TJ|MG: Sucessão – Cônjuge supérstite – Meação – Concorrência sucessória – Regime da comunhão parcial de bens – Descendentes – Sobrepartilha – Meação – Bens comuns – Bens particulares – Exclusão – Precedente do STJ.

EMENTA
SUCESSÃO. CÔNJUGE SUPÉRSTITE. MEAÇÃO. CONCORRÊNCIA SUCESSÓRIA. REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS. DESCENDENTES. SOBREPARTILHA. MEAÇÃO. BENS COMUNS. BENS PARTICULARES. EXCLUSÃO. PRECEDENTE DO STJ. – Inobstante as celeumas que se formaram em torno da concorrência sucessória, disciplinada pelo art. 1829, I, do Código Civil, entre o cônjuge supérstite, casado com o falecido pelo regime da comunhão parcial de bens, e os descendentes do autor da herança o STJ fixou o entendimento de que a sucessão, por ser uma projeção do regime patrimonial vigente na vida do casal, incide justamente sobre os bens comuns e não sobre os particulares. (TJMG – Apelação Cível nº 1.0024.03.040496 – Belo Horizonte – 6ª Câmara Cível – Rel. Des. Selma Marques – DJ 13.09.2013)
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO
DES.ª SELMA MARQUES – Relatora.
RELATÓRIO E VOTOS
DES.ª SELMA MARQUES (Relatora):
Cuida-se de apelação interposta contra a r. sentença de ff. 596-verso – 598-anverso e verso – que homologou o esboço de sobrepartilha de ff. 568/573, relativamente ao imóvel descrito à f. 568, deixado pelo Senhor Onofre Xavier Dias.
Inconformado apela Robson Ferreira Dias e outros, ff. 607/612, apresentando inicialmente preliminar de nulidade da sentença por ausência de prestação jurisdicional, uma vez que embora tenham requerido a exclusão da inventariante, senhora Maria da Conceição Souza Dias, do plano de partilha, não houve manifestação pelo juízo.
No mérito retoma a questão concernente à exclusão da inventariante do plano de partilha, pugnando pela incidência do art. 1829, I, do CC/02, que em última análise autorizaria a concorrência do cônjuge com os descendentes na legítima apenas em relação aos bens particulares.
Resposta às ff. 616/621.
Presentes os requisitos legais, (dentre os quais a comprovação do preparo a despeito de não ser a guia original, ff. 613 e 624/625), conheço do recurso.
DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA.
Importante registrar que se “apesar da carência de fundamentação, a parte tiver condições de desenvolver as razões do recurso de apelação, possibilitando ao tribunal perfeita compreensão da controvérsia, parece-me deva ser desconsiderado o vício. O objetivo da exigência constitucional é propiciar o controle crítico da sentença, permitindo eventual falha cometida pelo juiz e garantir o escopo do contraditório. Atingido esse escopo, deve incidir o art. 244 do CPC”. (José Roberto dos Santos Bedaque. Efetividade do Processo e Técnica Processual. 2006. p. 491). Nesse sentido o STJ:
“Na hipótese em que é atingido o fim perseguido pela exigência de motivação das decisões judiciais, de modo a restar garantida a possibilidade de impugnação da decisão, é injustificável o rigor formal, devendo-se, ante a ausência de prejuízo às partes, afastar a pretendida decretação de nulidade, por prestigiar tal entendimento os princípios da finalidade e do prejuízo que regem o sistema de nulidade processual”. (STJ. 3ªT., ArrRg nos EDcl na MC 3.596-SP, relatora Ministra Nancy Adrighi, DJU 25.06.2001).
O juízo sentenciante apreciou, ainda que sem a devida detença sobre o tema, a questão da exclusão da inventariante do rol dos herdeiros, uma vez que registrou estar o imóvel de f. 568, sendo devidamente partilhado entre os herdeiros, donde emana claro ter reconhecimento como tal a senhora Maria da Conceição Souza Dias.
Demais disto, a despeito da carência da fundamentação a questão foi devidamente devolvida ao Tribunal, por meio de substancioso recurso de apelação, onde teve a parte apelante plena condições de expor sua argumentação sobre a matéria respectiva.
Isto posto REJEITO A PRELIMINAR.
DO MÉRITO.
A questão versada nos autos cinge-se à aplicação no caso do disposto no art. 1829, I, do Código Civil, para fins de excluir da concorrência sucessória em relação ao bem descrito a f. 168, a senhora Maria da Conceição Souza Dias, que por ser casada em regime de comunhão parcial com o falecido Onofre Xavier Dias, fazendo jus, portanto, à meação do bem, não poderia concorrer na sucessão da metade pertencente ao “de cujus”.
Estabelece o art. 1829, do CC/02 que “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares”.
Note-se que a questão da concorrência do cônjuge em relação aos descendentes gerou controvérsias e decisões em diversos sentidos, sendo um deles justamente aquele segundo o qual a concorrência do cônjuge supérstite como herdeiro necessário, (art. 1829, I, do CC/02), com os descendentes do autor da herança somente ocorreria sobre os bens particulares, cuja existência seria, pois, imprescindível para o acionamento da regra, (neste sentido o Enunciado 270 das Jornadas de Direito Civil promovidas pelo CJF).
