CGJ|SP: Registro de Imóveis – Penhora de parte ideal do direito de usufruto sobre unidade autônoma em construção – Direito real inalienável e impenhorável – Penhora que pode recair apenas sobre os direitos decorrentes do exercício do usufruto – Direito pessoal que não pode ser objeto de averbação – Óbice ainda decorrente de irregularidades no empreendimento imobiliário – Inteligência do item 151 do capítulo XX das NSCGJ – Recurso não provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 2011/68750

(206/11-E)

Registro de Imóveis – Penhora de parte ideal do direito de usufruto sobre unidade autônoma em construção – Direito real inalienável e impenhorável – Penhora que pode recair apenas sobre os direitos decorrentes do exercício do usufruto – Direito pessoal que não pode ser objeto de averbação – Óbice ainda decorrente de irregularidades no empreendimento imobiliário – Inteligência do item 151 do capítulo XX das NSCGJ – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso interposto por BTR – FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO MERCANTIL LTDA. contra decisão do Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Campos do Jordão, que indeferiu pedido de averbação de certidão judicial de penhora de parte ideal do direito ao usufruto que recai sobre unidade autônoma em construção, denominada “Berneuse”, integrante do Condomínio “Vila Simonsen”.

O Oficial negou o pedido por três razões: a) impossibilidade de averbação de penhora sobre direito real de usufruto, que é inalienável e impenhorável; b) vedação à prática de atos de registro e averbação em empreendimentos que não estão regularizados; c) falta de comprovação de que houve a intimação dos executados. A sentença manteve a recusa.

Sustenta a recorrente que a validade e eficácia da penhora é questão jurisdicional, a ser decidida na via própria, como foi reconhecido pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, que afastou esse óbice. Embora sejam apontadas irregularidades no empreendimento, a certidão imobiliária da matrícula nº 12.064 mostra que, em abril de 2006, o imóvel foi objeto de averbações e registro, com a intenção de prejudicar créditos de terceiros.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 120/122).

É o relatório.

Passo a opinar.

A questão discutida nos autos não versa sobre registro em sentido estrito, e o procedimento não é de dúvida. Assim, o recurso foi impropriamente denominado apelação, devendo ser recebido e processado como recurso administrativo, tal como previsto no art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, conforme já decidido por Vossa Excelência, a fls. 123/124.

O primeiro fundamento da recusa do Oficial – inviabilidade de averbação de penhora de direitos decorrentes de usufruto – foi afastada pelo MM. Juiz Corregedor Permanente, sob o fundamento de que a questão é jurisdicional, e não pode ser rediscutida na via administrativa. A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se no mesmo sentido.

As decisões judiciais versaram apenas sobre a possibilidade de penhora dos direitos decorrentes do usufruto, não sobre a viabilidade de averbação do ato constritivo.

Como é evidente, nem toda penhora pode ser averbada no Oficial de Registro de Imóveis, mas apenas aquelas relativas a direitos reais sobre imóveis.

A certidão de fls. 15 se refere à “penhora da parte ideal do direito ao usufruto pertencente ao executado”. À primeira vista, tem-se a impressão de que a constrição teria recaído sobre o próprio direito real. Mas, tal como as leis, as decisões judiciais devem ser interpretadas, e a única forma de fazê-lo é considerar que a penhora recaiu não propriamente sobre o usufruto, que é inalienável (portanto impenhorável), mas sobre o seu exercício. É o que decorre expressamente do art. 1.393 do Código Civil.

Tendo recaído sobre o exercício do usufruto, era mesmo inviável a averbação. O usufruto é direito real, que grava a coisa; os direitos decorrentes do exercício do usufruto não incidem sobre o imóvel, mas sobre as vantagens patrimoniais decorrentes do uso e fruição da coisa. Em consequência, a penhora recai não sobre um imóvel, mas sobre as vantagens patrimoniais auferíveis por aquele que se beneficia do usufruto. O seu objeto não é o imóvel, mas um direito, uma obrigação que, por seu cunho pessoal, não é suscetível de averbação ou registro.

A inviabilidade da averbação de penhora do exercício do usufruto já foi reconhecida por esta Corregedoria Geral, como se vê do parecer da lavra do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria Walter Rocha Barone, no Processo nº 82514 (cópia a fls. 55/57).

Mas há ainda outro óbice à averbação. O empreendimento em que situada a unidade sobre a qual recai o usufruto não está regularizado. Conforme o Oficial, a matéria é objeto de dúvida já apreciada e acolhida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente (Processo nº 116.01.2010.000953-5), não tendo sido juntada a decisão, que ainda estava em fase de publicação (fls.06, item 14).

Na impugnação e no recurso, a interessada sustenta a regularidade do empreendimento, mas não nega a existência de decisão a respeito, no procedimento de dúvida. Não cabe, nesta via, o reexame de questão que já é objeto de procedimento próprio, acolhido pelo MM. Juiz Corregedor Permanente. Uma vez que foi reconhecida a irregularidade, inviável a averbação, nos termos do item 151, do Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral de Justiça. Ainda que o dispositivo vede apenas o registro de venda de fração ideal nas circunstâncias nele apontadas, a averbação de penhora mostra-se descabida, já que a constrição é ato preparatório de futura alienação judicial.

Por fim, a certidão de fls. 15 mostra que há dois executados: Adalto Ferreira Brites e Marly Horta Ferreira Brites. A interposição de agravo de instrumento pelo primeiro mostra que ele estava ciente da penhora; mas não há provas da intimação da segunda.

Diante disso, o parecer que submeto à apreciação de Vossa Excelência, é pelo recebimento da apelação como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário Estadual e pelo não provimento do recurso.

Sub censura.

São Paulo, 10 de junho de 2011.

MARCUS VINÍCIUS RIOS GONÇALVES

Juiz Auxiliar da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, recebo a apelação interposta como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário Estadual e nego-lhe provimento. Publique-se. São Paulo, 15.06.2011. – (a) – MAURÍCIO DA COSTA CARVALHO VIDIGALCorregedor Geral da Justiça.