CGJ|SP: Recurso – Averbação – Desmembramento de lote – Cláusula impeditiva prevista em memorial descritivo do empreendimento – Inserção pelo Loteador – Afastamento da limitação convencional para análise das condições e peculiaridades do caso em concreto – Efeitos urbanísticos – Observância da função social da propriedade – Decisão reformada – Recurso provido.

PROCESSO Nº 2012/100271 – MARÍLIA – ADELINO XAVIER DA SILVA – Advogados, ARTHUR OSWALDO DOS SANTOS FERREIRA, OAB/SP 39.376 e WILMA APARECIDA MICHEL FERREIRA, OAB/SP 98.678.

Parecer (274/2012-E)

Recurso – Averbação – Desmembramento de lote – Cláusula impeditiva prevista em memorial descritivo do empreendimento – Inserção pelo Loteador – Afastamento da limitação convencional para análise das condições e peculiaridades do caso em concreto – Efeitos urbanísticos – Observância da função social da propriedade – Decisão reformada – Recurso provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de recurso interposto por Adelino Xavier da Silva contra decisão de acolhimento de dúvida administrativa que impediu o desdobro de matrícula de imóvel em decorrência de proibição convencional estabelecida por loteador – metragem mínima dos lotes: frente mínima de 12 m e área mínima de 300 m².

O MM Juiz Corregedor Permanente do 2° Cartório de Registro de Imóveis, em sua decisão de fls. 32/35, salienta que o desdobramento acarreta alteração urbanística e desvalorização dos imóveis, sendo descabido o levantamento da restrição sem a concordância dos demais interessados.

Sustenta o recorrente que a decisão do Juiz Corregedor Permanente deve ser reformada, pelos seguintes argumentos: preliminarmente, reclama da natureza vinculativa do memorial descritivo confeccionado pelo loteador; no mérito, que o desdobro foi aprovado pela Prefeitura Municipal de Marília sem embargos, existindo flagrante descaracterização do loteamento outrora idealizado em decorrência de outros tantos desdobros anteriores já averbados.

O Ministério Público opina pelo não provimento do recurso, com base na vedação da alteração ou cancelamento parcial do loteamento sem a aprovação do ente público e o consentimento do loteador e os adquirentes dos lotes atingidos (art. 28, da Lei 6.766/79) – fls. 84/89.

É o relatório.

OPINO.

Salvo melhor juízo de Vossa Excelência, Senhor Corregedor, o recurso deve ser acolhido, ante as peculiaridades do caso concreto.

A matéria não é nova no âmbito desta Corregedoria Geral de Justiça.

O entendimento consolidado é pela impossibilidade de averbação do desdobro de lote em afronta à restrição convencional.

Nesse sentido : “ Loteamento. Desdobro. Contrato-padrão – restrição urbanística convencional. Municipalidade – aprovação.

Registro de Imóveis – Loteamento – Requerimento de averbação de desdobro de lote – Existência de restrição em contrato-padrão arquivado no registro predial que veda a subdivisão de lotes – Prevalência da restrição convencional – Aprovação do desdobro pela Prefeitura Municipal – Irrelevância – Averbação indeferida – Recurso não provido. (Processo CGJ nº 29/2006, Indaiatuba, julgado em 29/04/2006, com aprovação em 08/05/2006, publicada no D.O.E. de 13/06/2006)”.

Adelino Xavier da Silva apresentou pedido de desdobramento do lote 2, da quadra 8, do Jardim Estoril, matrícula n° 2.212, conforme projeto de desdobro aprovado pela Prefeitura Municipal de Marília – fls. 23 e 25 – dois lotes iguais de 180 m².

A recusa do Oficial de Registro de Imóveis de Marília está fundada na existência de memorial descritivo do empreendimento que impõe como dimensões mínimas do lote 12 metros de frente e área mínima de 300 m², bem como em precedente desta Corregedoria Geral de Justiça.