No entanto, a questão da concorrência sucessória do cônjuge casado pelo regime de comunhão parcial de bens com os descentes do autor da herança, restou sedimentada junto ao STJ sobre outra ótica.
O Tribunal Superior no mencionado precedente deixou assentado justamente que a concorrência deveria ocorrer em relação aos bens comuns do casal e não em relação aos particulares do falecido, providência que nada mais seria do que transferir para o momento sucessório a mesma disciplina do que vigia. Confira-se:
“Direito das sucessões. Recurso especial. Inventário. De cujus que, após o falecimento de sua esposa, com quem tivera uma filha, vivia, em união estável, há mais de trinta anos, com sua companheira, sem contrair matrimônio. Incidência, quanto à vocação hereditária, da regra do art. 1.790 do CC/02. Alegação, pela filha, de que a regra é mais favorável para a convivente que a norma do art. 1829, I, do CC/02, que incidiria caso o falecido e sua companheira tivessem se casado pelo regime da comunhão parcial. Afirmação de que a Lei não pode privilegiar a união estável, em detrimento do casamento.
“- O art. 1.790 do CC/02, que regula a sucessão do ‘de cujus’ que vivia em comunhão parcial com sua companheira, estabelece que ela concorre com os filhos daquele na herança, calculada sobre todo o patrimônio adquirido pelo falecido durante a convivência.
“- A regra do art. 1.829, I, do CC/02, que seria aplicável caso a companheira tivesse se casado com o ‘de cujus’ pelo regime da comunhão parcial de bens, tem interpretação muito controvertida na doutrina, identificando-se três correntes de pensamento sobre a matéria: (i) a primeira, baseada no Enunciado 270 das Jornadas de Direito Civil, estabelece que a sucessão do cônjuge, pela comunhão parcial, somente se dá na hipótese em que o falecido tenha deixado bens particulares, incidindo apenas sobre esses bens; (ii) a segunda, capitaneada por parte da doutrina, defende que a sucessão na comunhão parcial também ocorre apenas se o ‘de cujus’ tiver deixado bens particulares, mas incide sobre todo o patrimônio, sem distinção; (iii) a terceira defende que a sucessão do cônjuge, na comunhão parcial, só ocorre se o falecido não tiver deixado bens particulares.
“- Não é possível dizer, aprioristicamente e com as vistas voltadas apenas para as regras de sucessão, que a união estável possa ser mais vantajosa em algumas hipóteses, porquanto o casamento comporta inúmeros outros benefícios cuja mensuração é difícil.
“- É possível encontrar, paralelamente às três linhas de interpretação do art. 1.829, I, do CC/02 defendidas pela doutrina, um quarta linha de interpretação, que toma em consideração a vontade manifestada no momento da celebração do casamento, como norte para a interpretação das regras sucessórias.
“- Impositiva a análise do art. 1.829, I, do CC/02, dentro do contexto do sistema jurídico, interpretando o dispositivo em harmonia com os demais que enfeixam a temática, em atenta observância dos princípios e diretrizes teóricas que lhe dão forma, marcadamente, a dignidade da pessoa humana, que se espraia, no plano da livre manifestação da vontade humana, por meio da autonomia privada e da consequente auto responsabilidade, bem como da confiança legítima, da qual brota a boa fé; a eticidade, por fim, vem complementar o sustentáculo principiológico que deve delinear os contornos da norma jurídica.
“- Até o advento da Lei n.º 6.515/77 (Lei do Divórcio), vigeu no Direito brasileiro, como regime legal de bens, o da comunhão universal, no qual o cônjuge sobrevivente não concorre à herança, por já lhe ser conferida a meação sobre a totalidade do patrimônio do casal; a partir da vigência da Lei do Divórcio, contudo, o regime legal de bens no casamento passou a ser o da comunhão parcial, o que foi referendado pelo art. 1.640 do CC/02.
“- Preserva-se o regime da comunhão parcial de bens, de acordo com o postulado da autodeterminação, ao contemplar o cônjuge sobrevivente com o direito à meação, além da concorrência hereditária sobre os bens comuns, mesmo que haja bens particulares, os quais, em qualquer hipótese, são partilhados apenas entre os descendentes. Recurso especial improvido”. (REsp 1117563 / SP.RECURSO ESPECIAL.2009/0009726-0. Ministra NANCY ANDRIGHI. T3 – TERCEIRA TURMA. DJe 06/04/2010. RSTJ vol. 218 p. 355).
Portanto, não há falar em qualquer irregularidade da partilha de ff. 568/573, homologada pela sentença, onde além da meação sobre o bem comum de Onofre Xavier Dias e Maria da Conceição Souza Dias, foi estabelecida a concorrência sucessória da apelada sobre a metade que, considerado o regime da comunhão parcial de bens, não lhe pertenceria.
Mediante tais considerações NEGO PROVIMENTO ao recurso.
Sem custas.
É como voto.
DESA. SANDRA FONSECA (REVISORA) – De acordo com o(a) Relator(a).
DES. CORRÊA JUNIOR – De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: “REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO”
Fonte: Boletim nº 6132 – Grupo Serac – São Paulo, 11 de Novembro de 2013