1ª VRP|SP: Dúvida – Registro de Imóveis – Escritura de Permuta – Valores idênticos atribuído aos negócios jurídicos – Valores venais distintos – Diferença que ultrapassa o limite de isenção do ITCMD – Caracterização de doação – Dúvida procedente.

Processo 1047284-17.2019.8.26.0100

Dúvida

Notas

L. A. de M. e outro

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de L. A. de M., tendo em vista a negativa em se proceder ao registro da escritura de permuta lavrada pelo 2º Tabelião de Notas e Protesto de Letras e Títulos de Itapetininga, pela qual houve a permuta do imóvel de sua propriedade, objeto da matrícula nº 13.791 do Registro de Imóveis de Itapetininga, com valor venal de R$ 113.873,73 (cento e treze mil, oitocentos e setenta e três reais e setenta e três centavos), com o bem matriculado sob o nº 54.798 do 4º RI, de propriedade de K. C. F. M., com valor venal de R$ 357.572,00 (trezentos e cinquenta e sete mil, quinhentos e setenta e dois reais) e valor venal de referência de R$ 537.092,00 (quinhentos e trinta e sete mil e noventa e dois reais).

Esclarece que os permutandos atribuíram o valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) para cada imóvel, razão pela qual não houve torna ou reposição.

O óbice registrário refere-se à ausência de apresentação da guia de ITCMD sobre o valor existente entre os imóveis, diante da existência de acréscimo patrimonial de forma não onerosa daquele que recebeu bem de valor superior sem qualquer compensação, o que caracterizaria doação.

Argumenta que, embora as partes tenham atribuído valor idêntico aos imóveis permutados, a legislação em vigor estabelece como critério de avaliação o valor venal atribuído pela Municipalidade. Juntou documentos às fls.06/41.

O suscitado apresentou impugnação às fls.50/54. Alega a inexistência da diferença de valores na permuta realizada, tendo em vista que foi atribuído o valor de R$ 150.000,00 a ambos os imóveis e os valores do ITBI foram calculados sobre a base de cálculo do valor venal dos imóveis, ou seja, sobre R$ 537.092,00 e R$ 150.000,00, logo, a exigência do recolhimento de ITCMD sobre a diferença dos valores caracterizaria bis in idem.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.57/59).

É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

Com razão o Registrador, bem como o D. Promotor de Justiça.

Primeiramente é mister esclarecer que o fato do suscitado ter recolhido o ITBI sobre o valor venal dos imóveis, não exclui o pagamento do ITCMD, sendo que derivam de fatos geradores diversos.

De acordo com a doutrina, sobre o ITBI:

“O que se tributa é a transmissão da propriedade de bem imóvel realizada através de um negócio jurídico oneroso, tais como compra e venda, dação em pagamento ou permuta.” (Registro Imobiliário: dinâmica registral / Ricardo Dip, Sérgio Jacomino, organizadores. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. – (Coleção doutrinas essenciais: direito registral; v.6 – p. 1329 – g.N).

Já o ITCMD deriva do fato dos imóveis permutados terem valores venais distintos, ou seja, aquele que recebeu o bem de valor venal superior sem qualquer compensação está obtendo acréscimo patrimonial de foram não onerosa, configurando consequentemente verdadeira doação.

Vê-se, portanto, que com relação ao imóvel matriculado no Registro de Imóveis de Itapetininga, houve um acréscimo patrimonial no total de R$ 121.849,13, sendo irrelevante o valor atribuído pelos permutantes.

Tal importe não é insignificante e supera o limite de isenção do ITCMD no Estado de São Paulo, de 2.500 UFESP de acordo com a Lei Estadual nº 10.705/00.

Neste contexto, ainda que o negócio jurídico tenha sido nomeado como permuta, tal cessão patrimonial, a princípio caracteriza doação, um vez que houve cessão de patrimônio em favor de terceiro sem qualquer compensação financeira/patrimonial, nos termos do art. 538 do CC:

“Art.538: Considera-se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra”.

Ressalto que não se exige que toda permuta entre bens imóveis deve ser feita entre bens de idêntico valor. Não se caracteriza doação tributável, por exemplo, quando a diferença for irrisória, ou até mesmo inferior ao limite de isenção previsto em lei estadual.

No presente caso, contudo, a cessão patrimonial é relevante, presumindo-se a doação. Não se pode entender que alguém abra mão de R$ R$ 121.849,13 sem fundamento.

Assim, na análise do título apresentado, o Oficial qualificou corretamente o negócio jurídico como doação, exigindo a comprovação do respectivo imposto, nos termos do art. 289 da Lei nº 6.015/73.

Destaca-se que cabe ao registrador analisar a natureza dos negócios apresentados a registro, evitando simulações ou até omissões culposas que tragam prejuízo ao fisco. Caso o suscitado entenda que não houve doação, deve buscar declaração neste sentido pela Fazenda Pública ou através das vias ordinárias, onde haverá a participação de todos os interessados no recolhimento do tributo. Questão semelhante foi analisada por este Juízo no procedimento de dúvida nº 1003262-68.2019.8.26.0100. Logo, correta a exigência do registrador.

Diante do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 4º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de L. A. de M., e consequentemente mantenho o óbice registrário.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

(DJE de 10.07.2019)