Atento as particularidades do caso em análise, excepcionalmente, entendo que a perpetuação das restrições convencionais previstas em dezembro de 1975 (fls. 07) sobre o lote 2 da quadra 8 do Jardim Estoril, matrícula n° 2.212, não se justifica, pois desconexa com a realidade posta, uma vez que no local existe divisão murada da área e com duas residências totalmente acabadas (fls. 65).

A imposição de restrição convencional objetiva “resguardar a qualidade urbanística do loteamento e garantir ao adquirente e aos demais proprietários de lotes o padrão do local e as características do empreendimento” (Proc. CG n° 29/2006).

Conforme narrativa do próprio Oficial de Imóvel de Marília (fls. 57/59) – em outro processo de dúvida que também trata de desdobro de lote no Jardim Estoril – a fisionomia do loteamento não é mais àquela idealizada pelo loteador.

Em novembro de 2011 a situação registral do loteamento já era a seguinte: “232 lotes no total, distribuídos por 14 quadras; 15 matrículas ainda não abertas, não sabendo se os respectivos lotes foram alienados pela loteadora ou não; 22 desdobros averbados, dos quais 4 referentes a lotes situados na quadra 6, que contém 20 lotes e onde se encontra o lote do interessado”.

Os documentos de fls. 60/61 comprovam a subdivisão de dois lotes – respectivamente, o lote 5, quadra 4, do loteamento Jardim Estoril e o lote 19 da quadra 7 do mesmo loteamento – ambos com área total idêntica ao do caso em julgamento, ou seja, 180 m².

É evidente, pelo conjunto probatório acostado aos autos, que o tempo acrescido à omissão do Poder Público – na fiscalização dos planos de urbanização moldados para cada loteamento – e mais a ação do indivíduo – na busca de melhor atender seus anseios e objetivos – corroeram as características de urbanização originariamente previstas pela loteadora.

A perpetuação das exigências convencionais primárias não se justifica, ainda mais quando o único a defendê-las é o Oficial de Registro Imobiliário.

Nesse sentido, Vossa Excelência, então Juiz da 1ª Vara de Registros Públicos, no feito n°07/82, decidiu:

“O artigo 45 da Lei 6.766/79 é bastante explícito, quando atribui ao loteador – ainda que já tenha vendido todos os lotes – e aos vizinhos, legitimidade de parte para promover ação destinada a impedir construção em desacordo com restrições legais ou contratuais. (…) Ao Oficial do Registro de Imóveis, todavia, não incumbe zelar, com essa amplitude, pelos interesses dos beneficiários das restrições de vizinhança. Somente a estes próprios é que compete evitar o desvirtuamento da estipulação abrigada no plano de loteamento (…) Transferir-se ao Serventuário a tutela dos interesses privados, ainda que de alcance genérico, e resultantes das restrições de vizinhança, não se coaduna com os princípios gerais de direito, com os quais o sistema registrário não pode conflitar.”

Ademais, vale mencionar, em acréscimo a todo o exposto, que nos termos do item 174, Capítulo XX, das Normas da Corregedoria Geral de Justiça não cabe ao Oficial de Registro fiscalizar a observância quanto ao cumprimento de todas as restrições presentes no loteamento, impostas pelo loteador ou pelo poder público.

Assim sendo, o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de dar provimento ao recurso administrativo para o fim de deferir o desdobro do lote 2 da quadra 8 do Jardim Estoril, matrícula n° 2.212, do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Marília.

Sub censura.

São Paulo, 15 de agosto de 2012.

(a) Alberto Gentil de Almeida Pedroso

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, dou provimento ao recurso interposto para o fim de deferir o desdobro do lote 2 da quadra 8 do Jardim Estoril, matrícula n° 2.212, do 2º Registro de Imóveis da Comarca de Marília como requerido pelo interessado. Publique-se na íntegra o Parecer. São Paulo, 27 de setembro de 2012. (a) JOSÉ RENATO NALINI, Corregedor Geral da Justiça. (D.J.E. de 15.10.2012)