.
Todavia, quando o “de cujus” adquiriu os bens, era casado com T. T. S. M., no regime da separação total, de acordo com o pacto antenupcial nº 7.284. Logo, a totalidade dos bens pertencia ao falecido, não havendo que se falar em meação, com a partilha da totalidade entre a viúva e a filha do falecido, como herdeiras necessárias. Os suscitados apresentaram impugnação (fls.203/215). Alegam, em síntese, que não cabe ao Oficial Registrador proceder a análise da decisão judicial que homologou a partilha, o que seria possível apenas por ação rescisória. Aduzem ser nulo o pacto nupcial registrado junto àquela Serventia, sob o nº 7.284, tendo em vista que o “de cujus” era maior de 60 (sessenta) anos quando do casamento, logo, o regime a ser adotado deveria ser o da separação legal de bens, no curso do qual é observado as regras da comunhão parcial de bens, de acordo com o enunciado na Súmula 377 do STF.
O Ministério Público opinou pela manutenção do óbice registrário (fls. 219/221).
É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
Com razão o Oficial Registrador e o Douto Promotor de Justiça. O entrave concernente à irregularidade da partilha é de fato insuperável. Preliminarmente, cumpre destacar que os títulos judiciais não estão isentos de qualificação (positiva ou negativa), para ingresso no fólio real. O Egrégio Conselho Superior da Magistratura já decidiu que a qualificação negativa do título judicial não caracteriza desobediência ou descumprimento de decisão judicial (Apelação Cível n. 413-6/7). Nessa linha, também se posicionou o E. Supremo Tribunal Federal: “REGISTRO PÚBLICO – ATUAÇÃO DO TITULAR – CARTA DE ADJUDICAÇÃO – DÚVIDA LEVANTADA – CRIME DE DESOBEDIÊNCIA – IMPROPRIEDADE MANIFESTA. O cumprimento do dever imposto pela Lei de Registros Públicos, cogitando-se de deficiência de carta de adjudicação e levantando-se dúvida perante o juízo de direito da vara competente, longe fica de configurar ato passível de enquadramento no artigo 330 do Código Penal – crime de desobediência – pouco importando o acolhimento, sob o ângulo judicial, do que suscitado” (HC 85911 / MG – MINAS GERAIS, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, j. 25/10/2005, Primeira Turma).
Assim, não basta a existência de título proveniente de órgão jurisdicional para autorizar automaticamente o ingresso no registro tabular. De acordo com os registros públicos referentes a matrículas dos imóveis inventariados, verifica-se que os bens foram adquiridos pelo “de cujus” em data anterior ao registro do pacto antenupcial (fl.51), no qual foi estabelecido o regime da separação total de bens. Decerto que o entendimento da Súmula 377 do STF é no sentido da presunção do esforço comum para a aquisição de aqüestos, no tocante aos casamentos realizados pelo regime da separação legal de bens. Dá-se, portanto, a inversão do ônus da prova, devendo ser comprovada a contribuição unilateral para a evolução patrimonial.
No caso em tela, reconheço que houve esta prova, tendo em vista que o registro do pacto foi realizado no ano de 2000 e a aquisição dos imóveis deu-se em data anterior, afastando a presunção mencionada. Portanto, inaplicável a Súmula 377 STF na presente hipótese, já que não se verifica o esforço comum. Neste sentido se orienta a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: Direito de Família. Regime de separação legal de bens. Aquestos. Esforço comum. Comunicabilidade. Enunciado nº 377 da Súmula/STF. Inaplicabilidade. Recurso desacolhido. – Reconhecido nas instâncias ordinárias que o bem imóvel, cuja comunicabilidade se pretende, foi adquirido pelo esforço de um só dos consortes – Embora a lavratura da respectiva escritura tenha ocorrido já na constância do casamento – Não se há classificá-lo como comum, inaplicando-se, via de consequência, a orientação a que se refere o verbete n. 377 da Súmula/STF (STJ – Resp 13661 / RJ T4 – Quarta Turma data do julgamento 24/11/1992 data da publicação dj 17.12.1992 p. 24248 Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira). Direito de Família. Regime da separação legal de bens. Aquestos. Esforço comum. Comunicabilidade. Súmula STF, enunciado n. 377. Correntes. Código civil, arts. 258/259. Recurso inacolhido. Em se tratando de regime de separação obrigatória (Código Civil, art. 258), comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento pelo esforço comum. O Enunciado n. 377 da Sumula STF deve restringir-se aos aquestos resultantes da conjugação de esforços do casal, em exegese que se afeiçoa a evolução do pensamento jurídico e repudia o enriquecimento sem causa. No âmbito do recurso especial não e admissível a apreciação da matéria fática estabelecida nas instâncias locais. (STJ – Resp 9938 / SP. Quarta Turma. Data do Julgamento 09/06/1992 Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA).
No mais, não prospera os argumentos dos suscitados em relação a presença de nulidade do pacto antenupcial, tendo em vista que não cabe ao Oficial Registrador adentrar a análise desta questão, incumbindo aos suscitados discutir esses argumentos na esfera judicial própria, à luz do contraditório e ampla defesa.
Coaduno com as palavras do Douto Promotor de Justiça: “… Não assiste razão aos suscitados quando argumentam com a eventual nulidade do pacto antenupcial que erigiu o regime do casamento como sendo o da separação total de bens em virtude da idade do de cujus a impor o regime da separação obrigatória, segundo o qual se observaria a comunhão dos aqüestos. É que, se assim procedesse o Oficial Registrador, aí sim estaria incursionando em seara indevida, pois somente o órgão jurisdicional competente pode, depois de provocação dos interessados, declarar a nulidade do pacto antenupcial”.
Por fim, insta salientar que para que se reconheça o esforço comum antes da celebração do casamento, porventura uma união estável, necessária é a produção de prova na via ordinária.
Ante o exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de A. M. de C. e outros e consequentemente extingo o feito com fundamento no artigo 269, I do CPC. Oportunamente, cumpra-se a Lei n. 6.015/73, art. 203, I, e arquivem-se os autos.
P.R.I.C.
(D.J.E. de 07.05.2014 – SP)